Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, maio 12, 2006

Luiz Garcia - Perdendo o bode da História




O Globo
12/5/2006

Cientistas sociais e institutos de pesquisas, pelo visto, não têm meios de conferir periodicamente o Índice Nacional de Indignação Cívica. Por isso, apenas como palpite de amador, proponho a tese de que o Inic anda baixo na sociedade brasileira.

Pode ser cansaço. A novela do mensalão foi longa e exaustiva: quase todo dia entrava em cena um novo escândalo. Ou mais um vilão. Houve, sempre há, um e outro herói — mas os mais fascinantes atores em cena eram os vilões, do histrião Roberto Jefferson ao sinistramente calvo Marcos Valério. Sem esquecer o arrogante Duda Mendonça.

A todos demos atenção prolongada e bem dosada indignação. Foi um tempo de alto Inic e horas sem conta acompanhando a novela das CPIs na televisão.

Hoje, o escândalo da máfia das ambulâncias está todo dia na mídia, contado em detalhes. E quem está prestando atenção? No entanto, trata-se de um roubo de recursos públicos — o seu, o nosso dinheiro — provavelmente em escala maior do que tudo que possa ter sido garfado (até hoje não se sabe ao certo) no escândalo do valerioduto. Até agora, há 170 deputados federais acusados de assinar emendas para a compra superfaturada pelo governo de equipamento hospitalar, principalmente de ambulâncias, no país inteiro. Tudo apurado pela Polícia Federal, que já prendeu 48 pessoas. Os deputados recebiam, segundo as acusações, entre 10% e 20% do valor de cada emenda apresentada.

É verdade que não há ministros nem políticos importantes, até agora, entre os envolvidos. Mas o dano que o escândalo pode causar ao Congresso é monumental. Principalmente por se tratar de um corpo político já debilitado pelo escândalo anterior.

O golpe das ambulâncias, seja como for, merece dose bem maior de indignação cívica, por exemplo, do que a entrevista-bomba de Silvio Pereira.

Pelo que se viu quarta-feira no depoimento à CPI dos Bingos (que não se sabe por que ainda não mudou de nome), o ex-secretário-geral do PT tem problemas sérios de administração da própria cabeça. Ou sabe fingir que tem, o que dá no mesmo.

Não sei se isso prova alguma coisa, mas é bom lembrar que Silvio ganhou fama por suas contribuições para o vernáculo — como "pegar o bode andando", "o diabo aquático" e "andando como batatas tontas".

Como batatas tontas andaremos todos, inclusive perdendo o bode da História, se deixarmos de manter no patamar correto, permanentemente, o Índice Nacional de Indignação Cívica.

 

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