Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 18, 2007

Luiz Garcia - Luz própria, treva particular




O Globo
18/9/2007

Nosso presidente Lula produziu uma estranha declaração a propósito dos atuais aborrecimentos em Brasília. Disse que no Brasil não há impunidade.

Erro primário: se não houvesse mesmo, jamais seria necessário dizê-lo. De qualquer forma, exagero ou redundância, era dispensável dizê-lo. Mostra que o chefe do governo, num momento traumático do relacionamento entre a sociedade e a classe política, oferece apenas uma abobrinha sem sabor ou substância. É de seu feitio, dizem.

Seria mais sensato admitir que não existe um índice de impunidade que se possa aferir em qualquer dado momento. Temos, isso sim, nichos e momentos de punição adequada e de vergonhosa blindagem de indivíduos e grupos merecedores de punição exemplar.

O indiciamento pelo Supremo dos 40 do mensalão foi quase simultâneo com a votação do Senado absolvendo Renan Calheiros. Mas só simplórios incorrigíveis veriam nisso prova de que na média vamos mais ou menos bem.

Cada episódio tem sua luz própria. Ou sua treva particular. Outro dia, no STF, festejamos um momento do clarão; agora, está na hora da exegese da negrura.

Não é motivo para total desalento. É bom sinal que, no próprio Senado, não falta quem chame atenção para defeitos óbvios no mecanismo dos julgamentos internos. Como o absurdo de julgamentos secretos de representantes do povo por representantes do povo. Confrontados com a repercussão fortemente negativa na opinião pública, é possível que os senadores se disponham a mexer no regimento para passar a fazer tudo abertamente.

Nas próximas semanas, o país assistirá a um debate crucial e talvez fascinante: os senadores que querem salvar Renan, nos dois julgamentos que restam, enfrentando aqueles preocupados em salvar o Senado. No meio do tiroteio, o governo, que quer salvar tanto a CPMF como a pele de Renan. Um desses dois objetivos atende ao interesse nacional.

Para o país, a grande prioridade é a restauração do prestígio do Senado. Ela está nas mãos dos, digamos assim, senadores do bem. Têm pela frente dupla trabalheira: produzir nos próximos julgamentos decisões compatíveis com as provas e tomar a iniciativa de reforma dos procedimentos, no sentido de passar a fazer tudo às claras.

Muita gente, na turma dos que sabem das coisas, diz que esse é o preço da sobrevivência do Senado, e até da própria federação.

Arquivo do blog