Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 07, 2005

AUGUSTO NUNES :O bombardeio só está no começo - JB

Roberto Jefferson avisara sem rodeios que, constatada a iminência do naufrágio, trataria de afundar atirando. Ontem, em entrevista publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, o deputado federal e presidente do PTB começou a cumprir a promessa. Algo deve tê-lo convencido de que é irreparável o rombo causado pelo escândalo dos Correios, ampliado por avarias posteriores. E o timoneiro da embarcação decidiu que chegara a hora do bombardeio.

Os disparos iniciais não deixam dúvida: o que parecia uma fragata de escolta é canhoneira, e das boas. Mais: embora tenha trocado as aulas de tiro ao alvo por lições de canto lírico, Jefferson continua com excelente mira. O primeiro torpedo, carregado com a revelação de que deputados da "base aliada" recebem (ou receberam até janeiro) "mensalões" de R$ 30 mil para apoiar o governo, atingiu a proa da nau capitânia comandada por Lula da Silva.

Os seguintes, ainda mais devastadores, explodiram na sala de máquinas do grande navio, confiada a dois condecorados tripulantes do PT: Delúbio Soares, diretor financeiro do partido, e Sílvio Pereira, secretário-geral. Nessa máquina de coletar dinheiro e distribuir propinas, os parceiros esbanjaram harmonia. Sílvio infiltra aliados em gabinetes nas cercanias de cofres abarrotados. Delúbio é o homem da mala. Recolhe contribuições ou adjutórios aqui, entrega "mensalões" ali. No momento, a dupla está recolhida à UTI.

Outros torpedos, endereçados à sala de comando, sugeriram que Jefferson calcula minuciosamente o tamanho do estrago de cada um. Todos atingiram os alvos, e tanto o comandante Lula quanto os principais imediatos sofreram escoriações generalizadas. Mas foram poupados de ferimentos mortais. Ao aliado agora transformado em inimigo feroz sobra munição e falta pressa. O naufrágio não se consumará tão cedo. Haverá mais embates. A vez dos outros chegará.

Segundo Jefferson, só no começo deste ano contou a Lula, numa conversa testemunhada por quatro figurões do reino, a história do "mensalão". Lula caiu no espanto. Depois, no choro. Enfim caiu na real, e determinou o fim do sistema de compra de votos montado pelo partido que reivindicara o impeachment de FH ao descobrir que deputados haviam recebido dinheiro para aprovar a emenda da reeleição presidencial.

Sempre segundo Jefferson, os ministros José Dirceu e Antonio Palocci haviam sido alertados meses antes para a extensão das patifarias. Palocci, que anda comprando votos no atacado (com dinheiro público) para enterrar a CPI dos Correios, manteve a serenidade de quem administra as finanças da Suécia. Dirceu deu um soco na mesa: "Eu falei para o Delúbio não fazer isso", irritou-se. Mas parou por aí. O único a reagir publicamente foi o deputado Miro Teixeira, que em setembro revelou ao JB a epidemia do "mensalão". O corporativismo parlamentar e telefonemas de emissários do governo interromperam o discurso de Miro.

Em outubro, quando ofereceu um jantar a Lula no apartamento em Brasília, Jefferson evitou temas assim constrangedores. Preferiu só revelar ao homenageado a boa qualidade das cordas vocais, com uma caprichada interpretação de Eu sei que vou te amar. Emocionado, Lula mostrou ao fim da noitada que a paixão instantânea fora correspondida. "Eu sou capaz de dar ao Roberto Jefferson um cheque em branco e dormir tranqüilo", disse. A paixão foi infinita enquanto durou. E agora? E agora que todos conhecem os pavores que induziram mandarins do Planalto a atropelar a ética, a moral e a lei para soterrar a CPI perigosamente reveladora? E agora que ficaram evidentes as razões dos afagos com os quais Lula e parceiros vinham cobrindo Jefferson? Eles temiam a abertura do baú de horrores. O baú se abriu. E agora?

Nenhum comentário:

Arquivo do blog