"Os mensaleiros petistas podem voltar
a Brasília a bordo de mandatos renovados.
Mas o PT terá ficado no caminho, como
um cadáver pesado demais para
a tropa carregar"
Os dirigentes do PT em São Paulo resolveram consultar a militância sobre os nomes preferenciais para candidatos na próxima eleição. O resultado é um deboche. Em Osasco, mais de 900 petistas querem que o candidato seja João Paulo Cunha, que mandou a mulher pegar 50.000 reais no valerioduto. Outros 150 preferem José Genoíno, que avalizou os empréstimos fajutos no Banco Rural. Gente como Professor Luizinho e José Mentor aparecem muito bem cotados na preferência dos petistas. Em Ribeirão Preto, 300 querem que a vaga de candidato fique com Antonio Palocci, indiciado em oito crimes na violação da conta bancária do caseiro e nas trambicagens como prefeito. O presidente do PT na cidade, Jorge Parada, explicou que não há constrangimento em lançar um candidato indiciado em oito crimes. "A pessoa só fica constrangida quando é condenada."
Por trás desse deboche, está claro que os vinte petistas envolvidos em escândalos diversos, do mensalão à quebra do sigilo bancário do caseiro, criaram um código: ignorar tudo e lutar pelo poder, sempre. O que talvez não percebam é que esse comportamento está completando a falência do PT – o que pode até ser bom para tucanos e outros adversários políticos, mas não chega a ser bom para o Brasil. Era melhor que houvesse um partido tentando ficar de pé, lutando para reunir seus cacos, empenhado em recuperar alguma dignidade. Mas não. O PT dá sinais de que está confortável no convívio com o crime. Nessa destruição ética, repete o processo acrítico, e devastador, que conduziu à sua destruição ideológica.
Sob o comando de José Dirceu, a quem os estudantes mineiros saúdam agora como "ladrão, ladrão, ladrão", o PT renunciou à sua história política para chegar ao poder e, nesse processo, não se preocupou em fazer autocrítica, não analisou erros e acertos do passado e, portanto, não deu sentido político real à sua mudança – deu apenas sentido eleitoral. Na época, desidratado de seu conteúdo político e transformado numa convencional máquina de caçar votos, o PT só não ficou igualzinho à maioria dos demais partidos porque resolveu erguer a bandeira da ética. Virou um silêncio ideológico. Mas tinha "ética".
O drama, agora, não está apenas no fato de que essa "ética" ruiu dentro do partido, mas sobretudo na recusa petista em purgar seus erros, expiar seus pecados, proceder enfim a uma autocrítica. Em vez disso, como demonstram as sondagens feitas em São Paulo, o grosso dos petistas prefere ignorar o que aconteceu, esconder os erros clamorosos e, no pináculo da farsa, premiar os mensaleiros.
Assim como renunciar à ideologia deu certo para chegar ao poder, talvez a renúncia à recuperação ética também dê certo – e os mensaleiros acabem de volta a Brasília a bordo de mandatos renovados. Pode ser, mas o PT terá ficado pelo caminho, como um cadáver pesado demais para a tropa carregar. E não lhes restará nem o consolo de dizer que ficaram apenas parecidos com os outros, parecidos com as sanguessugas. Espelhar-se nos outros dá uma imagem que Narciso não gosta de ver.