O Globo |
13/6/2008 |
Tudo indica que não vai dar em nada a denúncia da ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) de que o governo, através da ação direta da chefe do Gabinete Civil, Dilma Rousseff, exerceu pressão para viabilizar a venda da Varig para o fundo "abutre" de investimentos Matlin Patterson, que depois a revendeu para a Gol e, sabe-se agora, era ilegalmente dono integral da VarigLog, com contrato de gaveta com sócios brasileiros de figuração. A denunciante Denise Abreu votou duas vezes a favor da venda, e não há registro oficial de protesto seu sobre a condução da questão pelo Gabinete Civil da Presidência. Os companheiros de diretoria da Anac na ocasião são unânimes em desmentir as pressões. A TAM, embora confirme a existência do documento em que demonstra interesse pelo negócio, nega que tenha feito uma oferta. E o juiz Luiz Roberto Ayoub respalda toda a operação, embora sua interpretação do artigo 6 da Lei de Recuperação Judicial, que livrou a "nova Varig" de sucessão fiscal e trabalhista e viabilizou a venda, ainda esteja em discussão. Apesar de tudo, o relato de Denise Abreu na Comissão de Infra-Estrutura do Senado sobre o processo de negociação não deixa dúvida de que houve muita pressão do governo para que o negócio fosse feito com rapidez, e da maneira como interessava aos clientes do advogado Roberto Teixeira, compadre do presidente Lula, em cuja casa a família Da Silva morou durante muitos anos. Basta lembrar que, no célebre debate da eleição de 1989, o então candidato Fernando Collor chamou a atenção para um aparelho de som que Lula teria em sua casa, um "dois em um" que naquele tempo era o máximo da sofisticação, sugerindo que seria impossível um líder operário possuir tal aparelho. Lula embaralhou-se com essa e outras insinuações de Collor, simplesmente porque o tal aparelho pertencia à casa que ele habitava, mas não era dele, era de seu compadre rico. A ministra Dilma Rousseff claramente conversava com Roberto Teixeira sobre a negociação, a ponto de ter anunciado para Denise Abreu uma representação judicial contra ela que só seria materializada dias depois por Teixeira. E o advogado teve ocasião de mostrar seu acesso ao gabinete presidencial diversas vezes, fazendo o presidente posar em fotos com os compradores do fundo de investimentos americano e, depois, na revenda, recebendo os donos da Gol levados por Teixeira. Teixeira pode não ter feito nada de ilegal, embora restem dúvidas sobre alguns pontos, mas sua atuação, digamos, desassombrada permite a classificação de "imoral" dada por Denise Abreu no depoimento no Senado. E também sua filha Waleska Teixeira, que teve a petulância de se apresentar à diretora da Anac como "afilhada" do presidente. Há, além do mais, relatos que revelam que Teixeira tinha um codinome íntimo nos círculos de poder. Era "o papai". No tempo em que os bichos falavam, e as questões morais eram levadas em conta na vida pública, um advogado como Roberto Teixeira, o compadre do presidente Lula, não poderia atuar em questões que envolvessem decisões do governo. No mínimo para não permitir frases como as do presidente do PPS, Roberto Freire, segundo quem Teixeira não abre as portas do gabinete de Dilma, mas as do presidente Lula. Os interesses de Roberto Teixeira e os do PT de Lula já se cruzaram diversas vezes, e a primeira em que ele foi denunciado como intermediário de ações ilegais foi por Paulo de Tarso Venceslau, um dos fundadores do PT e companheiro de exílio do ex-ministro José Dirceu. Venceslau denunciou diretamente a Lula que Teixeira estava arrecadando dinheiro junto a prefeituras petistas, e acabou expulso do partido no começo de 1998. Evitar que a "liturgia do cargo" de presidente da República seja afetada por atividades de amigos e parentes deveria ser prioridade do homem público, mas Lula considera-se acima do bem e do mal, e em condições da fazer tudo aquilo que criticava em seus antecessores. Não acho nada de mais, por exemplo, que Fábio Luiz, o filho biólogo de Lula, tenha ido à Antártica na comitiva oficial. Mesmo que não fosse biólogo. Mas a faceta empresarial do mesmo Lulinha tinha que ter sido freada, para evitar constrangimentos ao presidente. O investimento de R$5 milhões em 2006 que a Telemar injetou na Gamecorp, empresa que tem Lulinha entre seus sócios, não apenas causou espécie na ocasião pela singularidade do negócio, como inevitavelmente torna vulnerável a decisão do governo de permitir a união entre a Oi/Telemar e a Brasil Telecom para a criação de uma supertele nacional, com financiamento do BNDES. Mesmo que fosse indiscutível a necessidade de o governo estimular uma empresa nacional para disputar o mercado com as gigantes do setor - o que não é consenso -, é preciso alterar a legislação para permitir a fusão, coisa que o governo está providenciando. O mesmo PT que caiu de pau no governo de Fernando Henrique Cardoso quando o BNDES ajudou na formação de grupos para disputar a privatização das telefônicas, e viu irregularidades e interesses escusos em todos os estímulos dados pelo governo, agora no governo atua diretamente para viabilizar esse supernegócio, e atuou na venda da Varig, acrescentando o toque familiar às inevitáveis acusações de favorecimento. Como disse o presidente Lula, o depoimento de Denise Abreu não deu muito caldo, isto é, não produziu provas concretas que colocassem o governo em maus lençóis. O presidente está tão imunizado contra as denúncias que já se diz em Brasília que, mesmo que houvesse um filme mostrando Lula com a mão num cofre tirando dinheiro, o povo se convenceria facilmente de que ele estava era devolvendo o dinheiro. E o nosso problema é exatamente este: se nem mesmo com provas concretas, como no caso do mensalão, o governo e seus aliados ficam constrangidos, o que dizer de simples indícios? E-mail para esta coluna: merval@oglobo.com.br |
Entrevista:O Estado inteligente
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