Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 11, 2005

O que Jefferson omitiu

Ao revelar o esquema do mensalão,o petebista deixou de fora uma explícitacena de corrupção. VEJA a descreve
AS SALAS DO PODER
As cenas dos Correios encontram paralelos nos relatos colhidos no Congresso sobre uma reunião que Jefferson ainda tem de esclarecer

A imagem do diretor dos Correios Maurício Marinho embolsando um bolo de dinheiro passado por um corruptor é graficamente a mais explícita já vista na rica história de corrupção da administração pública brasileira. Na semana passada, o repórter de VEJA Ronaldo França ouviu depoimentos de pessoas que tomaram conhecimento de cenas tão chocantes quanto aquela ocorrida nos porões da política em Brasília. Seu relato vem a seguir:

"O capítulo subseqüente à entrevista na qual o deputado Roberto Jefferson denunciou a existência de um esquema de mesadas a deputados da base aliada acrescentou uma dose de suspense à trama. O deputado Miro Teixeira confirmou que Jefferson lhe fizera o mesmo relato no ano passado, porém acrescido de fatos 'muito mais graves', que estariam sendo omitidos agora. Na conversa, ocorrida no gabinete de Miro, então ministro das Comunicações, Jefferson referiu-se a uma reunião realizada em 'ambiente ministerial' na qual teriam ocorrido cenas explícitas de corrupção. Uma reconstituição da reunião pode ser feita a partir de entrevistas com congressistas que ouviram, em diferentes momentos, depoimentos parciais dos fatos descritos pelo presidente do PTB. O encontro teria ocorrido no gabinete do então ministro dos Transportes, Anderson Adauto, no segundo semestre de 2003. Estiveram presentes, além de Jefferson e do ministro, o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e dois outros deputados, um representante do PL e outro do PP. Um sexto participante seria ligado ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT).

O que se passou ali, segundo os relatos ouvidos por VEJA, foi um descalabro, tanto por sua natureza quanto pelo local do encontro – o gabinete de um ministro da cota do PL, partido do vice-presidente da República. De uma mala levada por Delúbio ou pelo representante do DNIT (nesse ponto as versões são divergentes) saiu uma bolada de dinheiro que foi posta sobre a mesa em torno da qual a reunião se realizava. E começou a divisão. Ao chegar sua vez, Jefferson teria declinado. A partir daí a história é semelhante à contada na semana passada pelo próprio presidente do PTB ao jornal Folha de S.Paulo, ao qual afirmou ter recusado a oferta – o que é, aliás, uma hipótese plausível. Não porque Jefferson seja mais ou menos honesto do que a turma do mensalão, por exemplo. Mas talvez porque o presidente do PTB, após ocupar um naco da máquina governamental, passou a cobrar gordas contribuições de seus indicados – fato admitido por ele próprio em sua entrevista-bomba da semana passada. Ou seja, por essa hipótese Jefferson poderia dar-se ao luxo de recusar o mensalão oferecido por Delúbio, pois preferiria arranjar dinheiro por seus próprios meios.

O então ministro Anderson Adauto, atual prefeito da cidade de Uberaba, em Minas Gerais, negou na semana passada que tenha participado desse encontro. Também garantiu que nunca fez reunião alguma com Roberto Jefferson. O tesoureiro do PT, Delúbio Soares, na entrevista coletiva que concedeu, afirmou que as declarações de Jefferson não passam de chantagem (palavra que, segundo o Dicionário Aurélio, significa 'ato de extorquir dinheiro, favores ou vantagens a alguém sob ameaça de revelações escandalosas, ou secretas'). Procurado por VEJA, o deputado Miro Teixeira recusou-se a dar detalhes do que ouviu sobre a reunião. Evidentemente não se pode afirmar que a história da reunião seja integralmente verdadeira. Mas, no ambiente instalado na semana passada no país, tampouco se pode afirmar que seja integralmente mentirosa. Investigar cada detalhe do que está vindo a público neste momento é tarefa obrigatória para os deputados que compõem a CPI dos Correios, finalmente instalada na semana passada.

A divisão de cargos promovida pelo governo do PT, origem da crise de agora, gerou outras reuniões que merecem atenção. Especialmente a convocada pelo deputado Luiz Antonio de Medeiros, do PL, em 2003, que reuniu os companheiros de legenda para um depoimento intrigante, reproduzido a VEJA por um dos presentes à reunião. Medeiros relatou a seus pares uma conversa mantida entre ele e o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, na qual teria cobrado do ministro mais cargos no governo para seus indicados. Segundo esse relato, a resposta de José Dirceu foi enfática: 'Vocês já têm um dinheirão para gastar. Estão reclamando de quê?'. Referia-se ao Ministério dos Transportes, ocupado por Anderson Adauto."

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