Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 08, 2007

DORA KRAMER

Uma luz na escuridão


Conversar com o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, é um alento. Não porque seja um gênio, mas pela ausência de pretensão em se exibir como tal, pelo domínio que tem de sua pasta, por emitir opiniões assertivas e principalmente porque demonstra noção de que está numa função de governo não para defender projetos de poder ou servir a partidos, mas para fazer algo de útil, sejam pobres, remediados ou ricos.

A melhor qualidade de José Gomes Temporão é ser uma pessoa normal, com sentido de começo, meio e fim a respeito da tarefa que lhe foi atribuída.

Em duas horas, discorre sobre seu projeto de trabalho e não pronuncia uma única vez a palavra "elite". Não abraça a temerária tese já defendida pelo presidente Luiz Inácio da Silva de que a Saúde é "excelente" no País. Prefere a definição de um sistema "heterogêneo", legítimo representante do "ponto de encontro entre a miséria e a política pública".

José Gomes Temporão faz seu trabalho, diz a que veio e ponto. Compra as brigas que tem de comprar - contra o aparelhamento político na máquina do Estado, a indústria do álcool, a Igreja, a ineficácia resultante da estabilidade no emprego dos servidores da área, médicos, sobretudo -, faz as alianças que precisa fazer - com o empresariado tendo em vista o desenvolvimento da produção nacional de medicamentos e equipamentos - e não dramatiza nem se propõe a reinventar a roda.

Por isso, vale a pena o leitor firmar atenção nesse ministro que daqui a dez dias estará em evidência por ocasião do lançamento de um novo plano de promoção, gestão, financiamento e desenvolvimento tecnológico para a saúde pública no Brasil.

Temporão já começa por se diferenciar ao não aceitar chamar de "PAC" - "um nome muito ruim" - o projeto cuja meta prioritária é rever o conceito de saúde pública adotado até agora, segundo ele, "fragmentado" em programas isolados e que, por não terem eixos de condução muito bem delineados, se perdem na produção de um resultado final mais positivo.

Ele ainda não achou um nome mais adequado e, se achou, não revela, bem como não entra em muitos detalhes para não retirar o impacto do lançamento no próximo dia 18.

Adianta quatro pontos a serem atacados. O primeiro inclui campanhas - prioritariamente nas escolas - contra o consumo de fumo e álcool, informação sobre planejamento familiar, hábitos alimentares e exercícios físicos.

Farão parte dos currículos escolares? Temporão esconde o jogo, mas insinua um talvez.

O segundo ponto é a melhoraria no atendimento no SUS - "reduzir filas, ampliar programas, organizar os hospitais".

O terceiro diz respeito à gestão e adota a palavra-chave da "profissionalização". Vale dizer, taxa zero de indicações políticas e aprovação no Congresso do projeto das Fundações Públicas de Direito Privado, que permitiria as contratações mediante concursos, mas pela CLT, o que elimina a estabilidade no emprego.

Hoje os médicos ganham pouco, trabalham o correspondente aos baixos salários, fazem greve por isso e são indemissíveis.

Segundo o ministro, o PT e as centrais sindicais ligadas ao partido são os maiores focos de resistência numa posição que Temporão classifica como de "falsamente ideológica". E por que falsamente?

"Por que eles não têm proposta alternativa e acabam sendo obrigados a entender que a manutenção da situação atual significa despejo de dinheiro pelo ralo."

Com a sistemática das fundações, o ministro acredita poder se livrar da pressão - "ainda fortíssima" - dos partidos para indicações, principalmente de diretores de hospitais.

Temporão ri, mas não entra em detalhes quando é lembrado que o PMDB o inclui em sua "cota" de indicados para os ministérios depois de perder a parada diante da insistência do presidente Lula em nomeá-lo.

O combate no Congresso, ele está ciente, será duro, mas aposta no fato de a causa ser boa e, portanto, com grandes possibilidades de adesão popular. Conta também com a falta de argumentos dos adversários - já que não podem defender abertamente o loteamento político de um setor cuja percepção é de ineficácia - e com o apoio da oposição. "Por uma questão de coerência."

O quarto ponto, onde Temporão diz que haverá "novidades" de fundo, é fazer da produção de medicamentos e equipamentos médicos um setor economicamente muito mais significativo que a parcela dos 10% do PIB que hoje representa.

"É preciso tratar a saúde como área de produção de riqueza, desenvolvimento e qualificação profissional." Suas armas: o poder de compra do Estado e as linhas de financiamento do BNDES.

E as metas?

"Metas? Em saúde não existe isso. O objetivo é mudar a concepção, substituindo o amontoado de programas por um conceito de efeitos duradouros e consistentes e fazer funcionar."

Escala

Temporão faz um ranking de piores e melhores municípios na gestão de saúde. O melhor, para ele, é o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. O pior, o prefeito do Rio de Janeiro, César Maia.

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