FOLHA DE S PAULO
Sem emitir ainda uma só palavra, um personagem está posto, pelo medo que impõe, no centro da crise: o gravador clandestino. A expectativa de sua entrada ativa na cena é que está determinando as condutas dos já citados e dos passíveis de inclusão em revelações de improbidade e de suborno.
Quando um governo, diante de situação problemática, precisa de longas reuniões para discutir e planejar sua resposta, não há dúvida: foi atingido em ponto de defesa difícil ou impossível. As várias e demoradas reuniões na Presidência da República demonstraram, antes mesmo de enfim sair uma palavra oficial, que não poderiam ser simplesmente negadas as afirmações do deputado Roberto Jefferson, apesar de não conterem nem sequer indício de comprovação.
A probabilidade de gravações, que depressa inundou as especulações políticas, condicionou o sentido e a tibieza do pronunciamento emitido pela Presidência: a admissão sussurrante de que Roberto Jefferson "comentou" com Lula os pagamentos ilegais a parlamentares. Ainda que a contragosto, contrariamente à espontaneidade dos primeiros, Lula deu o seu terceiro atestado de idoneidade ao "parceiro" Roberto Jefferson.
Assim como não o livrou das afirmações comprometedoras feitas por Jefferson, a resposta palaciana criou para Lula um desdobramento ameaçador. Prestou melhor serviço ao ministro Aldo Rebelo, que, há meses com a adaga petista voltada para seu pescoço, falou pela Presidência para vingar-se: "O problema não é com o governo, é com o PT".
Quanto a Lula e ao governo, a palavra da própria Presidência propôs nova questão: o que deve fazer um presidente da República ao lhe ser "comentada" a ocorrência de pagamentos ilegais a parlamentares para apoiarem o governo? Entre as possíveis atitudes cabe a omissão indiferente, ou aí se encontram a improbidade e o possível crime de responsabilidade?
A questão suscitada pela Presidência ganha mais dimensões quando relacionada à prática, propriamente, do tal "mensalão" para deputados aderentes ao governo. A admitir, como quer a pretensa defesa do governo, que a responsabilidade pelo "mensalão" subornador é do PT, torna-se necessário explicar que motivo levaria o partido a doar dinheiro seu a deputados de outros partidos.
A explicação não foi dada pelos utilizadores do argumento. Mas não é misteriosa nem é difícil perceber por que não acompanha o argumento: a finalidade dos pagamentos foi (ou é) obter votos, não para o PT, mas para o governo.
Nada muda se o portador do dinheiro é um "companheiro" ou um dos "parceiros" íntimos da fauna do pântano; se habita o Planalto ou o Congresso. Com qualquer portador, trata-se de um serviço prestado à Presidência da República para as aprovações e rejeições que lhe interessem.
Diz a velha regra dos crimes de teor político: o mais importante é identificar o que ou quem é o beneficiário. A resposta, no caso, é conhecida.
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, junho 08, 2005
JANIO DE FREITAS:A causa do medo
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