Entrevista:O Estado inteligente

domingo, setembro 16, 2007

AUGUSTO NUNES SETE DIAS

Pena que o ministro das Cidades tenha sido traído pelo sorriso aparvalhado, que denunciava um coração em descompasso e uma cabeça em combustão. Não fosse isso, o palavrório de Márcio Fortes ao desembarcar do trem baleado faria bonito num congresso de xerifes de faroeste americano. "Sou muito frio nessas situações", jactou-se Fortes ao voltar da turbulenta incursão ferroviária pela região do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio.

A polícia carioca desaconselhara a viagem que levaria Fortes e o ministro dos Portos, Pedro Brito, a uma clareira aberta pela remoção de centenas de barracos. Teriam de cruzar terras sob o domínio da bandidagem, advertiram os sherloques. Não sabiam com quem estavam falando.

"Eu não iria desmarcar a visita para ceder a pressões", desdenhou o homem de gelo. Foi ele quem autorizou o embarque dos 70 integrantes da comitiva nos dois confortáveis vagões que restaram do Trem de Prata. Ao ouvirem o apito de partida, imaginaram-se a bordo de uma máquina do tempo sobre trilhos que remetem aos encantos do passado.

Os passageiros do sonho foram devolvidos aos pesadelos do presente quando o trem começou a travessia do território fora-da-lei. Assustaram-se com o som de um tiro. Entraram em pânico depois de mais quatro ou cinco disparos. E se atiraram ao piso dos vagões, abaixo da linha de fogo.

"Também me joguei, claro", confessou o ministro Pedro Brito. "É uma reação de cautela que todos devem ter". Menos quem sempre foi muito frio nessas situações: Fortes garantiu ter permanecido na poltrona enquanto durou o ataque promovido por pistoleiros da favela do Jacarezinho.

Aos repórteres que ainda convalesciam do passeio, o Indiana Jones do Planalto informou que o cenário do tiroteio lhe era familiar. "Já estive lá outras vezes, e sem seguranças", gabou-se. À espantosa revelação, seguiu-se o diagnóstico do doutor em Jacarezinho: "Foi um ato episódico".

Atos episódicos eventualmente se desdobram em dois capítulos, deveria ter ressalvado. Os pistoleiros que haviam atacado o trem na viagem de ida voltaram a agir, em escala ampliada, na viagem de volta. Estavam a bordo, postados nas janelas, policiais militares convocados às pressas para proteger os vagões. Mas todos os passageiros se atiraram ao chão. Até Márcio Fortes. "Estava calmo", exagerou. "Só me abaixei porque os funcionários pediram".

Habituados a tratar com deboche a tragédia nacional, os brasileiros viram no episódio a inauguração oficial da versão carioca do trem-bala prometido há muitos governos. Concentrada no desfile de obscenidades patrocinado pelo Senado, a imprensa não gastou muita tinta com um fato político-policial muito pedagógico.

O trem foi atacado por ter invadido uma das incontáveis áreas de exclusão existentes no país. Amputadas do mapa oficial, estão sob o controle de bandidos e à margem dos governos. Esquecido pelo Estado, esse Brasil excluído esqueceu o que é Estado. E manda bala até em ministro.

Cabôco Perguntadô

O presidente Lula informou que, quando deixar o Planalto, não pretende fazer bonito na Sorbonne ou em qualquer outro reduto de intelectuais grã-finos. Prefere gastar o tempo "viajando por todo o país". O Cabôco gostou de ler nos jornais que é isso o que Lula mais gosta de fazer. E aguarda com crescente ansiedade a divulgação do roteiro bolado pelo estadista em recesso. Será incluída no programa, por exemplo, uma viagem no trem-bala que passa pela região do Jacarezinho?

Pecar perto do povo é perigoso

Brasília tem habitantes. Mas não tem povo. Segundo os dicionários, povo é o conjunto dos habitantes de um país, um Estado ou uma cidade. Mas só há povo em cidades que têm esquina e, por conseqüência, o botequim da esquina. Brasília só tem cruzamento. E não existe o botequim do cruzamento.

No Rio, por exemplo, Renan Calheiros seria julgado com o povo na calçada do Senado e nos botequins das esquinas. Multidões por perto aguçam o instinto de sobrevivência. E Renan só teria um voto a favor. O dele.

A usina de idéias ronda o Senado

Apesar da trabalheira imposta a quem acumula os cargos de deputado federal e presidente do PT, Ricardo Berzoini mantém em funcionamento a usina particular de idéias cretinas. O bando de aloprados foi um fiasco. A cooperativa que prometeu levar a classe operária ao paraíso no Guarujá virou caso de polícia. Mas a última do inventivo companheiro - acabar com o Senado - deixou de parecer maluquice depois da absolvição de Renan Calheiros. Mais três sessões como aquela e o Senado, sem choro nem vela, acaba de vez.

O defensor da cidadania

A Adperj enviou à coluna, com o título reproduzido acima, o texto que se segue: "Elizeu Felício de Souza, condenado pela morte de Tim Lopes, era titular do direito de visita ao lar, conforme reconheceu o Judiciário ao permitir a visita. A eventual má utilização do direito sujeita Elizeu às conseqüências da lei. Inquestionável a atuação do defensor público Eduardo Quintanilha. A Defensoria Pública existe para assegurar os direitos da ampla e pobre maioria da população, e sua atuação não faz exceções nem admite relativizações".

Yolhesman Crisbelles

A taça vai para o senador Almeida Lima, sargento da tropa de Renan Calheiros, pela seguinte descoberta:

Estamos diante de uma mídia abjeta, desqualificada, torpe, impudica e manipuladora dos fatos e das pessoas, cujo objetivo é a difusão de que é poderosa para se fazer temida e, assim, fazer-se substituir às instâncias do Poder e, a partir daí, ditar os seus interesses e os interesses de quem, circunstancialmente, estiver a representar.

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