O Globo |
10/10/2007 |
O senador Renan Calheiros foi destituído ontem da presidência do Senado. Já não era mais, de fato, o presidente do Congresso, desde o momento em que deixou de presidir uma reunião para aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) com receio de protestos de um grupo de deputados. Ontem, deixou de ser de fato o presidente do Senado, depois que líderes da maioria dos partidos políticos pediram que se licenciasse do cargo para responder como um simples senador aos quatro processos que ainda restam no Conselho de Ética da Casa. Renan Calheiros já não tem o respeito de seus colegas nem da opinião pública. Caminha-se para a inviabilidade dos trabalhos do Senado sob sua direção. Mesmo com dificuldades de expressão, revelando seu desconforto, a sempre loquaz senadora Ideli Salvatti, líder do PT, aderiu ao movimento e admitiu que o ambiente no Senado já não era favorável à permanência de Renan Calheiros à frente dos trabalhos, embora em nenhum momento tenha saído de sua boca um pedido direto para que se licenciasse. Deixou a entender o apelo, mas não teve coragem de fazê-lo diretamente e frente a frente com Calheiros. É visível que o senador alagoano, embora queira transparecer uma cordialidade que já não lhe habita o espírito, está perdendo o controle. Ontem mesmo ele bateu boca com senadores, surpreso com a revelação pública de Mercadante de que lhe sugerira renunciar à presidência antes mesmo da votação na sessão secreta que o absolveu com a ajuda do PT. E irritou-se com uma gravação que comprova ter havido a tentativa de espionagem em Goiás, que o senador Demóstenes Torres colocou no som interno do Senado para todos os seus pares ouvirem. Nela, um advogado admite a um repórter da "Folha de S.Paulo" que ouviu do assessor Francisco Escórcio que Renan Calheiros estava muito preocupado com o rumo dos processos contra ele no Senado, embora o mais delicado já houvesse sido superado, e que por isso ele, Escórcio, estaria empenhado em espionar os senadores goianos para conseguir imagens num hangar de Goiânia que os comprometessem. Não há na gravação nenhuma prova formal de que o assessor estava agindo a mando do presidente do Senado, para quem trabalha diretamente, mas sobram evidências de que ele estava agindo para tentar ajudar Renan. Se o fazia à revelia, as investigações poderão prová-lo, mas a circunstância já indicaria a necessidade de que o presidente do Senado se sentisse impedido de continuar à frente da Casa até que tudo estivesse esclarecido, o mesmo valendo para os demais processos contra ele. O próprio Renan, ao tentar contestar Demóstenes, deu a dica para ser criticado. Disse que, ao colocar tal fita no sistema de som, o senador goiano estava transformando o Senado "em uma delegacia de polícia", abrindo espaço para ouvir a acusação direta, com os floreios verbais próprios dos debates do Senado: "Vossa Excelência é que é o culpado". A maior prova de que o senador Renan Calheiros usa e abusa do cargo de presidente para manobrar a seu favor, seja pressionando o presidente do Conselho de Ética para não dar curso aos processos dentro de prazos razoáveis, seja usando a assessoria do Senado a seu favor em diversas situações que por si só seriam quebra de decoro parlamentar, é o fato de que ele alega que, perdendo o poder, poderia ser cassado por seus pares. Estaria seguindo um conselho de um especialista, o deputado Jader Barbalho, que se licenciou da presidência do Senado devido a uma disputa política com o falecido senador Antonio Carlos Magalhães, e acabou renunciando ao mandato para evitar a cassação. É claro que o presidente do Senado não admite oficialmente essa posição, e alega que não se licencia para não parecer estar assumindo uma culpa que diz não ter. Mas ontem o senador Garibaldi Alves, de seu partido, disse com todas as letras que ele estava enganado ao pensar que perderia força política se se licenciasse. E o senador Pedro Simon lhe garantiu que teria mais condições de ser absolvido nos próximos processos licenciado do que se mantendo à força na presidência, e colocando todos os senadores num estado de tensão que já é palpável. Em nenhum momento Renan Calheiros negou que sua motivação para não deixar a presidência seria o receio de perder o poder de pressão que vem exercendo. Ao que tudo indica, a luz de advertência já acendeu para o governo com relação à votação da CPMF no Senado, que se anuncia impossível com Renan na presidência. A exigência da maioria é que todos os processos contra o presidente do Senado sejam votados no plenário até o dia 2 de novembro, data a partir da qual as oposições se uniriam para obstruir os trabalhos. Diante da posição intransigente de Calheiros, aparentemente apenas a cassação de seu mandato dará fim a essa crise interminável, e a votação secreta, numa sessão aberta, poderá ser um instrumento efetivo para que o governo se livre desse incômodo em que ele se transformou. Ontem não apareceu nenhum senador disposto a defendê-lo em plenário, embora ainda seja impossível afirmar que ele já perdeu a maioria do Senado. A pressão está tão insuportável, no entanto, que é possível que nas próximas horas ele se convença de que não tem mais cacife para insistir em blefar rodada após rodada. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, outubro 10, 2007
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