Novo padrão
É preciso reforçar a luta contra o prototerrorismo: a sociedade
paulista deve deixar claro que não se curva à "lei" dos bandidos
A SEGUNDA onda de ataques do crime organizado em São Paulo mudou de
padrão em relação à primeira série, ocorrida há dois meses. Seja
porque tenha ficado mais difícil atingir as forças de segurança, seja
porque os bandidos tenham entendido que semear pânico na população é
tão eficaz para seus propósitos quanto atirar em policiais -e bem
menos arriscado-, o foco desta vez foram missões depredatórias e
espalhafatosas: ônibus e caminhões de lixo incendiados, bombas
caseiras deixadas em locais públicos, agências bancárias e de
veículos alvejadas.
A descrição, feita anteontem pelo comandante da Polícia Militar
paulista, do perfil dos autores dos ataques se harmoniza com essa
nova faceta da ação delinqüente. "Agora são adolescentes, a maioria
com 20, 18 anos", disse Eliseu Eclair Teixeira. Alguns dos "comandos"
foram despachados para o local do crime de bicicleta, armados com
paus, galões de gasolina, coquetéis molotov. Nos ônibus, entram nos
coletivos, ordenam aos passageiros que desçam e ateiam fogo.
Como já se havia prenunciado no final da primeira onda de ataques -na
segunda-feira, 15 de maio, o pânico foi tamanho a ponto gerar um
"toque de recolher" espontâneo a partir do final da manhã na capital
paulista-, lidar com essa nova ameaça urbana requer uma mudança de
atitude na própria sociedade paulista. Não é o caso de conformar-se à
situação, no sentido de deixar de cobrar com cada vez mais força que
as autoridades públicas dêem cabo da quadrilha que promove tais atos
acintosos.
Pelo contrário, é o caso de fornecer mais um subsídio à luta contra
os prototerroristas e demonstrar-lhes que a sociedade paulista não se
curva à sua "lei". Foi uma pena as autoridades municipais e estaduais
terem permitido que os criminosos promovessem mais um dia de "apagão"
no transporte da capital. Já deveriam estar preparados para a
ocasião, para garantir a saída da frota de ônibus às ruas.
"Queremos trabalhar", reivindicavam milhares de pessoas diante da
ausência de transporte coletivo na manhã de anteontem, na zona sul de
São Paulo. Manifesto sensato, correto, mas frustrado pela falta de
previdência da gestão pública. Tanto melhor que, depois disso, uma
solução à primeira vista satisfatória tenha sido encaminhada: haverá
policiais vestidos em trajes civis protegendo os coletivos, de forma
aleatória, mas freqüente.
Sociedades que convivem com ações intimidatórias de grupos criminosos
ou terroristas aprendem rapidamente uma lição: terão sucumbido à
lógica selvagem do inimigo no momento em que se permitirem uma
alteração drástica de rotina motivada pelos agressores. A diferença,
argüirão alguns, é que a população de alguns desses países, muitas
vezes desenvolvidos, tem motivos para confiar na capacidade de reação
do Estado. É verdade, mas o Brasil é uma democracia, o que significa
que o destino da sociedade -incluindo a melhoria dos serviços
públicos- não está nas mãos dos governantes, e sim nas da população.