Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 15, 2007

Villas-Bôas Corrêa : A ressaca da insensatez

JB

Desde ontem e por toda a lombeira de domingo, a maioria dos 81 senadores e 513 deputados que aproveitaram a mordomia das quatro passagens aéreas mensais para fugir de Brasília e desfrutar os lençóis domésticos no fim de semana com a família, certamente, estão recolhendo a amostragem da reação popular dos amigos aos eleitores e conhecidos nos contactos das ruas, no papo descontraído dos cafés, na rotina do culto ao voto para a garantia da reeleição e do desfrute de um dos melhores empregos do mundo.

Mesmo quem acompanha o noticiário político nas lonjuras do interior não costuma distinguir as diferenças das atribuições dos senadores que representam o Estado do deputado que é - ou devia ser - o representante do povo. E, na ressaca da revolta com a insensatez suicida da absolvição do galante senador Renan Calheiros (PMDB-AL) das denúncias formuladas pelo PSOL sobre o pagamento de dívidas pessoais e da pensão alimentícia devida à sua filha de 4 anos, da relação extraconjugal com a jornalista Mônica Veloso, cada um levará para Brasília o depoimento, colhido ao vivo, na fonte, da desmoralização do mais democrático dos poderes.

Terá muito que contar das suas preocupações. Elas exigem a reflexão coletiva. Dá para fazer algumas contas. Dos 40 senadores que selaram a absolvição do demolidor de corações, não se deve esperar mais do que a repetição das razões de Estado que embasaram a sua defesa do mandato do presidente da Câmara Alta. No momento, muito por baixo.

Do outro lado da cerca, os 35 senadores derrotados, que votaram pela cassação do mandato de Renan, compõem a base para a tentativa de salvar os dedos, uma vez que as jóias sumiram no lamaçal.

Pois agora, mansos e cordatos, os líderes governistas vão se aproximar com a bandeirinha da pacificação para a trégua e mutirão para a restauração do prestígio e da credibilidade do Legislativo.

O entendimento é desejável, a única saída do beco sujo. O que o governo quer todo mundo sabe e o presidente Lula anda a repetir ao longo do roteiro pela maravilha de paz, civilização e beleza dos países nórdicos: votos para aprovar a Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF), indispensável para a montagem do canteiro de obras anunciado no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na arrancada eleitoral do próximo ano.

E, francamente, se a oposição no seu mais amplo sentido está levando a sério o blablablá sobre a reforma política é a vez e a hora de sentar e colocar as cartas na mesa. Pois a perspectiva é desalentadora: na pesquisa realizada pelo Globo sobre as reformas prioritárias, ouvidos os principais líderes políticos, as respostas foram de mediocridade decepcionante. Passam de raspão pela reforma política sem avançar propostas ou sugestões e esvoaçam sobre obviedades, como a criação de uma agenda com temas do interesse da sociedade, a sensata defesa do julgamento por quebra de decoro parlamentar pela Justiça, a modificação do regimento interno do Senado e da Câmara, o financiamento público das campanhas e a regulamentação da edição das medidas provisórias.

É a agenda de quem não quer reforma nenhuma, mas uma caiação das paredes externas para melhorar a aparência. Reformas para valer impõem a varredura do lixo das mordomias, das vantagens, dos privilégios, da verba indenizatória, das quatro passagens aéreas mensais, da semana de dois a três dias úteis.

Reformas indispensáveis e inevitáveis. Por enquanto, inviáveis. E, lá um dia, se não forem feitas por consenso, serão impostas na marra.

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