O Globo
Fora o fato de que, se não fosse Lula, a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República pelo PT jamais existiria, neste momento da campanha eleitoral ela só existe pela expectativa de que o presidente Lula terá a capacidade de levá-la à vitória em outubro.
Mas as notícias não são boas, nem as objetivas nem as de bastidores, que falam de novas pesquisas, depois da saída de Ciro Gomes, que indicariam a ampliação da vantagem do tucano José Serra sobre Dilma.
A campanha de Dilma não passa um dia sem ter sobressaltos, e sempre relacionados com uma maneira nada popular de se comunicar da candidata oficial, o que exacerba o contraste com as virtudes performáticas de seu padrinho, ampliando os defeitos da protegida novata em campanhas eleitorais.
Os movimentos bruscos do presidente nos últimos dias, alternando uma excitação desproporcional com uma emotividade excessiva diante da aproximação do final do seu mandato, indicam que as coisas não estão saindo como ele planejou.
Ele mesmo teve a sinceridade de revelar, chorando, no discurso de 1ode Maio da CUT, numa extravasamento de sentimentos contraditórios que parece estar experimentando, que ser indicado pela revista "Time" como uma das personalidades mais influentes do mundo fez seu ego "engordar" um pouco mais, a ponto de já não caber "dentro das calças".
Fora o fato de que a metáfora é confusa e de mau gosto, fica o registro de um momento de fragilidade emocional de um presidente extremamente popular que vê se aproximando o fim de seu "reinado" e que quer desesperadamente ter um terceiro mandato indireto através de sua escolhida.
É justamente esse desespero que está chamando a atenção de tantos quanto participam dessa campanha eleitoral.
Colocar como objetivo máximo eleger sua sucessora, depois de literalmente inventála, parece um desafio desnecessário para quem já obteve tanto sucesso.
Mas, mesmo com todo o seu empenho, já paira no ar uma leve desconfiança de que ela é pesada demais mesmo para Lula, e uma indicação clara disso é a neutralidade do PP na corrida presidencial.
Poucos meses atrás, a adesão do partido à candidatura oficial não era questionada, parecia uma decisão automática a acrescentar 80 segundos de tempo à propaganda gratuita no rádio e televisão para a campanha de Dilma.
Ontem, depois de um almoço com a cúpula do PP, a candidata oficial saiu de mãos abanando.
No momento, o máximo que o PP pode prometer é uma neutralidade, que significa na prática um benefício para a oposição.
Essa neutralidade do PP pode perfeitamente evoluir até junho para a formalização do apoio à candidatura oposicionista, até mesmo com o senador Francisco Dornelles tornandose o candidato a vice na chapa de Serra.
Movimento similar está acontecendo com o PTB, já em processo mais avançado de apoiar a nível nacional a candidatura de Serra à Presidência da República, tirando outros 40 segundos da propaganda da chapa oficial para acrescentá-los à candidatura oposicionista.
A oposição está também negociando com o PSC e outras pequenas siglas que têm alguns segundos preciosos de propaganda gratuita, graças a uma legislação eleitoral completamente inexplicável.
Se PTB e PP formalizassem o apoio a Dilma, a vantagem dela na propaganda de televisão e rádio seria enorme: a petista teria 11 minutos e 37 segundos em cada bloco de 25 minutos exibido à tarde e à noite.
O tucano José Serra teria menos da metade: 5 minutos e 36 segundos.
Com os rearranjos que estão sendo negociados nos bastidores, a vantagem da candidata oficial ainda se manterá, mas já não haverá o massacre que estava sendo anunciado.
Os dois principais candidatos terão um tempo de propaganda gratuita perfeitamente suficiente para expor seus programas, e a diferença de minutos não será tão grande que represente uma vantagem.
Além do mais, temos o exemplo do próprio presidente Lula, que venceu uma eleição em 2002 com menos tempo de televisão do que o então candidato oficial, José Serra, que àquela altura tinha o apoio do PMDB, como Dilma hoje.
Os especialistas dizem que um mínimo de 5 minutos é suficiente para uma boa campanha, e o que vier acima disso pode ser até prejudicial, dando uma superexposição ao candidato que pode cansar sua imagem diante do eleitorado.
No momento, o presidente Lula gasta sua liderança tentando conter um sentimento de frustração dos partidos que embarcaram na aventura apostando na sua reconhecida sensibilidade política e, mais que isso, na sua popularidade recorde.
O deputado federal Ciro Gomes já disse que Lula "viajou na maionese" na pretensão de ungir sua sucessora.
O fato é que o próprio presidente Lula parece ter embarcado nessa viagem com uma certeza de chegar a porto seguro, que, se vê agora, tinha mais arrogância do que dados de realidade a embasar.
Precisa agora despender toda sua energia política para manter acesa a esperança de seus aliados, e para isso ele não se furtará a frequentar todos os palanques possíveis, e parece disposto a encontrar meios de superar qualquer legislação que se coloque como obstáculo.
Assim, forma-se um círculo vicioso (ou virtuoso?), com o próprio presidente alimentando uma presunção de poder, e os partidos que fazem parte de sua base aliada aguardando sinais de confirmação de que a sua capacidade de transferência de votos se transformará em realidade.
Entrevista:O Estado inteligente
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