Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 12, 2005

CLÓVIS ROSSI:Socorro, Gabo, socorro

 folha de s paulo
SÃO PAULO
- À primeira vista, o "mensalão" é inverossímil. Se real, significaria que um partido supostamente de esquerda comprou deputados da direita para aprovarem projetos que a direita teria orgulho de aprovar e até de apresentar.
Um olhar mais atento, no entanto, demonstra que, por incrível que pareça, o esquema é, sim, perfeitamente possível, quase natural. Afinal, o partido supostamente de esquerda deixou de lado todas as propostas de esquerda para adotar um único projeto: ocupar o poder e nele permanecer, custe o que custar.
E os partidos de direita não são realmente de direita (ou de esquerda ou de centro). São ou balcões de negócios ou, na hipótese mais benigna, são apenas os únicos instrumentos legais disponíveis para obter um mandato e renová-lo tantas vezes quanto possível, custe o que custar.
Simplificando: se verdadeiro, o "mensalão" representa o encontro no Congresso Nacional da fome com a vontade de comer. Ambas, aliás, de dimensões pantagruélicas.
Fecha o círculo a bovina mansidão da sociedade brasileira, de que dá testemunho o próprio pivô do escândalo, o deputado Roberto Jefferson. Foi, como todo mundo sabe, um dos mais salientes líderes da tropa de choque de um presidente, Fernando Collor de Mello, condenado por falta de decoro.
Em qualquer país minimamente sério, um deputado com esse histórico cairia no ostracismo talvez para todo o sempre, mas, pelo menos, por um bom período. No Brasil, não. Jefferson jamais deixou de obter a sua vaguinha nas três eleições realizadas desde o profilático impeachment de Collor. E ainda acabou presidente de um partido, capaz da proeza de ser aliado de Collor, que era atacado pelo PSDB e pelo PT, partidos que, não obstante, o entronizaram como seus próprios aliados, apesar de serem inimigos um do outro.
Nem Gabriel García Márquez conseguiria desenhar, na ficção, o horror que é a realidade brasileira.

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