Comparado com igual período do ano passado, no primeiro semestre deste ano a receita do governo cresceu uma enormidade: nada menos que 16,0% em valores correntes e 10,4% em valores reais (descontada a inflação medida pelo IPCA).
A primeira impressão parece ótima. É o consumo avançando e o sistema produtivo superando a si mesmo. Pode-se acrescentar que a Receita Federal está mais eficiente no que tem de fazer; que a incorporação da receita da Previdência Social pela Receita Federal melhorou o desempenho do sistema previdenciário a ponto de puxar em 12,6% (em termos reais) a arrecadação; e que parcelas crescentes do setor produtivo vão deixando a "economia subterrânea" para serem incorporadas ao sistema formal. Mas um exame mais atento aponta para umas tantas irracionalidades.
A primeira delas está em que a carga tributária continua se expandindo. Os primeiros cálculos elaborados pela consultoria Tendências nos dão conta de que a União avança sobre quase 25% do PIB. Ou seja, apenas para sustentar o governo federal, o contribuinte entrega a cada ano o salário de três meses. A conta não pára por aí porque ainda é preciso acrescentar as fatias dos Estados e dos municípios. E então chegaremos a alguma coisa entre 37% e 38% do PIB.
A segunda irracionalidade desmascara a mistificação do discurso oficial. O aumento da arrecadação do primeiro semestre foi de R$ 45,3 bilhões em valores correntes e de R$ 29,1 bilhões em valores reais. Apenas em seis meses, o governo federal arrecadou acima do que disse que perderia com a CPMF em um ano.
A terceira tem a ver com o excesso de despesas. O governo não aceita a idéia de que precisa aumentar ainda mais o superávit primário (sobra de arrecadação para amortização da dívida pública) porque - alega - faltaria cobertura para as despesas correntes. Ora, de acordo com as previsões orçamentárias, o aumento das despesas primárias ao longo do ano será de 12% (em valores não deflacionados) e, no entanto, a arrecadação já aumenta ao ritmo de 16%. Esses números podem ter alguma variação, mas fundamentalmente apontam para o fato de que o governo está gastando demais e arrecadando mais ainda.
O resultado mais prejudicial é a inflação que se segue. Muita gente se apega equivocadamente ao argumento de que estes não são recursos fabricados pelas impressoras da Casa da Moeda, mas efetivamente arrecadados. E, por terem origem fiscal, não são inflacionários. No entanto, produzem inflação de outra maneira. Quando o governo aumenta suas despesas, despeja dinheiro na forma de pagamentos e isso turbina o consumo. E, quando o consumo cresce acima da oferta da economia (produção mais importações), como acontece agora, por efeito de uma procura maior do que a oferta, a inflação fica inevitável.
A distorção seguinte é a de que o Banco Central fica quase sozinho com a tarefa de atacar a inflação.
E dá-lhe juros, o que produz nova geração de distorções.
CENÁRIOS
Vai passar - As exportações de 2008 podem ultrapassar os US$ 200 bilhões. O ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, ainda trabalha com projeção (fortemente conservadora) de US$ 190 bilhões.
Com o bom desempenho do comércio exterior, cabem estimativas melhores. Se mantiverem o atual crescimento, de 25,5%, e levando-se em conta que o segundo semestre tende a ser melhor do que o primeiro, as exportações podem chegar aos US$ 201 bilhões.
Mas as importações avançam ainda mais (50,9%), o que permite puxá-las para cima dos US$ 182 bilhões.