Com a placidez de monge oriental, o ministro do Otimismo, Luiz Gushiken, vive lembrando aos jornalistas que sempre existe o lado positivo das coisas – e não se pode ignorá-lo. A tese acaba de ganhar um bom exemplo. A sucessão de escândalos escancarados neste maio reforçou a suspeita de que o Brasil virou um imenso viveiro de corruptos. Esse é o lado ruim. Mas há o lado bom.
A extensão da roubalheira, sublinhada pelo desembaraço dos assaltantes de cofres públicos, talvez tenha pesado decisivamente na eleição da sede do 4º Fórum Global de Combate à Corrupção. Gushiken e outros patriotas podem orgulhar-se: Brasília foi a escolhida para abrigar o evento que, de 7 a 10 de junho, debaterá numerosas questões derivadas do tema central: “Das Palavras à Ação”.
A organização do Fórum foi confiada à Controladoria Geral da União (CGU), chefiada por Waldir Pires, ministro de Controle e Transparência. A programação está quase pronta. Não faltarão figurões, estrangeiros ou nativos. Mas tudo seria mais pedagógico, mais animado (e mais divertido) se o país deixasse rolar a inventividade e a heterodoxia. O Fórum é a grande chance para provar a qualquer país que não se rouba lá como se rouba aqui.
Certas singularidades ajudam a explicar o sempre notável desempenho do Brasil na Copa do Mundo da Corrupção. Nossos larápios passaram a agir com tamanho desembaraço, por exemplo, que têm sido filmados com freqüência em plena ação, protagonizando cenas de corrupção explícita. Que tal realizar-se o 1º Festival do Cinema Bandido?
Nesse evento paralelo, em noitadas sucessivas, desfilariam pelo telão episódios que, aos olhos dos forasteiros, pareceriam coisa de ficção. A mostra seria merecidamente aberta pela obra que fundou o Cinema Bandido. É protagonizada pelo extorsionário trapalhão Waldomiro “Um por Cento” Diniz – assessor da Casa Civil e amigo de José Dirceu.
Numa sala do aeroporto de Brasília, Waldomiro tenta arrancar propinas do bicheiro Carlinhos Cachoeira, coadjuvante e produtor do filme. Ambos em liberdade, Waldomiro e Cachoeira debateriam com a platéia, ao fim da exibição, o tema inspirado na frase do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos: “Pior que o corrupto é o corrupto impune”.
A segunda noitada seria dominada pela performance de Maurício Marinho, tecnicamente apenas um alto funcionário dos Correios. Sozinho na própria sala, sem figurantes visíveis a ajudálo, contracena com uma voz em of f. É o bastante. A extraordinária loquacidade e a exuberância gestual lhe permitem tornar quase palpável o desfile imaginário de comparsas infiltrados pelo PTB nos Correios e outros braços da administração federal.
Segundo Marinho, o exército de corruptos comandado pelo presidente do partido, Roberto Jefferson, tem embolsado milhões de reais com discrição e eficiência. O Congresso considerou a obra obscena demais: decidiu premiá-la com uma CPI. O presidente Lula, que nunca foi de cinema, acha que esses filmes não servem para nada. Talvez goste de seriados com detetives: repassou a história à Polícia Federal.
“Será uma investigação forte”, avisou o ministro da Justiça (Existem operações fracas, sabe-se agora). O nome da operação promete: “Deus nos Acuda”. Poderia estender-se a Rondônia, que produziu o primeiro filme bandido regional. O roteiro repete a mesma cena: um deputado tenta extorquir dinheiro do governador Ivo Cassol. O governador está em todas. Mudam os gatunos: o elenco reúne nove parlamentares.
Que Deus acuda o Brasil.
Atenção, MST: 1968 já terminou
Os campos do Brasil clamam por mudanças destinadas a reorganizar a distribuição da terra, modernizar relações de trabalho, remover tumores seculares. Mas não haverá avanços se o rumo das reformas for ditado pelo MST. Na chegada a Brasília da marcha dos sem-terra, militantes travaram violentas batalhas com a PM, desfilaram sem autorização diante do Palácio do Planalto, sitiaram a Embaixada dos EUA berrando slogans contra o imperialismo ianque, queimaram a bandeira americana, agitaram estandartes com o rosto de Guevara. Alguém precisa avisar ao MST que 1968 só não terminou no título do livro de Zuenir Ventura.
O foguetório promovido por autoridades brasileiras que organizaram a Cúpula América do Sul-Países Árabes (a minha, a sua, a nossa Caspa) excitou a imaginação do Cabôco. Os resultados do encontro não tardariam, avisaram os anfitriões. O primeiro já chegou: a Bolívia impôs à Petrobras um medonho aumento tributário. Ciente de que a pendência é antiga, o Cabôco pergunta: por que não se tratou disso na Caspa?
Contribuintes bancam até dízimos do PT
A contar de janeiro de 2003, segundo cálculos da Veja , cerca de 16 mil cargos de confiança foram preenchidos, sem concurso, por petistas de carteirinha indicados por figurões federais. Supondo-se que a média salarial flutue na faixa de R$ 5.000, a turma embolsa R$ 80 milhões por mês. Como todo filiado é obrigado a pagar o dízimo, R$ 8 milhões vão para o caixa do partido. Resumo da ópera: além de bancar milhares de empregos descartáveis, os contribuintes agora estão pagando até contas do PT.
Ainda há juízes no Rio
Quando Anthony William Matheus de Oliveira oficializou a infiltração do apelido (já bastante conhecido) entre o prenome e o sobrenome, operou-se muito mais que um retoque na certidão de nascimento. Naquele momento, o político Garotinho criou o Garotinho ator.
A criatura logo se mostraria mais forte e maior que o criador. Como nos palcos, nos palanques as operações de dividir e multiplicar são complementares. Os atores se dividem por vários papéis para multiplicar platéias.
Acabam por também multiplicar- se, como sugerem os papéis vividos por Garotinho, fluminense nascido em Campos há 44 anos. Ele já foi o petista aguerrido e o carrasco do PT do Rio. O brizolista irredutível e o destruidor do PDT.
O pai de família temente ao Senhor, que comanda a prole com doçura. O marido que elege a mulher. O homem que não deixa governadora mandar. O governador generoso. O cacique brutal. xerife que vai prender meio mundo. O chefe que nomeia corruptos. Essas figuras, somadas, compõem seu personagem predileto: O Escolhido. O homem se confunde com o ator quando Garotinho incorpora o papel de quem se acha predestinado a salvar o país. Ele acredita nisso. Mas dessa nos livraremos. Ainda há juízes no Rio.
Nem o leite das crianças foi poupado
Desencadeada pela Polícia Federal em 2004, a operação batizada de Gabiru (como é chamado no Nordeste um rato grande) provou na semana passada que não está para brincadeiras. Em Alagoas, foi preso um bando de prefeitos e ex-prefeitos especializados em desviar dinheiro destinado à merenda escolar. Nem o leite das crianças escapou.
A quadrilha existe há 15 anos. Só nos últimos quatro meses, roubou R$ 1,8 milhão. Muitos ladrões juram ter pecado para garantir o leite das crianças. Esse argumento não vale para os gulosos gabirus.
Parabéns, Berzoini
O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, divulgou um papelório, intitulado Classificação Brasileira de Ocupações”, que merece o cobiçadíssimo Yolhesman Crisbelles Especial. O item reservado à mais antiga profissão do mundo informa que quem se prostitui para sobreviver está promovido a profissional do sexo”. Depois do balaio que amontoa “garotos e garotas de programa, prostitutas e travestis, messalinas, quengas e transexuais”, vem “descrição sumária”.
Batalham programas sexuais em locais privados, vias públicas e garimpos; atendem e acompanham clientes homens e mulheres, de orientações sexuais diversas; administram orçamentos individuais e familiares; promovem a organização da categoria. Realizam ações educativas no campo da sexualidade; propagandeiam os serviços prestados. As atividades são exercidas seguindo normas e procedimentos que minimizam as vulnerabilidades da profissão.
jb
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