Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 10, 2005

Do discurso à prática



editorial
Jornal do Brasil
10/6/2005

Os eleitores e cidadãos de bem saberão cobrar com especial vigor a nova promessa de, enfim, desengavetar a reforma política. Estimulados pelos últimos episódios que atormentaram o governo Lula, tanto os aliados do Palácio do Planalto quanto oposicionistas reafirmaram o desejo de avançar a mais imprescindível - e mais adiada - das reformas exigidas pelo país. Ecoou-se a declaração do presidente Lula, para quem é ''extremamente importante aproveitar o momento político atual para discutir o tema''. Que dessa vez as boas intenções retóricas se traduzam em gestos efetivos. A pauta, afinal, costuma adornar o discurso em Brasília, sempre que a imagem dos representantes desce o ralo da incredulidade popular. Tergiversações e promessas vazias combinam-se a um raro consenso. A reforma política é essencial, garantem. Até ser esquecida novamente.
Esta semana, o ministro Aldo Rebelo se reuniu com o presidente do Congresso, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE). A intenção governista é centrar a reforma em quatro pontos fundamentais: votação por listas, financiamento público de campanha, federação de partidos e fidelidade partidária. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também reafirmou apoio às mudanças, argumentando que ''é fundamental para revigorar as instituições e restaurar a legitimidade dos mandatos''. Está certo. Sabe-se, porém, que a reforma não extirpará a chaga crônica da corrupção incrustada no Estado. Tampouco removerá por completo os perturbadores sinais do fisiologismo e do caciquismo populista.

Tais anomalias do sistema político-partidário brasileiro, contudo, deverão ser reduzidas à dimensão do suportável. Insista-se: as mudanças resultarão num avanço institucional sem precedentes. A fidelidade partidária, por exemplo, estimulará padrões mais aceitáveis de conduta dos partidos e seus integrantes, freando o troca-troca excessivo - cuja insuperável criatividade espanta até mesmo as mentes mais imaginativas. A aritmética da distribuição do dinheiro público para o financiamento das campanhas, por outro lado, poderá ter um efeito moralizador, ao decretar o fim do abuso e predomínio de poder econômico na composição dos quadros políticos. A votação por listas, por sua vez, constitui uma eficiente maneira de inibir a imoralidade no leilão de vagas a candidaturas que não contam com o apoio da legitimidade dentro e fora das legendas.

Eis, portanto, os primeiros passos na longa caminhada da esperança de faxina da política brasileira em todos os níveis. A tarefa requer ainda a poda das mordomias, das vantagens, dos benefícios e das mutretas que corroem, feito cupins, as instituições democráticas. Sempre anunciada e nunca executada, porém, a reforma política tem infelizmente servido como instrumento de barganha em momentos de instabilidade; jamais como mecanismo realmente eficaz para atender à demanda popular. Convém mostrar agora que os eufóricos discursos em defesa da reforma não significam novos diversionismos, um novo calmante para o susto coletivo sentido nos gabinetes de Brasília. É hora de seriedade.

 

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