Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, junho 02, 2005

ATENTADO À LÓGICA

 É inoportuno o projeto de lei do deputado Roberto Gouveia (PT-SP), aprovado pela Câmara, que torna os medicamentos para a Aids não-patenteáveis, na mesma categoria do que seja "contrário à moral, aos bons costumes, à segurança, à ordem e à saúde pública".
Não se contesta, é evidente, que a saúde pública deva ter prioridade sobre interesses comercias. Tampouco minimiza-se a gravidade da epidemia de Aids. A questão é que o projeto, ainda à espera da apreciação do Senado, é essencialmente ilógico.
Não faz sentido transformar os medicamentos para a Aids em artigos não-patenteáveis deixando fora dessa categoria todas as drogas destinadas a curar ou controlar outras moléstias. Não há nem mesmo um critério consistente a orientar a decisão, pois a Aids está longe de ser a doença mais mortal ou prevalente do planeta ou do Brasil. Como justificar que fármacos para a síndrome sejam de domínio público, mas não os para a pressão alta, malária e câncer?
Como se não bastasse, o dispositivo é ocioso, pois a Lei de Patentes (9.279/96), já contém o mecanismo da licença compulsória em casos de emergência nacional (art. 71), o que permitiria às autoridades quebrar a patente de medicamentos na hipótese de grave crise sanitária. Na verdade, praticamente todas as legislações de patente do mundo contam com algo semelhante, e o Ministério da Saúde já negocia o preço dos medicamentos para a Aids com os laboratórios que os produzem utilizando-se explícita ou veladamente da possibilidade de valer-se dessa prerrogativa.
De fato, a licença compulsória é mais útil como um trunfo de negociação do que como uma ameaça efetivada, embora o Brasil não deva ter receio, em caso extremo, de quebrar a patente. O país não precisa, portanto, dessa pirotecnia legal, que atenta contra o bom senso.
folha de s paulo editorial

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