Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 19, 2006

Sanguessugas e mensaleiros na busca de voto

VEJA
E não é que eles insistem?

Envolvidos em escândalos buscam
votos apostando que o eleitor
é bobo ou não tem memória


Ronaldo Soares


O horário eleitoral gratuito trouxe de volta à TV rostos e nomes de políticos que ganharam fama nos últimos tempos por terem se envolvido em escândalos de corrupção. Só entre mensaleiros e sanguessugas há pelo menos 68 deles apostando na falta de memória dos eleitores e se arriscando nas urnas neste ano. As desculpas para se dirigir ao eleitor e pedir votos são as mais variadas. Uns apelam para discursos humildes – em que o candidato, no melhor estilo "Madalena arrependida" ao menos admite que errou. Outros partem para a clássica tentativa de desqualificar a acusação que lhes é feita e apelar para uma suposta relação de intimidade com o eleitor – é o estilo "Se colar, colou". VEJA selecionou trinta exemplos de candidatos que se viram envoltos no mar de lama que tomou conta da vida política e (embora na maioria dos casos as investigações ainda estejam em andamento) sentem-se à vontade para subir num palanque novamente.

Por incrível que pareça, são grandes as possibilidades de essa turma chegar (ou, na maioria dos casos, voltar) ao Congresso. E não simplesmente por um daqueles motivos que o senso comum explica com clichês como "brasileiro não sabe votar". Claro que miséria e baixa escolaridade, presentes nos grotões, ajudam a formar currais eleitorais dominados por políticos assistencialistas, mas há outro fator fundamental. A cientista política Lucia Hippolito explica que o voto proporcional, formado pela combinação de legenda partidária, coligação e sobras eleitorais, gera uma distorção no sistema eleitoral, pois infla os candidatos com votos que no fundo eles não receberam. Para se ter uma idéia, na atual legislatura apenas 33 dos 513 deputados federais (menos de 6,5% da Câmara) foram eleitos com os próprios votos, ou seja, atingiram quociente eleitoral. "O eleitor pode até saber em quem votou, mas não sabe que acabou elegendo outros com seu voto. Essa distorção do nosso sistema aumenta o risco de eleger um Congresso entupido de mensaleiros e sanguessugas", diz Lucia.

No caso do mensalão, onze dos dezenove deputados implicados acabaram absolvidos na Câmara – com direito a uma comemoração emblemática, a dança da pizza, da petista Angela Guadagnin –, mas o prejuízo aos cofres públicos foi de 100 milhões de reais, só no caso dos Correios. Já no escândalo da máfia das ambulâncias foram desviados mais de 110 milhões de reais em recursos da Saúde. Casos como esses contribuíram para deixar a atual legislatura tristemente conhecida como a mais corrupta da história e fizeram aumentar a lista de parlamentares sob suspeita de ter cometido algum crime. Entre os 594 deputados e senadores, pelo menos 130 estão sob investigação, o equivalente a 22% do Congresso. Na lista de crimes, há casos de formação de quadrilha, peculato, escravidão, lavagem de dinheiro, seqüestro e estelionato, entre outros.

Para evitar que a próxima legislatura repita (e até piore) os descalabros da atual, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) encaminhou consulta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) propondo que candidatos comprovadamente envolvidos em crimes sejam impedidos de tomar posse. Ainda em discussão, a iniciativa já gerou ao menos um resultado positivo. O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, enviou a todos os procuradores regionais eleitorais pedido do deputado para que se comece a colher provas para a eventual impugnação do mandato de políticos envolvidos em escândalos. É uma medida bem-vinda. No entanto, o arsenal mais eficiente para mudar o atual quadro estará sempre nas mãos do eleitor. É ele que, com seu voto, pode consagrar ou contribuir para banir determinadas práticas da vida pública do país.

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