Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, maio 06, 2005

Dora Kramer:Governo explica riscos a Severino

  Nas conversas mantidas nos últimos dois dias com o presidente Luiz Inácio da Silva e o ministro da Articulação Política, Aldo Rebelo, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, não ouviu apenas apelos à paz e promessas de redução do número de medidas provisórias.

Severino ouviu mais. Na verdade, muito mais. Com palavras amenas e persuasivas, foi informado que a base governista continuará obstruindo a pauta de votações enquanto ele insistir em ser o dono da agenda do Legislativo; foi alertado também sobre a possibilidade de ser responsabilizado por seus pares pelo aprofundamento da rejeição popular ao Parlamento, caso continue comportando-se ao ritmo de palavras frouxas e dos gestos desabridos.

Tanto Lula quanto Aldo asseguraram a Severino que o governo não pretende pautar a Câmara, mas também não vai aceitar passivamente que o presidente da Casa imponha a sua pauta sem consulta aos líderes.

A proposta apresentada a Severino foi a da elaboração de uma agenda de consenso em troca de os partidos aliados a Lula suspenderem a obstrução às votações.

Se a paralisia é ruim para o Executivo, e é, muito pior é para o Legislativo pois, em termos populares, acaba sendo traduzida como deficiência laboriosa dos parlamentares.

De acordo com o entendimento do Planalto, Severino Cavalcanti concordou, e o primeiro teste do acerto seria a votação da Reforma tributária dentro de mais ou menos duas semanas e da forma pretendida pelo Palácio.

É claro que nem o presidente da República nem ninguém podem obrigar Severino Cavalcanti a modificar seu comportamento, a alterar os preceitos que orientaram sua carreira política até agora.

Tampouco se pretende, com argumentos racionais apenas, convencê-lo de que a paciência das pessoas com condutas exóticas tem limite e que a conseqüência está muito perto de ser a desmoralização coletiva do Poder Legislativo.

Em nenhum momento das conversas do presidente Lula ou do ministro Aldo, o pensamento reinante no Governo foi exposto assim de forma tão crua para Severino Cavalcanti.

Ambos fizeram ver a ele as desvantagens de uma conduta, digamos, personalista e as vantagens do poder compartilhado de forma a estabelecer um equilíbrio entre perdas e ganhos de parte a parte.

E teria Severino entendido o recado?

A suposição é a de que tenha entendido razoavelmente bem, não por uma alteração de convicções, mas de certo modo coagido pela realidade. Qual seja, a das vaias recebidas na cerimônia de comemoração do Dia do Trabalhador em São Bernardo do Campo e a das manifestações de desagrado que aos poucos vão tomando conta das cabeças mais sensatas do grupo mais próximo a Severino.

A esperança é que ele pelo menos tenha começado a compreender a diferença entre aquele protesto espontâneo e os festejos feitos por parte de grupos sociais com algum interesse específico – seja da simples bajulação ao presidente da Câmara ao aplauso condescendente de platéias que vêem em Severino uma atração pitoresca.

A concordância em votar a Reforma tributária e rápida cassação do agora ex-deputado André Luiz estão sendo recebidas como sinais de entendimento. Severino teria, por essa ótica, sentido o peso da pressão.

De qualquer forma, o Governo não alimenta a ilusão de conseguir estabelecer com o presidente da Câmara um relacionamento razoável com prazo de validade longo.

A impressão é a de que será necessária marcação constante, com habilidade, sem partir para o confronto – não por falta de vontade, mas por escassez de condições políticas –, com a consciência de que será uma longa agonia a ser resolvida em prestações no dia-a-dia.

Assombração

Apesar de ter sido suspensa por um pedido de vistas do ministro Eros Grau, a votação no Supremo Tribunal Federal que pode obrigar o presidente do Senado a indicar os integrantes da CPI dos Bingos é dada como perdida pelo Governo.

Até agora votaram quatro dos 11 ministros do STF e todos foram contrários à decisão tomada no ano passado pelo senador José Sarney ao declarar-se regimentalmente impedido de indicar os integrantes da CPI depois de os líderes governistas terem se recusado a fazê-lo.

A comissão, como se sabe, tem o objetivo prático de esclarecer direito qual a extensão e a natureza das atividades governamentais do braço-direito do ministro José Dirceu, Waldomiro Diniz, flagrado tentando extorquir dinheiro de Carlos Cachoeira, negociante do setor de jogos, quando servia ao Governo do Estado do Rio de Janeiro.

Por isso, e não por descobertas a respeito das atividades dos bingos, a comissão parlamentar de inquérito preocupa. Oficialmente, a decisão é aguardar a decisão final do Supremo para a manifestação de posições.

Na realidade, porém, o Palácio do Planalto já começou a se mexer no Senado. Por enquanto, a avaliação é a de que, confirmada a sentença do STF, não há jeito, o presidente do Senado estará obrigado a instalar a CPI e a única ação possível seria tentar controlar os trabalhos da comissão.

Providência pífia, se o ânimo político for de ressuscitar a assombração.
O DIA

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