Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 29, 2006

VEJA Roberto Pompeu de Toledo


"Eymael almoçou num restaurante por quilo"

A esdrúxula cobertura da eleição presidencial na TV, por força das armadilhas da lei eleitoral

Na quinta-feira 20, Luciano Bivar foi a Mogi Guaçu, São Paulo, onde pregou o imposto único. José Maria Eymael fez palestra em Brasília num congresso de trabalhadores da área de turismo. Na sexta 21, Luciano Bivar percorreu a Rua 25 de Março, em São Paulo. José Maria Eymael esteve em Anápolis, Goiás. Visitou o túmulo do ex-governador Henrique Santillo no cemitério São Miguel e almoçou num restaurante por quilo. No sábado 22, Luciano Bivar caminhou pela Rua XV de Novembro, uma das mais movimentadas de Curitiba. Cumprimentou artistas de rua e falou sobre segurança pública. José Maria Eymael passeou pelo calçadão de Itajaí, Santa Catarina. O leitor está gostando? Tem mais. Na segunda-feira 24, Luciano Bivar caminhou pela Praça da Sé, em São Paulo. Cumprimentou os transeuntes, ouviu taxistas e camelôs. José Maria Eymael fez caminhada em Guarulhos, na Grande São Paulo.

As atividades de Luciano Bivar e José Maria Eymael vêm sendo noticiadas, passo a passo, pelo Jornal Nacional e outros noticiários da Rede Globo. Eles são candidatos a presidente da República. Sim, são, o leitor pode não acreditar, mas são. Luciano Bivar é um sujeito com ares de galã maduro, pomposa cabeleira grisalha, faces rosadas. No dia em que caminhou pela Praça da Sé vestia uma camisa azul de manga comprida, bem aberta no colarinho, o que, no centro de São Paulo, numa segunda-feira, lhe emprestava um jeitão de turista. Bivar é muito rico, conforme indica a declaração de bens que apresentou à Justiça Eleitoral. Tem aplicações nos Estados Unidos e apartamentos no Recife, onde nasceu, e em São Paulo. Possui também um revólver, um Taurus calibre 38, modelo 85vl 51mm, no valor de 590 reais. Sua página na internet descreve-o como "empresário segurador, desportista e bacharel em direito".

Para quem continua sem acreditar que ele é candidato, digamos, aproveitando o jeito com que se apresentava na Praça da Sé, que é antes um turista entre os inscritos na eleição presidencial. Desses candidatos que entram sem possibilidade de ganhar, mas também sem se importar com isso, visando a sabe-se lá que vantagens. Talvez se inscrevam por diversão. Para vencer o tédio deve ser ótimo ser candidato a presidente. É uma experiência diferente. José Maria Eymael é um candidato da mesma extração, com uma particularidade – é um reincidente. Já foi candidato a presidente em 1998. É um profissional das candidaturas perdidas por antecipação.

Em outros países também há candidatos turistas. A diferença é que não contam com cobertura da principal rede de televisão. Não é porque considere relevantes as caminhadas de Bivar e Eymael, no entanto, que a Globo as acompanha, e sim por força das armadilhas da lei eleitoral. A emissora traçou um plano de cobertura que prevê debates entre os candidatos e entrevistas. Ocorre que, segundo a legislação, é obrigatório chamar para os debates todos os candidatos de partidos com representação na Câmara. Para as entrevistas, se um é convidado, os demais também têm de ser. São regras que, ao dar peso igual a quem tem representatividade diferente, inviabilizam um bom formato tanto para os debates quanto para as entrevistas. Para contornar tais imposições, a Globo firmou acordos com Bivar e Eymael – cobriria suas atividades de campanha, em troca da renúncia a participar dos debates e das entrevistas. A emissora acaba prestando um serviço suplementar à dupla. Não fossem seus repórteres e técnicos a chamar atenção, eles passariam despercebidos nas ruas.

Os partidos de Bivar (PSL) e Eymael (PSDC) nem têm mais representação no Congresso. Elegeram apenas um deputado cada um em 2002, e tanto num caso como no outro os eleitos bandearam-se para outros partidos. Como já tiveram representação, porém, a Justiça Eleitoral entende que seus candidatos continuam a fazer jus à cobertura televisiva. As emissoras ficam na contingência de dar voz e imagem a pessoas que valem tanto para o interesse público quanto os pedestres com que cruzam em suas caminhadas. A lei proíbe também que se façam comentários, a favor ou contra os candidatos, na televisão, em mais uma contribuição para a escolha do eleitor às escuras. Já cansou ouvir que é urgente uma reforma política. Já cansou, igualmente, ouvir que a reforma não virá porque os encarregados de aprová-la, os políticos, se aproveitam do sistema tal qual é. Que fazer? Nada. A via insurrecional parece desaconselhável.

Na terça-feira 25, Luciano Bivar fez uma caminhada em Porto Alegre. Visitou a Câmara dos Vereadores e o Clube dos Treze, que reúne os principais clubes de futebol. Eymael esteve em Itu, no interior de São Paulo, onde foi à escola que leva o nome do irmão diácono, já falecido. Na quarta-feira 26, Bivar passou a manhã em São Paulo e à tarde viajou para Limeira. Eymael dedicou o dia a João Pessoa. Passeou pela cidade e visitou o Sindicato da Polícia Civil da Paraíba. Na quinta 27, Luciano Bivar encontrou-se com empresários de Brasília. José Maria Eymael fez caminhada em Campina Grande e jantou com políticos locais.

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