Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 15, 2010

Reincidência deliberada Dora Kramer

O Estado de S. Paulo - 15/05/2010

O horário reservado aos candidatos para campanha eleitoral no rádio e
na televisão começa no dia 17 de agosto. É o que determina a lei. Mas,
como dizia Getúlio Vargas para caçoar dos empresários que transgrediam
a legislação trabalhista, "a lei, ora a lei".

Seguindo à risca a essência desse preceito, o presidente Luiz Inácio
da Silva inaugurou o horário eleitoral de 2010 na quinta-feira 14 de
maio.

Usou o espaço reservado à propaganda do PT para apresentar a
biografia, os feitos no governo da pré-candidata à Presidência da
República, Dilma Rousseff, e para estabelecer comparações com o
governo anterior fazendo citações repetidas de Fernando Henrique
Cardoso e José Serra.

Um modelo idêntico ao dos programas eleitorais. Não se pediu votos,
mas nos programas mais bem elaborados tampouco há esse pedido
explícito, a não ser nos últimos já às vésperas das eleições.

Isso tudo aconteceu no exato momento em que o Tribunal Superior
Eleitoral condenava em termos duríssimos um outro programa do partido
feito quase nos mesmos moldes, embora bem mais amenos, apresentado no
fim de 2009.

A decisão de aplicar a multa de R$ 20 mil ao PT foi unânime. A maioria
multou Dilma em R$ 5 mil, voto vencido do ministro Marco Aurélio de
Mello, favorável à penalidade de R$ 20 mil também para a
pré-candidata.

Estava especialmente perplexo. Disse nunca ter visto "nada parecido"
em termos de transgressão nas três vezes em que acompanhou eleições na
condição de magistrado, nos últimos 19 anos.

Pois o Brasil acabara de assistir a infrações bem mais explícitas no
programa que, por atraso do TSE - provocado justamente pela posse de
Marco Aurélio pela terceira vez como ministro do tribunal - acabou
indo ao ar indevidamente.

Pelo seguinte: em função de ter transformado o programa partidário de
dezembro de 2009 em programa eleitoral, a penalidade seria a perda do
direito ao uso do mesmo espaço (10 minutos) no ano seguinte. Por causa
do atraso, o PT perdeu o programa partidário de 2011.

Quer dizer, investiu no abuso e ganhou.

E ainda há entre petistas a versão corrente de que a Justiça impõe
censura prévia ao partido quando, na realidade, acabou sendo
beneficiado pelo atrevimento.

Ultrapassa o limite da legalidade à vontade, mas se é punido alega que
há "judicialização" nas eleições, que o adversário quer ganhar "no
tapetão". Não demora, haverá acusações de que a Justiça Eleitoral
conspira contra a candidatura governista.

Um episódio dessa natureza já seria grave. Torna-se gravíssimo quando
se apresenta como reincidência deliberada. Assume proporções
escandalosas do ponto de vista institucional quando à frente desse
tipo de ofensiva está ninguém menos que o presidente da República.

O homem que por duas vezes tomou posse como chefe da nação, jurou
cumprir a Constituição do País, mas desobedece de maneira zombeteira a
uma simples lei eleitoral.

Durante o julgamento de quinta-feira o ministro Marco Aurélio de Mello
alertou que o somatório de infrações pode ter consequência mais à
frente. Óbvio, o primário não é tratado pela Justiça com a mesma
benevolência que o reincidente.

Se a candidatura de Dilma Rousseff vier a ser agravada, seus
correligionários não podem se dizer surpresos, pois terão sido
vitimados por seus reiterados desacatos à prudência, à lei e à Justiça
do País.

E quando o pré-candidato de oposição, José Serra, diz que Lula está
acima do "bem e do mal" avaliza suas atitudes e invalida as
reclamações do PSDB contra o programa do PT, pois se considera o
presidente superior a qualquer valor aceita também que esteja acima da
lei.

Tudo entendido. O "caso" do filme Tropa de elite 2 e a Câmara dos
Deputados é bem menos ruinoso do que parecia e está encerrado.
Primeiro, o presidente da Casa, Michel Temer, não proibiu as filmagens
no plenário por decisão autocrática.

É uma regra geral, explicada e devidamente aceita pelo cineasta José
Padilha. Segundo, as reclamações do deputado Alberto Fraga a respeito
do nome de um dos personagens do filme ("Fraga") foram encaminhadas à
procuradoria da Casa como mero ato burocrático.

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