Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 10, 2005

Villas Boas:Desatinos do governo gorado

JB

 

Todas as reações na variada gama dos temperamentos e das inclinações humanas são compreensíveis diante do último capítulo do seriado das decepções, fracassos e paralisia do governo petista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Menos uma: a da surpresa. Pois se há uma crise anunciada praticamente desde a posse do eleito na maré de esperança de 53 milhões de votos é a que agora pipoca, como ovo choco em ninho de galinha desastrada, que pisa nos pintos e esparrama cisco para todos os lados.

Nada surpreendeu nos dois anos e seis meses do mandato do líder sindical que espalhou promessas, acendeu ilusões e jamais justificou a ascensão inédita na virada histórica que trocou os donos do poder: o governo estreou no desfile de equívocos antes da posse, ao desperdiçar o instante mágico da popularidade na lua, do entusiasmo da população para montar as propostas para o cumprimento das promessas de quatro campanhas.

Poderia iniciar por qualquer uma, talvez, entre as mais urgentes, a da reforma política. Mas, a incompatibilidade presidencial com o texto teimou em insistir no estilo oral do sindicalismo, em que as decisões são tomadas no clima passional das assembléias que juntam milhares sensíveis à eloqüência do improviso.

Lula tomou posse sem um único projeto para encaminhar ao Congresso e deflagrar as reformas na cadência das pressões da opinião pública. Raspa pelo ridículo a sua recente descoberta da urgência e importância da reforma política e a promessa de apresentar ao distinto público a proposta encomendada à comissão presidida pelo ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, com prazo de 45 dias para rascunhar meia dúzia de obviedades. Entra pelos olhos a inviabilidade de sua aprovação pelo Congresso em polvorosa com a desmoralização das denúncias das mesadas petistas aos parlamentares cooptados para votar matérias do interesse do Planalto.

Na sarabanda enlouquecida da crise que espalha lama para todos os lados, governo e Legislativo saltitam no despistamento as declarações enfáticas que nada acrescentam no esbanjamento da antinotícia. Só as almas cândidas, com vaga cativa no paraíso, deixam-se impressionar com as longas, gaguejadas juras de inocência do impávido tesoureiro do PT, Delúbio Soares, em entrevista regida pela batuta do presidente do partido, José Genoino. Dedos em cruz, Delúbio negou tudo e ganhou manchete na mídia. Ora, a bomba que justificaria a laúza seria a confissão da parceria petista na distribuição de propinas aos aliados de duvidosa confiabilidade.

No governo malogrado pelas contradições de nascença, nada mais espanta a crescente e generalizada frustração. A reforma política é um engodo que se compara à promessa da reforma ministerial, com o troca-troca de alguns ministros com a cota de fracasso esgotada. Não vai dar em nada: o defeito de raiz do Ministério é a sua obesidade doentia, com 35 ministros e secretários para abrigar a cupinchada de goela escancarada.

Não dá mais para continuar brincando de enganar a população. Os escândalos empilham-se à porta do Planalto, invadem o Congresso. E com a CPI dos Correios e no Instituto de Resseguros do Brasil - com ou sem a CPI exclusiva para a lavagem da imundície das propinas do Delúbio aos parlamentares - a pedra rola de morro abaixo, ganhou velocidade que nada pode conter. Bobagem querer restringir a investigação ao que o governo engoliu: o esquema de roubalheira nos Correios comandado pelo PTB.

As gangues operam com o mesmo material e é inevitável que o esguicho das mesadas petistas inunde a Comissão Parlamentar de Inquérito dos Correios, transbordando para os debates nas tribunas da Câmara e do Senado.

Afinal, a hipocrisia passou da conta. Senadores, deputados e jornalistas reconhecem que há meses recolhem murmúrios nos corredores sobre a prática rotineira do pagamento de propinas de R$ 30 mil mensais pelo tesoureiro do PT aos parlamentares vacilantes e exigentes no apoio e voto ao governo. E a torpeza só saiu dos cochichos com a denúncia do deputado Miro Teixeira em declarações ao Jornal do Brasil, na histórica edição de 24 de setembro.

Só agora, o governo e o Congresso coçam-se com as pulgas do mais escabroso escândalo da crônica da pobre redemocratização arrastada pelo lodo da sarjeta.

O riacho imundo vai engrossar com os afluentes do depoimento do deputado Roberto Jefferson, malogrado presidente renunciante do PTB, com o mandato por um fio.

Não é uma tramóia que se cubra com um arranjo por baixo da mesa e a prosápia presidencial de cortar na própria carne.

Se o Congresso não assumir a responsabilidade da devassa para valer, identificando e cassando os corruptos, a crise institucional poderá levar tudo de roldão na enxurrada da indignação nacional.

A paciência do povo está chegando aos limites suportáveis. O dique pode vazar a qualquer momento.

Lula que se cuide.

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