A pesquisa do Ibope divulgada anteontem traz razões de alegria para
os dois principais candidatos à Presidência da República. Tem
tendências para todos os gostos, como a mostrar que o eleitor
brasileiro ainda não decidiu como votar. Um exemplo disso é que 38%
dos pesquisados não escolheram seus candidatos de maneira espontânea.
Embora a pesquisa do Ibope apresente uma clara tendência de desgaste
das intenções de voto do presidente Lula, o presidente do instituto,
Carlos Augusto Montenegro, continua achando que Lula pode ser
reeleito no primeiro turno: “Vamos ficar naquela angústia até o final
da campanha para saber se vai dar segundo turno”, diz ele.
Alguns bancos de investimentos levam em conta nas suas análises a
capacidade de comunicação do presidente Lula para apostar na
tendência de crescimento de sua candidatura com a propaganda
eleitoral na televisão, e não ao contrário. Montenegro enumera alguns
pontos positivos para Lula: seu voto está muito cristalizado, na
escolha espontânea ele aparece com 32% das intenções, mais que o
dobro de Alckmin, que fica com 14%.
No Nordeste, onde vence de 66% a 13%, Lula tem nada menos que 44% de
intenções espontâneas de voto, o que sinaliza que vai ser muito
difícil Alckmin quebrar essa barreira, montada especialmente com o
Bolsa Família, mas certamente sustentada pela política de aumento
real do salário-mínimo combinada com o crédito consignado. Os efeitos
econômicos dessas medidas fazem com que regiões do Nordeste tenham
crescimento chinês, o que neutralizaria a influência dos caciques
políticos regionais, hoje na sua maioria engajados na campanha de
Geraldo Alckmin.
Mesmo Alckmin tendo melhorado sua situação, indo de 8% na pesquisa do
mês passado para 13% hoje, Lula manteve sua posição estável,
variando, dentro da margem de erro, de 68% para 66%. Essa será a
grande mudança de paradigma nestas eleições, caso Lula seja reeleito
principalmente pela penetração que conseguiu no Nordeste. Na análise
dos tucanos, não há eleição no Brasil que tenha revelado disparidades
regionais como as que as pesquisas eleitorais mostram hoje.
Lula vence em todas as regiões, segundo o Ibope, mas a diferença vem
sendo reduzida, tanto pela queda de Lula quanto pelo crescimento de
Alckmin, o que significa uma tendência: no Norte/Centro-Oeste, Lula
tem 39% a 31%, mas Alckmin vinha de 14% e Lula tinha 51%; no Sudeste,
Alckmin subiu de 26% para 34% e Lula ficou estável em 37%; no Sul,
Lula tinha 38% e hoje tem 33%, enquanto Alckmin subiu de 20% para 27%.
Para compensar a força de Lula no Nordeste, que representa 27% do
eleitorado brasileiro, Alckmin teria que abrir vantagem sobre Lula
nas regiões Sul e Sudeste, que juntas formam 60% do eleitorado. O
desgaste de Lula é generalizado, com exceção do Nordeste, e o debate
ético que será aprofundado na televisão é, na análise dos
oposicionistas, o responsável por essa mudança de atitude do eleitor
nas regiões Sul e Sudeste, que já começa a ser apontada pelas pesquisas.
Os coordenadores da campanha de Alckmin acham que a tendência a seu
favor nessas regiões se firmará e influenciará o voto do Nordeste,
mas este é um paradigma tradicional da política brasileira que está
sendo posto à prova nestas eleições. Por enquanto, Lula mostra também
uma força eleitoral bastante consistente no Sudeste do país, que
representa 45% do eleitorado, apesar do crescimento de Alckmin.
A força eleitoral remanescente de Lula em São Paulo, em Minas e no
Rio de Janeiro desafia os líderes oposicionistas que dominam as
corridas regionais: o governador Aécio Neves, em Minas, e o PSDB
paulista, cujos principais líderes são o próprio ex-governador
Geraldo Alckmin, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o
candidato a governador José Serra.
Tanto Aécio como Serra tendem a vencer no primeiro turno, mas não
repassam seu potencial de votos para o candidato tucano à
Presidência. No Rio, o PMDB vence no primeiro turno com larga margem,
mas não consegue neutralizar a força eleitoral de Lula, que tem no PT
um partido inexistente em termos eleitorais no Rio.
Mas há outros sinais de alerta para Lula na pesquisa Ibope: a
avaliação positiva (“ótimo/bom”) do governo Lula caiu de 44% para
39%, e a negativa (“ruim/péssimo”) subiu de 19% para 23%. Somada à
redução das intenções de voto, tem-se o desenho de uma tendência
eleitoral consistente.
A realização ou não do segundo turno depende também de quão
consistente será a performance da senadora Heloísa Helena, do PSOL,
e, mais que isso, de que tipo de eleitor ela estará atraindo. Seu
crescimento para a casa dos dois dígitos, detectado pela última
pesquisa Datafolha, foi confirmado pelo Ibope dentro da margem de
erro da pesquisa: Heloísa teve 8% e pode estar com os mesmos 10% do
Datafolha. Mas pode também ter estancado ou estar caindo, devido à
sua agressividade.
A senadora Heloísa Helena parece estar atraindo os petistas
desiludidos com o governo Lula, os que pretendiam anular o voto e
aderem ao mote “não vote nulo, vote nela” e também uma parcela da
classe média que busca uma alternativa eleitoral que represente a
ética na política, voto que já foi de Lula em 2002.
No caso de um segundo turno entre Lula e Alckmin, os eleitores de
Heloísa Helena tendem a mudar o voto para Alckmin em sua maioria,
segundo a pesquisa do Datafolha. Mas o presidente do Ibope, Carlos
Augusto Montenegro, chama a atenção para o fato de que uma parte
ponderável desses eleitores é também de adversários ferrenhos do
PSDB. A discussão sobre o voto útil em Lula pode acontecer antes
mesmo do segundo turno, para conseguir esvaziar a candidatura de
Heloísa Helena e fazer com que Lula vença ainda no primeiro turno.