Não há nada, plano a, b, c ou d, e isso ficou claríssimo ontem durante a sessão de leitura do requerimento de instalação da CPI, no Congresso.
Antes, as erráticas ações de imolação governamental no altar do despudor já haviam indicado que a única estratégia disponível era a do voluntarismo sustentando a "certeza" de que daria tudo certo, pois os signatários do requerimento terminariam por se curvar à força do Diário Oficial.
Desse tipo de auto-engano já havia padecido o Governo quando acreditou que a posse do poder, por si só, garantiria a eleição do deputado Luis Eduardo Greenhalgh para a presidência da Câmara. Os petistas erraram tudo o que podiam errar e depois saíram distribuindo responsabilidades ao alheio.
Agora ocorre o mesmo e, na sessão de ontem no Congresso, a oposição, ladina e experiente, comemorava o fato. A delicadeza da situação pedia comedimento e sobriedade. A começar pelo reconhecimento por parte do Governo de que seus melhores quadros, na tribuna e no bastidor, estão do lado oposto, consideram equivocada a tentativa de agredir as evidências.
Natural seria, portanto, falar o menos possível e agir com eficácia. O Governo, ao contrário, caçou com gato e escalou para a defesa parlamentares desprovidos de habilidades verbais, e até mentais, para tanto. A cena, com isso, ficou patética.
Com argumentos fracos e mal formulados, os defensores conseguiram, no máximo, acentuar as incoerências com o passado, expor o partido da CPI em luta aberta contra uma CPI, exibiram desespero, atacaram companheiros de bancada, mostraram-se carentes de uma boa idéia para pôr em prática até a meia-noite (prazo limite para a retirada das assinaturas do requerimento) sem aprofundar suspeitas e insistiram na teoria da conspiração como se o Governo fosse frágil ao ponto de se desmilingüir por causa do envolvimento de um presidente de partido aliado em investigações de corrupção numa empresa estatal.
Político este que pauta suas ações pela palavra de um funcionário flagrado em ato de suborno: o deputado Roberto Jefferson usou, tanto para apoiar como para retirar apoio da CPI, as declarações de Maurício Marinho segundo as quais cometeu apenas uma bravata ao apontá-lo como comandante-em-chefe do esquema de corrupção nos Correios.
Indiferente a essa evidente encenação – pois não há como conferir veracidade a uma peça que serve ao mesmo tempo à defesa e à acusação –, dois ministros com assento no Palácio do Planalto, José Dirceu e Aldo Rebelo, passam dias correndo atrás do deputado Jefferson, que se recusa a recebê-los e, só o faz quando os ministros o pegam de surpresa em casa.
Não para impor reparos à sua conduta, mas para retomar com ele as bases da boa parceria.
Enquanto isso, rodam nas entranhas da administração federal as manivelas de liberação de recursos de emendas parlamentares e juramentos de cumprimento de promessas antigas para o preenchimento de cargos públicos.
Se isso é estratégia que permita a deputados e senadores recuarem da CPI sem junto com isso enterrar na lama as respectivas reputações, a oposição pode tirar férias porque já existe quem desempenhe suas funções com mais competência.
Num misto de auto-engano e equívoco, o Governo acabou por patrocinar uma comissão de inquérito na qual seus adversários não faziam muita fé. Fora isso, agiu de uma forma tal que, se quase 100 parlamentares mudarem de idéia a poder de incentivos oficiais, o Congresso se verá na obrigação de cortar mais da sua já tão apodrecida carne.
Caso pensado
Ministro da Previdência no Governo Fernando Henrique, o deputado Roberto Brant não é exatamente um colegial no tocante às coisas da política.
Refletia ontem a respeito de ações do Poder Executivo no sentido de evitar instalações de comissões parlamentares de inquérito enquanto observava a atuação dos governistas durante a leitura do requerimento da CPI dos Correios.
Ele mesmo atuou diretamente para inviabilizar algumas. Mas dizia-se perplexo com a ausência de noção de limites exibida pela tropa palaciana, antevendo conseqüências mais graves provocadas pela tentativa de barrar a CPI do que na produção investigatória da comissão.
"Nós não sabemos o que vamos achar, mas pelo visto o Governo sabe o que quer esconder", constatava.
Mão inimiga
O ministro José Dirceu pediu a um emissário que intermediasse um telefonema dele ao ex-governador Anthony Garotinho para solicitar a retirada das assinaturas de aliados do pemedebista.
o dia
2 comentários:
Do degrau à cadeira
Da coluna Painel da Folha de S. Paulo, hoje:
"Você é só um degrau", disse José Dirceu a Roberto Jefferson na conversa travada para convencer o presidente do PTB a desembarcar da CPI dos Correios. "O que eles querem é nos pegar", completou o ministro.
Dirceu e Aldo Rebelo, que na véspera haviam tentado sem sucesso ser recebidos, apareceram ontem sem avisar na casa de Jefferson. A conversa, segundo o petebista, foi "muito áspera".
Jefferson despejou sobre a dupla um caminhão de queixas ao tratamento dispensado por governo e PT ao PTB. Chamado de "degrau", concordou: "Na mesma cadeira em que eu sentar [na CPI] vão sentar você, o Silvio Pereira e o Delúbio Soares".
(Sílvio é o secretário-geral do PT. Delúbio, o tesoureiro.)
BLOG Ricardo Noblat
Mas não era um golpe das elites?
Ana Maria Pacheco Lopes de Almeida -
e-agora
"Há uma crise política. O culpado tem nome, mas a gente não pode dizer quem é". José Dirceu, no Painel da Folha de hoje. Se a crise política é golpismo das elites, como insistem os petistas, e se Dirceu já sabe o nome do culpado pela crise, logo, Dirceu descobriu o líder dos golpistas. Ou não?
No Painel da Folha
Um culpado
Em encontro do Campo Majoritário do PT, anteontem à noite, José Dirceu disse frase que mereceu múltiplas interpretações dos ouvintes: "Há uma crise política. O culpado tem nome, mas a gente não pode dizer quem é".
Vários suspeitos
A maioria entendeu que o ministro falava de Lula, cuja reação à crise foi considerada letárgica por vários dos presentes. Para outros, falava de Aldo Rebelo. E houve quem achasse que o culpado era Severino Cavalcanti.
Coisas da vida
O próprio Dirceu aliviou a barra do colega da Coordenação Política. "O Aldo, coitado, não tem culpa", apesar de demonstrar "apego ao cargo". Mas isso, disse, "é da natureza humana".
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