Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 07, 2005

Doze coisas importantes sobre a crise do governo por Antonio Fernandes

e-agora
1 – A situação do governo é gravíssima.

Há uma crise no governo. Ela não se deve a uma polarização da luta política situação x oposição. Pelo contrário, o governo se atrapalhou sozinho. Isso é o mais grave, porquanto não há o que fazer para salvá-lo. Foi sua natureza e seu modo de se comportar que o levou à situação de crise em que vive hoje.

A situação é gravíssima, em primeiro lugar, porquanto o patrimônio distintivo de credibilidade de Lula e do PT está sendo corroído rapidamente e não há tempo hábil para ser reconstruído, sobretudo se as denúncias se sucederem, como, tudo indica, pode ocorrer.

A situação é gravíssima, em segundo lugar, porquanto o governo não tem explicações verossímeis nem alternativas consistentes. Ninguém, nem mesmo a mais cândida e ingênua freirinha de orfanato, acreditará que Delúbio agia em causa própria e com dinheiro próprio (por que ele faria isso?). Ninguém acreditará que Lula e o núcleo duro do governo não sabiam das denúncias de Bob Jefferson (corroboradas, em certa medida, pelo governador Perillo e por Miro Teixeira). Ninguém acreditará nas explicações fantasiosas de Genoíno de que tudo não passa de calúnia de um indivíduo ressentido ou de que se trata de intriga da oposição ou antecipação da guerra eleitoral (a explicação de sempre, já superdesgastada).

A situação do governo é gravíssima porque, ao que tudo indica, as redes de aliciamento e de negócios escusos montadas – segundo as denúncias – na quase totalidade do aparelho de Estado, não podem permanecer escondidas diante de uma investigação séria. E, de um modo ou de outro, haverá investigação: se não pelas CPIs, pela Polícia Federal (que não é totalmente controlável), ou pelo Ministério Público, ou pela imprensa. É muito difícil que algum beneficiado por algum dos múltiplos esquemas que foram ou ainda poderão ser denunciados, não dê com a língua nos dentes, sobretudo se não tiver nada a ganhar para se manter fiel a um governo e a um partido que lhe tratam como um desqualificado, um ser de segunda categoria.

A situação do governo é gravíssima porque, sem mesada (sem o chamado "mensalão") ou sem outras formas de cooptação ou de fisiologismo – cargos, privilégios, favorecimentos – bem mais difíceis agora de oferecer, a base fisiológica de apoio de Lula não tem porque "morrer abraçada" junto com ele.

2 – A única saída para o governo é negar tudo e partir para a tática do "pega o ladrão" (mas essa não é uma verdadeira saída).

Lula não pode admitir que sabia das denúncias de Jefferson e nada fez, porquanto isso configura crime de responsabilidade ou prevaricação. Vai ter que negar tudo, na cara de pau. Para tentar sair da linha de tiro, o governo utilizará aquela velha tática do ladrão que, surpreendido cometendo o delito, grita: "- Pela o ladrão". Ocorre que "pegar o ladrão", no caso, seja ele quem for, é também muito complicado nas atuais circunstâncias. Os partidos da base fisiológica se armarão contra tal eventualidade. Não aceitarão de bom grado a imolação e botarão a boca no trombone, desgraçando ainda mais a vida do governo. Resultado: não se pegará ninguém e, assim, a tática do "pega o ladrão" não tem muitas chances de funcionar.

3 – Qualquer ajuda prestada ao governo agora é um suicídio para quem ajudar e um malefício para o país.

A oposição não pode ajudar o governo, por dois motivos. Ao dar a mão àquele que está afundando no pântano, ela será imediatamente atingida pelo punhal que o desgraçado esconde na outra mão. É o que já se chamou de "natureza do escorpião". Por outro lado, ajudar o governo a sair da crise não implicará qualquer mudança. O governo manterá – e ainda radicalizará – o mesmo comportamento que o levou a afundar. Dar fôlego ao governo para que ele saia dessa situação e consiga se reeleger, acarretará prejuízos incalculáveis para o país. Com mais quatro anos desse mesmo desgoverno, é batata: afundaremos todos.

4 – Não se sabe mais com toda certeza se Lula conseguirá chegar ao final do mandato.

Caso as denúncias se sucedam sem explicação convincente e sem apuração séria de responsabilidades, é provável que Lula não tenha condições políticas para terminar seu mandato. Isso é ruim, muito ruim, para o Brasil. A melhor solução seria Lula ser substituído democraticamente pelas urnas de 2006. Uma crise de governabilidade que interrompa o mandato atual (mesmo sem ruptura institucional, dando-se posse ao vice Alencar) é tão maléfica quanto mais quatro anos de Lula. No entanto, não se trata de uma escolha que possamos fazer. Estamos, nesse particular, nas mãos do governo.

5 – Reduziram-se drasticamente as chances de Lula ser reeleito (se chegar até lá).

Isso é hoje quase uma certeza. Se continuar empurrando com a barriga, não tomando atitudes que convençam a sociedade da sua vontade de mudar, Lula chegará em meados de 2006 (se chegar) muito desgastado. Tão desgastado que dificilmente será reeleito. A menos que a oposição se suicide para salvá-lo, enterrando porém, com isso, boa parte do futuro imediato do país.

6 – Nenhum outro candidato do PT tem qualquer chance de vencer em 2006 e, a depender do desfecho da crise atual, inclusive em 2010.

Se Lula não concorrer em 2006, nenhum outro candidato terá a menor chance de passar para o segundo turno. Se Lula não concorrer em 2006 é sinal de que a crise foi tão profunda que o PT não terá condições de se recuperar para vencer um candidato eleito no próximo pleito pela oposição e concorrente à reeleição em 2010. Ou seja, nesse caso, nova chance para o PT somente em 2014.

7 – As tendências do PT que não governam, só têm duas alternativas: sair do PT ou tentar tomar a direção do partido (pela primeira vez com chances reais de serem vitoriosas, o que levará a uma espécie "pecedobezação" do PT).

Com exceção da Articulação, todas as demais tendências do PT estão perdendo com a crise do governo. Ou elas sairão do partido ou tentarão dar uma virada interna, com grandes possibilidades de sucesso (pois Lula, Delúbio, Dirceu, Silvinho, Sereno e outros operadores noturnos são todos da mesma tendência Articulação e estarão bastante desgastados nos próximos meses). Caso optem pela segunda opção – uma frente de esquerda contra o comando atual – e vençam, o PT corre o risco de virar alguma coisa parecida com o PC do B: um corpo astral sem alma, propósito e caráter, uma assombração do passado.

8 – Os quadros do governo que não são petistas (nem aliados programáticos ou fisiológicos do PT), estão correndo o risco de se enlamearem se não pularem fora antes que a coisa degringole de vez.

Gente como Furlan, Roberto Rodrigues, Gilberto Gil e Márcio Tomás Bastos estão correndo um risco tremendo de jogarem por terra suas biografias. Se tentarem segurar o que não pode ser segurado, podem afundar todos juntos no pântano. O que seria injusto.

9 – Os grandes meios de comunicação que mantinham doses exageradas de boa-vontade com o governo têm pouquíssimo tempo para fazer uma inflexão na sua política editorial adotando uma posição mais independente, sob risco de perderem credibilidade.

Mas, ao que tudo indica, já começaram a fazer tal inflexão.

10 – Os empresários que apoiaram Lula por motivos econômicos (sobretudo os banqueiros, pelo fato do governo ter mantido a política econômica anterior) estão tomando, subitamente, a consciência de que não adianta continuar contribuindo financeiramente, nem mesmo dando aval político ao governo.

Os empresários estão partindo de duas constatações: a primeira é a de que a crise política, quando atinge certo grau de intensidade, afeta inevitavelmente o desempenho econômico; a segunda constatação é a de que para nada adianta produzir superávits quando o governo só faz aumentar os seus gastos com pessoal e continua desenhando programas populistas de distribuição direta de dinheiro, sem mecanismos de saída do beneficiário (e, portanto, totalmente insustentáveis) os quais, além disso, em expansão contínua, acabarão dilapidando dezenas de bilhões de reais, comprometendo os resultados macroeconômicos futuros.

É bastante provável que o número de empresários que apoiaram Lula na primeira eleição não o apóiem na reeleição, caso ele venha a concorrer. Mais quatro anos da mesma coisa é uma aposta muito arriscada, até para quem tem alto cacife. Também não é muito improvável que os empresários comecem, a partir de agora, por inteligência e aguçado senso de sobrevivência, a tomar um certo distanciamento do governo. Isso se não houver alguma denúncia mais grave contra Pallocci, pois, nesse caso, a debandada será geral e imediata.

11 – A imagem de Lula no exterior já começou a se decompor em um processo que tende a ser muitas vezes mais rápido do que o que foi necessário para construí-la.

O comentário é o próximo item.

12 – Castelos de cartas, que levam muito tempo para ser construídos, costumam cair de uma vez.

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