Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 29, 2006

Dora Kramer -Governo entra na roda

ESTADO

Na segunda etapa, CPI vai se concentrar em investigar ação da máfia nos ministérios

Dora Kramer

Daqui a uma, no máximo duas semanas, a CPI dos Sanguessugas entrega seu relatório final, cuja elaboração terá a orientação técnica do procurador Mário Lúcio Avelar do Ministério Público de Mato Grosso, e logo em seguida inicia uma segunda, e mais sensível, fase de investigações.

Vai se dedicar a desvendar as ações da máfia especializada em fraudar o Orçamento da União dentro dos ministérios. O principal foco é a pasta da Saúde, responsável pelos convênios com prefeituras para compra de ambulâncias. Da procuradoria em Mato Grosso chegam informações de que os acusados que negociaram regime de delação premiada fizeram novas revelações que apontam para o Poder Executivo.

"Parlamentares, é claro, não fizeram o que fizeram sozinhos", pondera o deputado Fernando Gabeira. O líder do PMDB na Câmara, Wilson Santiago, por exemplo, já fez questão de dizer à CPI que o ofício assinado por ele pedindo a contratação de Maria da Penha Lino foi aceito em tempo recorde e sem nenhuma burocracia ou resistência pelo gabinete do então ministro Saraiva Felipe, numa insinuação de que seria mero intermediário.

Presa pela Polícia Federal na Operação Sanguessuga, Maria da Penha facilitava a liberação do dinheiro das emendas no Ministério da Saúde e foi quem primeiro denunciou a existência de uma grande quantidade de parlamentares envolvidos. Em seu depoimento ela falou em cerca de 80. Hoje são 116, 80% dos quais, segundo o vice-presidente da CPI, Raul Jungmann, com fortes indícios de culpa.

Gabeira e o grupo que enfrentou toda sorte de pressões até conseguir instalar a CPI continuam empenhados em evitar a politização dos trabalhos, mas reconhecem que nessa etapa seguinte isso será mais difícil por causa da proximidade das eleições e pela evidência de que o atual governo procurará dividir responsabilidade com o antecessor, cujos representantes não deixarão de reagir como, aliás, aconteceu nesta semana.

O Ministério da Justiça e a Controladoria-Geral da União vieram a público informar o nome de mais quatro parlamentares envolvidos e agora vários ministros lembram que as negociatas com as emendas ao orçamento ocorreram também ao tempo do governo Fernando Henrique Cardoso.

Gabeira acha que o governo se "equivocou" ao acreditar que havia um movimento dentro da CPI para prejudicar a campanha à reeleição do presidente Luiz Inácio da Silva e considerou inútil a tentativa dos ministros de neutralizarem as informações prejudiciais à atual administração divulgando outras desfavoráveis aos adversários de Lula.

"Se tentaram criar constrangimentos ou dificuldades não conseguiram porque os dados apresentados não alteram a essência da lista já constante no processo e não provoca nenhuma guinada nas investigações."

Há divergência na CPI sobre a inclusão ou não dos nomes apresentados pelo governo. Gabeira e Jungmann são favoráveis, não vêem razão para excluí-los, mas a decisão final só será tomada na próxima semana porque o sub-relator Carlos Sampaio em princípio foi contra alegando ausência de indícios contra eles.

Fernando Gabeira considera que não vale a pena a CPI se expor à suspeita de que estaria protegendo alguém e diz: "Se forem inocentes, isso aparecerá na investigação."

Jungmann pensa o mesmo, mas não deixa de impor reparos à atitude, para ele uma "tentativa patética" de conturbar os trabalhos e instalar um clima de "campeonato de corrupção".

"As informações são bem recebidas, mas a forma como foram apresentadas denota desejo de politização semelhante ao ocorrido em outras CPIs e que resultou em desmoralização de ausência de conclusão dos trabalhos", analisa, referindo-se à CPI do Banestado, onde uma briga entre PT e PSDB deixou a investigação sem relatório e, portanto, sem atribuição de responsabilidades.

O comando da CPI dos Sanguessugas está mantendo os preparativos para a segunda etapa de investigações propositadamente fora na cena principal para evitar que se instale desde já um ambiente de pressões e contrapressões.

Mas, ao contrário do combinado no início da CPI, em junho, ela não terminará mais em 60 dias. A comissão funcionará até o fim do ano, justamente para, de setembro a dezembro, se dedicar a descobrir, e revelar, os cúmplices da máfia (ou máfias) do orçamento no Poder Executivo, onde estão os responsáveis pela liberação do dinheiro com o qual as prefeituras faziam as compras superfaturadas.

TRÊS EM UM

O presidente Lula conseguiu cometer três gafes numa só frase ao pretender demonstrar indiferença ao apoio de Itamar Franco a Geraldo Alckmin. "Depois dos 75 anos as pessoas podem dizer qualquer coisa", disse.

Desrespeitou os mais velhos, impondo-lhes a pecha de desvairados inimputáveis; feriu o preceito da liberdade de expressão garantida a todos e não só aos cidadãos com mais de 75 anos; invalidou as críticas que faz às manifestações políticas de Fernando Henrique Cardoso, 75 anos completados este ano.

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