O Estado de São Paulo - Nacional - 04/06/2005
Liberar recursos do orçamento em troca de apoio político equivale a comprar votos Em matéria de menosprezo à opinião do público pagante é difícil escolher o pior: o governo comprar votos no Parlamento mediante liberação de recursos do Orçamento ou o governo mentir, dizendo que a repentina autorização para o pagamento de 70% das emendas parlamentares faz parte da rotina e não guarda relação com a CPI dos Correios.
Por esta versão, a promessa feita nos últimos dias pelo ministro da Fazenda, Antônio Palocci, de usar R$ 400 milhões para suspender o bloqueio do dinheiro das emendas empenhadas em 2004, não tem nada a ver com a decisão a ser tomada terça-feira na Câmara sobre a constitucionalidade do pedido de comissão de inquérito.
A ação, segundo o ministro Aldo Rebelo, faria parte do trabalho normal do ministro da Fazenda. Um senador do PT, Sibá Machado, chegou ontem a dizer que questionar a liberação das emendas é querer impedir Palocci de trabalhar.
Uma pena um político tão esforçado, jovem, eleito pelo Acre, decerto com votos oriundos de movimentos sociais, aceitar submeter-se ao exercício do cinismo com tanta facilidade. Ele, e outros, miram no imediato sem notar que acertam em cheio o fígado e o cérebro de seus eleitores.
As pessoas têm discernimento, lêem jornais, assistem televisão e ouvem rádio. Não estão cegas pela defesa obsessiva de um projeto de poder e, portanto, percebem o que suas excelências insistem em esconder atrás de sofismas.
Esgotados os argumentos políticos, o Executivo partiu para o uso de expedientes oficiais e saiu às compras atrás da mercadoria disponível: deputados e senadores dispostos a vender suas prerrogativas de influir no Orçamento.
Ninguém menos que o líder do PT na Câmara, deputado Paulo Rocha, corrobora o intento e derruba a versão da ação de rotina. Segundo ele, a "estratégia política" é perfeitamente legítima por causa da necessidade do governo de "reaglutinar sua base". De mais a mais, pondera, emendas ao Orçamento nada têm de ilegais.
Realmente, estão previstas na Constituição, constituem a forma pela qual os parlamentares podem propor destinação de verbas para beneficiar municípios e suas populações.
Só que, como qualquer outro mecanismo de natureza pública, emendas parlamentares requerem impessoalidade no trato. Precisam obedecer a um cronograma de necessidades sociais e de possibilidades orçamentárias, não podem seguir o ritmo das conveniências político-partidárias deste ou daquele, como ocorre no espetáculo em cartaz.
A prática entre nós é esta: bloqueia-se o grosso do dinheiro das emendas para usá-lo como reserva técnica a qualquer dificuldade de ordem política. Tal movimento é facilmente comprovável pelo acompanhamento dos dados através do Siafi.
Por isso mesmo, caso não houvesse uso político desse instrumental mais natural seria que o governo tivesse o cuidado de suspender temporariamente a liberação das emendas até se resolver a questão da CPI, a fim de não dar margem a interpretações dúbias e injustas.
Como acontece exatamente o inverso - escolhe-se a véspera de decisões importantes relativas à CPI para anunciar liberações -, impossível não ligar o nome (compra de votos) à pessoa (governo federal).
Ao abusar desse modo da máquina do Estado - já devidamente aparelhada -, o Poder Executivo interfere no andamento dos trabalhos do Legislativo e deforma suas regras de funcionamento.
Comissões parlamentares de inquérito, sabe o muito bem informado leitor, são ferramentas de ação da minoria. Quando a maioria deixa de lado as armas políticas e vai buscar fora do Parlamento outros dispositivos para combater as CPIs, está viciando de antemão um resultado.
Cessam as igualdades de condições de combate, a lei do mais forte prevalece e extinguem-se a priori quaisquer chance, a qualquer tempo, de vitória para a minoria.
Isso como princípio, evidentemente, porque na realidade - e isso o governo parece não levar em conta - há em jogo fatores com potencial muito mais forte que a balança de vitórias e derrotas dentro do Congresso.
Assustado com o rumo das coisas e com a indiferença do governo às conseqüências de uma guerra de vale-tudo, o deputado Roberto Freire (PPS-PE) começou ontem a articular um movimento de reação do Poder Legislativo, "antes que sejamos todos arrastados à execração pública no campo da moral e dos bons costumes".
Na opinião de Freire, o Planalto não percebeu que "a força de uma CPI não está no Congresso, mas na imprensa e na opinião pública".
Como exemplo, cita casos de comissões de inquérito - como a do Banestado - que foram tratadas com "descaso" pela imprensa e não tiveram repercussão. Um outro exemplo é o da CPI da Terra, em funcionamento e revelando irregularidades no MST, mas sem apelo popular.
"A CPI dos Correios, ao contrário, chama a atenção da imprensa. Portanto, ainda que o governo consiga impedir a instalação no Congresso, não consegue impedir o debate na sociedade".
Na opinião de Roberto Freire, os atuais habitantes do Palácio do Planalto perderam a noção do limite: "Em nome do interesse do partido, viram as instituições do avesso."
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, junho 08, 2005
DORA KRAMER:O abuso da máquina
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