Entrevista:O Estado inteligente

domingo, julho 23, 2006

Mailson da Nóbrega Educação: que prioridade?

ESTADO


No seu primeiro discurso como candidato à reeleição, Lula falou que daria prioridade à educação. O senador Cristóvam Buarque e o ex-governador Geraldo Alckmin, também candidatos, disseram o mesmo. Declarações semelhantes foram feitas por FHC em suas campanhas.

Trata-se de uma enorme evolução. No passado, os candidatos prometiam mais obras públicas e promoção do desenvolvimento via intervenção estatal. No modelo nacional-desenvolvimentista, a educação não exercia papel relevante.

Os ingredientes desse modelo eram a substituição de importações; a concessão de subsídios e incentivos fiscais aos vencedores escolhidos pela burocracia; o crédito subvencionado dos bancos oficiais e os investimentos de órgãos públicos e estatais em infra-estrutura.

Nesse modelo, o Brasil crescia pela incorporação de fatores de produção - capital físico e humano. Ganhos de produtividade não derivavam da concorrência, da inovação, da tecnologia e da educação, como é típico nas economias de mercado bem sucedidas. Decorriam essencialmente da mão-de-obra que migrava do campo para as cidades e passava a trabalhar com máquinas e equipamentos industriais modernos.

Em países como EUA, Japão e Coréia do Sul, a educação constituiu componente fundamental do desenvolvimento. Em 1800, os americanos já possuíam a população mais alfabetizada do mundo. Entre 1825 e 1850, surgiram escolas públicas e gratuitas para todas as crianças. Em 1850, 97% da população era alfabetizada. No Brasil, 20 anos depois, essa proporção era de apenas 15%.

O Japão elegeu a educação como prioridade durante a Revolução Meiji (1868). Antes disso, na dinastia Edo, mais de 80% dos homens e 70% das mulheres eram alfabetizados. Há mil anos, a educação feminina já havia se tornado uma preocupação, inclusive porque elas poderiam defender o país com seus esposos.

A rápida transformação da Coréia do Sul derivou de um moderno sistema educacional, resultante da ação do governo e, com o fim da ocupação japonesa, do ressurgimento do zelo pela educação. No início dos anos 1960, o país havia universalizado a educação fundamental.

No Brasil, a prioridade foi o ensino superior gratuito. Somente na virada do milênio é que universalizamos o ensino fundamental, que ainda carece de qualidade. Por isso, a escolaridade média da população de 15 anos ou mais é de apenas 4,9 anos. Na América Latina, essa média é de 6,1 na Costa Rica, 7,2 no México e 8,8 na Argentina. Nos EUA, Japão e Coréia do Sul, passa de 10 anos.

O Brasil gasta em educação 4,2% do PIB, tanto quanto a Coréia do Sul e mais do que o Japão (3,8% do PIB). O problema não é, pois, de recursos, mas de como são gastos. Não há justificativa econômica nem social para a gratuidade nas universidades públicas, dado o elevado retorno da educação superior. Na China e nos EUA, o ensino superior é pago. Nos EUA, os que não podem pagar recebem crédito para reembolsar quando passarem a exercer uma atividade profissional.

Estudos mostram que a gratuidade no ensino superior brasileira é fonte de concentração de renda, até porque os pobres pagam impostos para subsidiar a educação dos não pobres. Infelizmente, rever essa distorção e priorizar a educação das crianças e jovens é um tabu. A esquerda atrasada não admite discutir o tema.

Sérgio Guimarães Ferreira e Fernando Veloso escreveram excelente texto sobre a educação no Brasil, incluindo comparações internacionais e propostas de reformas. O texto é uma colaboração para o livro “Rompendo o Marasmo”, de Armando Castelar Pinheiro e Fabio Giambiagi, cuja leitura já recomendei neste espaço. Entre suas propostas, estão a universalização do ensino médio, a expansão do crédito educativo e a cobrança de mensalidade nas universidades públicas, direcionando os respectivos recursos para melhoria da qualidade do ensino básico.

Na educação, contrariamente ao que diz, Lula tem adotado a prioridade errada, pois acentuou a ênfase tradicional no ensino superior, incluindo proposta de cotas raciais e reserva, às universidades federais, de 75% das verbas da União destinadas à educação. A educação é crucial para o desenvolvimento. A prioridade deve ser o ensino básico, inclusive para permitir que os pobres possam melhorar seu acesso à educação superior.

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