Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, agosto 24, 2006

Anistia para Lula

Anistia para Lula

Artigo - Otávio Frias Filho
Folha de S. Paulo
24/8/2006

CERTOS OU errados, nove entre dez colunistas políticos prevêem vitória de Lula no primeiro turno da eleição. O próprio presidente se esbalda no "já ganhei", chegando ao cúmulo de marcar compromissos para 2008. A 37 dias da votação, seu favoritismo segue impávido nas pesquisas.
É evidente que a decisão do eleitor será soberana (não existe um Carlos Lacerda propondo melar as regras do jogo). Mas se o veredicto for esse, dispensando o segundo turno, a afoiteza do eleitor terá prejudicado a qualidade democrática desta eleição.
A experiência mostra que só existe alguma discussão de programas de governo no segundo turno, quando o presidente se desgasta demais se não participar de debates e a sociedade se galvaniza em torno de duas personalidades, dois estilos, duas visões em confronto.
Isso é mais verdade ainda no caso de um presidente que, no governo, traiu quase todas as idéias-feitas que pregava nas duas décadas anteriores. E no caso de um partido ideológico cuja cúpula, uma vez no poder, converteu-se em verdadeira "quadrilha", como a definiu o procurador-geral da República.
A população mais carente tem boas razões para estar satisfeita com os preços, com o aumento do salário mínimo, com as transferências de renda (e de votos...). Nem por isso a reeleição do atual presidente, se de fato ocorrer, deixará de ter um significado sinistro. A mais alta corte do país, o próprio povo, terá anistiado o escândalo do mensalão.
Um presidente macunaímico, que se orgulha da própria falta de estudo, seria reconduzido sem trauma nem esforço. O partido que lhe serviu de alavanca, o PT, pode não sair destroçado das urnas, mas será um fantasma do que já foi.
Políticos sem doutrina, a maioria, farão fila para apoiar um chefe de governo novamente forte. Semanas atrás, o presidente lançou a proposta marota de uma "Constituinte" para fazer a reforma política no ano que vem. As reações vigorosas mataram o assunto, por enquanto. Mas a idéia é perigosa e pode voltar tão logo Lula se sinta reinstalado no posto, com mais força ainda se não tiver de enfrentar um segundo turno.
Constituinte para fazer a reforma política? Por que não aproveitar e prorrogar seu mandato, garantir o direito a nova reeleição, decretar que só poderão concorrer candidatos "progressistas"? Estamos longe de ver essas fantasias se concretizarem. Mas não custa alertar.
A oposição estava certa, hoje ficou claro, quando evitou insuflar o impeachment de Lula. Teria provocado um mártir, um Getúlio vivo. Não que Lula não soubesse de nada: é evidente que sabia, embora provas irrefutáveis não tenham, ainda, aparecido. Reeleito, estará anistiado.

OTAVIO FRIAS FILHO é diretor de Redação da Folha

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