Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 14, 2008

Instrumentos econômicos para a Amazônia


Paulo R. Haddad*


Os ambientalistas têm considerado, corretamente, que grande parte dos danos aos ecossistemas da Amazônia é decorrente das ações de interesses econômicos, na busca do valor de uso e do valor de troca dos recursos naturais regionais. Identificam formas e situações nas quais os mercados deixam de considerar, em suas funções alocativas e distributivas, o amplo conjunto de custos e benefícios ambientais para as atuais e futuras gerações das atividades econômicas na Amazônia.

Entretanto, na última década, grupos de líderes de movimentos ambientalistas e alguns próprios reguladores nas burocracias públicas, diante do persistente fracasso dos mecanismos de comando e controle do uso predatório dos recursos ambientais da Amazônia, têm reconhecido que o poder do mercado pode ser canalizado para que os objetivos de desenvolvimento ambiental sejam atingidos na região, por meio de uma abordagem de incentivos econômicos nos processos regulatórios. A expectativa é a de que, ao se modificarem os incentivos e estímulos que os agentes econômicos dispõem num determinado contexto histórico, possa haver uma coincidência entre a melhor escolha privada com a melhor escolha social para o desenvolvimento sustentável da região. Por exemplo: um conjunto adequado de incentivos econômicos e financeiros, concebidos e implementados para a Amazônia, poderá levar os atores regionais a adotar, de forma descentralizada, práticas produtivas e de consumo ecologicamente corretas, em termos de sustentabilidade ambiental, e implementadas com baixos custos administrativos e de transação.

O sistema de preços é considerado um mecanismo tão eficiente, democrático e econômico de resolver os problemas econômicos fundamentais de uma sociedade que acaba por estimular um esforço intelectual muito expressivo para preservar o uso desse sistema nas políticas do meio ambiente, até mesmo por meio de adaptações em sua lógica interna nos contextos de "falhas de mercado". É o caso, por exemplo, de situações em que ocorrem externalidades ambientais (desmatamento, poluição hídrica, etc.) quando se procura definir apropriadamente um valor econômico para os recursos ambientais, simulando condições de mercado para a sua disponibilidade e a sua utilização.

Os instrumentos econômicos mais relevantes para a formulação e a execução das políticas de desenvolvimento sustentável, que nos países da OCDE somam mais de uma centena, podem ser definidos e classificados de diferentes formas. Esses instrumentos pretendem estimular comportamentos de produção, de consumo e de investimento, no sentido da sustentabilidade ambiental, pela alteração direta dos níveis de preços e de custos (impostos, taxas, subsídios, etc.), pela alteração indireta de preços e custos por meio de medidas fiscais ou financeiras (financiamentos facilitados, incentivos fiscais, etc.) ou pela criação de mercados ou apoio a mercados (de títulos negociáveis, de seguro ambiental, de materiais recicláveis, etc.).

No Brasil, há alguns desses instrumentos sendo implementados com elevados benefícios líquidos para as atuais e futuras gerações, embora de escopo e intensidade muito limitados. Mencionam-se o ICMS Ecológico, o Ecocrédito Municipal, mecanismos financeiros de compensação ambiental, taxas de usuários de recursos hídricos, multas para poluidores contumazes, etc. Freqüentemente, esses instrumentos são utilizados mais com o objetivo de arrecadação fiscal do que propriamente para atingir objetivos de sustentabilidade ambiental.

Não há uma regra simples que permita decidir, em situações específicas de intervenção governamental, entre o uso de instrumentos e mecanismos de mercado e o uso de regulamentações. Há vantagens e desvantagens em cada instrumento ou mecanismo de intervenção, em termos de eficiência, de eficácia, de eqüidade e do grau de flexibilidade que dão aos agentes poluidores/consumidores de recursos naturais. Sempre que possível, a melhor alternativa será alguma solução de compromisso que busque a sinergia entre as vantagens cumulativas dos dois tipos de instrumentos. A experiência na condução das políticas ambientais, em diversos países e regiões, mostra que, em quase todas as situações, é possível encontrar um mix que balanceie, de forma mais eficiente, mais eficaz e mais equânime os dois instrumentos, dando-lhes um caráter de complementaridade e não de exclusão operacional.

*Paulo R. Haddad, professor do IBMEC/MG, foi ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco

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