Os dois primeiros são funcionários do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e estavam cedidos, havia alguns anos, ao Ipea. A nova direção do instituto decidiu não renovar seus contratos.
Com explicação semelhante, o governo da Venezuela promoveu o fechamento de um canal de televisão: apenas deixou de renovar sua concessão. É a democracia venezuelana, louvada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e agora adotada no Ipea como linha administrativa. Os novos problemas do instituto começaram quando o presidente da República o transferiu do Ministério do Planejamento para a área do ministro Mangabeira Unger.
Oficialmente, portanto, os dois economistas não estão sendo afastados por motivo ideológico, embora sejam conhecidos como críticos da política do governo. O caso mais notório é o de Fabio Giambiagi, nome familiar a quem acompanha os debates sobre política fiscal e previdência. Ele tem sido um defensor importante da contenção dos gastos públicos e foi um dos proponentes de uma política para equilíbrio total das contas governamentais. Tem-se notabilizado, também, por estudos a respeito da Previdência e pela defesa de uma nova reforma do sistema.
Bonelli e Rezende são aposentados, mas continuavam prestando serviços ao Ipea. São pesquisadores com respeitável produção, renome profissional e importante currículo de participação nos debates públicos. Foram convidados a sair, sob alegação de irregularidades em seus contratos.
Em entrevistas, Pochmann negou o expurgo e afirmou ser ele também um crítico da política econômica, mencionando seus ataques à política de juros. Mas essas críticas têm sido também as do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do vice-presidente da República, José Alencar, membro do PRB e responsável pela indicação de Mangabeira Unger. É, portanto, uma crítica alinhada.
Choques eram esperados. Ao tomar posse, Márcio Pochmann defendeu num discurso o aumento do gasto público, necessário, segundo ele, para a superação do raquitismo estatal - como se não estivesse falando de um Estado balofo e perdulário. Pochmann tem defendido também o aumento de contratações, como se o inchaço da folha de pagamentos fosse o remédio para uma administração pública pesada, ineficiente e sujeita, desde o começo da gestão petista, ao aparelhamento político.
Em artigo recente, Pochmann comparou o moderno agronegócio brasileiro à agricultura colonial (quando a produção era extensiva, baseada na mão-de-obra escrava e exportada apenas para a metrópole). O artigo, uma defesa da intervenção estatal na produção de biocombustíveis, seria apenas cômico, se não fosse assinado pelo presidente de um dos mais importantes centros brasileiros de pesquisa.
O contraste entre o nível acadêmico de Pochmann e o dos quatro profissionais por ele descartados não é, no entanto, o dado mais importante. Relevante, acima de tudo, é o abandono de um padrão de liberdade de opinião mantido, até agora, em toda a história do Ipea, desde o período militar. Essa mudança marca não só a direção do Ipea, mas também o ministério dirigido pelo professor Mangabeira Unger e o Palácio do Planalto. Essa marca é ignóbil e identifica um estilo de gestão e de política.
Se Márcio Pochmann tomou a iniciativa de afastar os quatro economistas, carrega todo o peso da decisão infame. Se apenas cumpriu uma ordem, sem se revoltar e sem pedir demissão, tornou-se cúmplice de uma ação indesculpável. Esse ato escandaloso pode ser o começo da destruição de um dos últimos centros de excelência do governo brasileiro. Para o presidente Lula, admirador de Chávez, isso pode não fazer diferença. Mas é uma estranha marca no currículo de dois professores universitários, Unger e Pochmann.