Com os fundamentos macroeconômicos solidamente estruturados há 15 anos, ficam mais claros o potencial de crescimento do Brasil e a capacidade de enfrentar turbulências externas. Mas que fatores favorecem esse potencial e quais gargalos podem dificultá-lo?
Um dos fatores concretos que alicerçam um novo ciclo de crescimento é a redução do crescimento demográfico, algo a ser comemorado. A taxa média anual caiu para cerca de 1%, em decorrência da urbanização, da queda nas taxas de fertilidade e do uso intensivo de contraceptivos. Assim, no longo prazo, reduz-se a pressão sobre o mercado de trabalho e torna-se possível o incremento dos salários. Outro fator é a exploração de parte dos recursos naturais com níveis elevados de incorporação tecnológica e, em consequência, de produtividade. Isso explica o imenso potencial que tem o País para a produção de commodities. Na indústria, muitos segmentos se tornaram modernos e altamente competitivos no mercado mundial.
O recente crescimento da economia resultou do vigor do mercado interno. Mas não se deve atribuí-lo ao aumento do salário mínimo e ao Bolsa-Família. Essas são medidas redistributivas, ou seja, de transferência de renda, embora repercutam no mercado de bens populares. O consumo exacerbou-se porque, além do incremento do salário real, é maior a oferta de produtos agrícolas, e os industriais estão ficando mais baratos em razão dos rápidos avanços tecnológicos. Ampliou-se o acesso a bens antes restritos às camadas mais ricas: celulares, micro-ondas, TVs de tela plana, computadores pessoais, etc. Esse acesso mais diversificado ao consumo, associado ao crédito mais abundante - e a maior previsibilidade de pagamento em prazo longo -, dinamizou a economia.
Cabe lembrar, no entanto, que a indústria brasileira - que sempre produziu bens de consumo caros - se vem tornando uma indústria de montagem, com grande parte dos insumos e componentes vindos do exterior, especialmente da China e do sudeste asiático. O baixo custo do material asiático e a vantagem do câmbio tornaram os bens de consumo industriais ainda mais baratos para um povo que gosta de consumir. A ponto de a chamada classe C se sentir hoje como "classe média" simplesmente por dispor desses bens. Em suma, estabilidade da moeda, dólar barato, bens de consumo acessíveis e vendas em prazos longos geraram um ambiente de felicidade geral. Esta tem sido a base do dinamismo do nosso mercado interno: redução de custos dos alimentos e dos bens de consumo e aumento dos salários reais, ou seja, aumento generalizado do poder de compra.
Mas que fatores podem comprometer, em prazo longo, um ciclo de crescimento mais sustentado? Primeiro, os recursos humanos, de modo geral, não têm mostrado qualificação educacional e técnica para se integrar às mudanças dos processos produtivos. Em seguida, há que ponderar se o modelo de expansão predatória e devastadora da exploração dos recursos naturais não impõe um custo irreversível para a sociedade e para a inserção do País na economia mundial. E cabe questionar se um país pode ser industrialmente forte sem gerar inovação tecnológica e reduzindo-se à mera montagem de componentes.
Por fim, competitividade não se ganha só com aumentos de produtividade, mas também com disponibilidade de infraestruturas e serviços eficientes de logística, transporte, energia e telecomunicações. Nesse aspecto não é animadora a situação dos nossos portos, aeroportos, estradas e da geração de energia. Se o governo, diretamente ou por meio de parcerias, investisse mais do que o mísero 1% do PIB, em vez de inchar a máquina pública com despesas correntes, já seria um bom caminho. É prudente pensar que temos uma taxa de investimento muito baixa em relação ao PIB - de 18%, em contraste com 25% da Índia e 41% da China - e que sem poupança não há investimento. Na felicidade do consumo, não se pode esquecer que a Velha Senhora (inflação, lembram?) sempre é tentada a nos revisitar.
PRESIDENTE DO CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO DAS CIDADES DA FEDERAÇÃO DO COMÉRCIO DE BENS, SERVIÇOS E TURISMO DE SÃO PAULO, FOI DIRETOR DA ANAC