o globo
PT e PSDB, de tantas características comuns, repartem nos últimos anos também a mesma acusação, a de serem "udenistas", o que no jargão político significa moralista, golpista. O PT, apelidado de "UDN de macacão" por Leonel Brizola, durante os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso viveu atrás de escândalos e até o impeachment do presidente pedia. Chegando ao governo, sofre com o próprio veneno e agora, diante da CPI dos Correios, acusa o PSDB de golpismo.
O Ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, foi o primeiro a fazer tal paralelo oficialmente, afirmando que os tucanos estavam querendo criar no país "um clima pré-54", referindo-se à crise política desencadeada pela tentativa de assassinato de Carlos Lacerda, um dos maiores líderes udenistas, que movia campanha incessante contra o presidente Getúlio Vargas, que acabou se suicidando.
A União Democrática Nacional (UDN), criada em 1945 para combater o Estado Novo e extinta 20 anos depois, era, segundo a cientista política Lucia Hippolito, "o partido das classes médias urbanas", que tinha como bandeira de luta a proteção à moral e aos bons costumes, a honestidade, a retidão, o trato do dinheiro público. "O Brizola, muito espertamente, identificou no PT, por ser também um partido urbano, das classes médias (intelectuais, professores), esse denuncismo udenista".
Pela mesma razão, o PSDB, "um partido urbano, de camadas médias da população, de intelectuais paulistas", estaria sendo identificado com o udenismo pelos petistas, que vêem na oposição com forte acento moralizador (ou moralista?) uma característica golpista.
Lucia Hippolito, para quem o PT tem muito mais a ver com esse rótulo do que o PSDB, diz que a UDN "descambou para o moralismo no segundo governo Vargas", sintomaticamente com uma CPI, a do jornal Última Hora, criado a partir de empréstimos generosos do Banco do Brasil para defender o governo.
Com a CPI da Última Hora criou-se o "mar de lama", e Lucia Hippolito lembra que Jânio Quadros, na campanha presidencial de 1961, "transformou em uma coisa popular o que a UDN queria dizer, com a vassoura para varrer a ladroagem".
Cientista político e sociólogo do CPDOC da FGV e professor da PUC do Rio, Fernando Lattman-Weltman é autor do livro recém lançado "A Política domesticada", sobre Afonso Arinos, um dos mais importantes líderes udenistas. Ele crê que os paralelos principais entre aquela época e a atual seriam: a permanência da corrupção como questão relevante da agenda pública e da imaginação política nacional; a permanência da aspiração republicana com relação ao comportamento "virtuoso" que se espera de nossos líderes e representantes; a permanência do moralismo (do tipo udenista) e da hipocrisia nacionais.
Weltman ressalta: "Os políticos continuam sendo as ovelhas negras de uma sociedade que segue tão ou mais mafiosa e inescrupulosa do que sua classe política: afinal, quem elege os Severinos e os Jeffersons? Quem financia suas campanhas? Quem conta com eles para alavancar seus interesses particulares às custas do erário e do interesse públicos? De onde eles vieram? Da lua?".
Para ele, o que mudou "é que o golpismo hoje não parece mais partir (como naquela época) do próprio centro do sistema político, mas sim de suas margens; não há mais Guerra Fria, nem parece haver mais 'vivandeiras' ou grandes polarizações ideológicas junto às Forças Armadas; nem parece haver mais espaço ou legitimidade, junto às elites, para golpismos declarados — como o que, por exemplo, Lacerda e certos setores udenistas praticavam tão bem, e de modo tão desembaraçado".
Apesar de os tempos serem de Severinos e Jeffersons, Fernando Lattman-Weltman acha que políticos como Afonso Arinos sempre têm lugar na democracia, "ao lado dos demagogos, dos fisiológicos, dos românticos, dos aventureiros, dos irresponsáveis". Ele diz que "Arinos era competente, sério e muito bem preparado para o exercício das responsabilidades políticas. O difícil, hoje, seria ter tanto sucesso e prestígio pessoal, como ele teve, usando a tribuna do Congresso; a tradição de oratória na qual ele se formou e se destacou não existe mais".
Weltman diz que o Brasil de hoje, "embora muito mais democrático e pluralista, é também muito mais complexo, institucionalizado e compartimentalizado do que o de Arinos, mas continua aberto a vocações como a dele". Ele acha que a UDN era moralista e moralizadora ao mesmo tempo, "assim como, hoje, o PT e o PSDB também o são".
Era moralista porque "queria equacionar os problemas nacionais com base num suposto monopólio (elitista e presunçoso) da decência e do espírito público; como se bastasse colocar no poder os homens bons, justos e competentes, e tudo se resolveria por si só; hoje, PT e PSDB lutam por deter tal monopólio da superioridade moral ou tecnocrática".
Mas ele destaca que a UDN também moralizava, de fato, porque "mesmo fora do poder, a maior parte de sua história — ou por isso mesmo — ficava livre para defender parâmetros de melhoria da qualidade das artes política e administrativa que, mesmo irreais (ou hipócritas), ampliavam as perspectivas gerais de crítica ao poder e seu exercício no país".
Fernando Lattman-Weltman acha que PT e PSDB e outras siglas menores "prestam hoje o mesmo serviço à democracia brasileira, e é justamente o caráter crítico e competitivo dos dois grandes partidos que faz deles as bolas da vez na nossa política, há mais de uma década".
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