Dedicado ao presidente Lula, sem
ônus, e com carinho, para tirar bom
proveito da presente conjuntura
Texto que se oferece ao presidente da República, para ser dito perante o Congresso Nacional:
"Dois anos e seis meses de mandato bastaram para me ensinar que o maior antagonismo, neste país, não é entre direita e esquerda, elite e povo, governo e oposição. Estou convencido de que mais importante é o antagonismo entre os honestos e os desonestos, os homens de bem e os escroques. Confesso que errei. Levado por maus conselheiros, deixei-me jogar nos braços das más companhias. Teria muito a elaborar, a esse respeito, e, por que não dizer?, até culpas a confessar, mas não é esta a hora. O que quero é conclamar os queridos companheiros congressistas para uma reorganização de forças neste país. Nunca houve momento tão propício para isso. Ao mesmo tempo, quero apresentar, para aprovação em rito sumário, algumas poucas medidas cujo objetivo é tornar mais difícil a vida dos malfeitores neste país. Estou convencido de que, também para isso, nunca houve momento mais propício.
Um dia, quando ainda estava longe do posto que ocupo, eu disse que o Congresso Nacional tinha 300 picaretas. Talvez não sejam tantos. Suponhamos que sejam um pouco menos, só um pouquinho, digamos três a menos. Seriam 297 picaretas. Ora, Câmara e Senado, somados, têm 594 membros. Se 297 são picaretas, sobram 297 que não são – e essa é uma grande notícia! A esses 297, mais aos que, do outro lado, por vergonha ou conversão, venham a se juntar a eles, é que me dirijo. É a eles que peço que, sem prejuízo de nossas diferenças doutrinárias nem das disputas eleitorais futuras, me ajudem num extraordinário mutirão de limpeza do nosso ambiente. De minha parte, acabo de requisitar à Polícia Federal uma dupla de cães farejadores, para ficar à porta de meu gabinete. Eles se encarregarão de farejar políticos que se aproximam com o intuito de nomear apaniguados para diretor de compras dos Correios ou para a diretoria da Petrobras que fura poço. É fácil identificá-los, seguindo um cheiro que mistura dinheiro guardado em sacola, ante-sala de ministério e criado-mudo de bordel. Mais fácil ainda será escorraçá-los.
Em acréscimo a essa providência, aprontei um pacote de normas que reduzirá em 95% os cargos de livre provimento na administração. Essa é a primeira medida para a qual lhes peço a aprovação. Peço a boa vontade dos queridos congressistas também para a extinção, imediata e irrevogável, das chamadas emendas individuais ao Orçamento. O Orçamento tem de ser da nação, não deste ou daquele parlamentar. Se, com tal medida, o parlamentar perde o direito de atender à clientela de sua paróquia, eu também perco o poder de liberá-las só na hora do aperto, quando preciso que façam ou deixem de fazer certas coisas.
Anunciei outro dia que pretendia desatar a novela da reforma política e determinei ao ministro da Justiça que apresentasse em 45 dias um relatório a respeito. Foi um engano. Apresentar relatório em 45 dias, depois transformá-lo em projetos, depois levar à discussão – isso é tudo o que eles querem. É convite – por que não dizer? – para perpetuar a novela, não para desatá-la. O momento é este, a hora é já. O bom jogo se ganha nos primeiros quinze minutos. Foi como a Argentina ganhou de nós. Já tramitam no Congresso faz tempo projetos de fidelidade partidária e de financiamento público de campanha. Que sejam votados de imediato. Também apelo para que nos mantenhamos alertas contra as tentativas de derrubar a chamada cláusula de barreira, pela qual, a partir das próximas eleições, só terão direito a representação no Parlamento os partidos que obtiverem um mínimo de 5% dos votos nacionais, distribuídos num mínimo de um terço dos estados. Outras reformas políticas podem vir depois. Estas, que impedem o troca-troca partidário, atenuam a praga dos caixas de campanha e evitam a proliferação dos partidos, são para ontem.
O programa aqui anunciado é o pontapé inicial da virada com a qual os homens honrados reagirão, num jogo em que há tempos estão perdendo. Vamos para o ataque. Não tem sentido jogar na retranca contra adversário cujo time tem o ás da extorsão como zagueiro, o driblador da lei no meio-campo e o rompedor do Erário como centroavante. Estou convencido de que este é o momento em que poderemos dar início a uma das mais extraordinárias transformações de costumes políticos já vistas na face da Terra".
Aos assessores do presidente:
• Foram introduzidas palavras e expressões do gosto do presidente para maior autenticidade da peça. Exemplos: "estou convencido", "por que não dizer?", "extraordinário", "maior da face da Terra".
• Evitaram-se outras tantas expressões, apesar de igualmente do gosto do presidente, por desmoralizadas. Exemplo: "cortar na carne".
• O presente texto lhes é ofertado sem ônus. Não serão cobrados direitos autorais.
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