João Camilo Penna e Carlos Roberto Silvestrin*
O Ministério de Minas e Energia (MME) realizará, no próximo dia 30 de julho, leilão para compra de energia de reserva, a partir da biomassa da cana-de-açúcar. É importante destacar que a cana produz 1/3 de caldo (açúcar/etanol), 1/3 de bagaço (bioeletricidade) e 1/3 de palha (bioeletricidade e adubo). A cana é uma riqueza brasileira. Nossa produção atinge 500 milhões de toneladas ao ano - 1/3 da mundial. A energia vinda da cana já supera a energia hidrelétrica no País.A energia elétrica no Brasil tem base hídrica (85%), conjugada com térmicas (15%). A vazão dos rios entre os períodos de seca e chuva varia de 1 para 2 no Sudeste, de 1 para 3 no Sul e de 1 para 5 no Nordeste. Portanto, temos necessidade de reservatórios reguladores, hoje quase impossíveis, e de térmicas na seca para ampliar a oferta hídrica na chuva. Para novas hidrelétricas há complexidades a serem superadas que dilatam os cronogramas. Para térmicas temos opções no gás natural, que é escasso e tem preços altos e voláteis, e no óleo, que é poluente e vem do petróleo em escalada de preços. Para bioeletricidade da cana temos biomassa disponível para ofertar 3 mil MW firmes ao ano, com a produção subindo de 500 milhões de toneladas para 1 bilhão de toneladas por safra, em 2020.
O mercado fará crescer o uso da bioeletricidade da cana, ideal para complementar e trazer segurança ao sistema elétrico. Produzida na seca, ela é competitiva, renovável, limpa e com ótimo balanço ambiental. As usinas são distribuídas, têm rápida implantação, são pouco vulneráveis a crises e geram créditos de carbono. O MME e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) examinam alternativas de conexão das usinas. Os produtores aguardam que as diretrizes considerem os atributos da biomassa da cana.
Há anos é pesquisada a produção competitiva do etanol celulósico da cana. A longa procura significa dificuldades, porém, encontrada a solução, teremos uma revolução energética. Enquanto isso, e depois disso, a biomassa da cana continuará sendo queimada para produzir bioeletricidade, que complementa o Proálcool. Com a vitalidade da livre iniciativa, os produtores, apoiados pelo governo, tornaram o etanol da cana um sucesso brasileiro.
O etanol compete com a gasolina, com o petróleo acima de US$ 40 o barril, gera divisas, empregos e melhores condições sociais, reduz em até 90% as emissões que viriam da gasolina e busca novos mercados. Além do uso nos carros flex, pode ser utilizado nos aviões da Embraer e na alcoolquímica. Atrelar a bioeletricidade ao etanol é opção empresarial segura e política de sustentabilidade estratégica para o Brasil.
Agora surge campanha acusando o etanol de contribuir para o aumento do preço e para a escassez de alimentos. Isso não ocorre no Brasil, que tem moderna e avançada agricultura. A cana ocupa hoje 8 milhões de hectares, de um total de 400 milhões de hectares agricultáveis existentes. A expansão da cana substitui pastagens de baixa produtividade. É falácia afirmar que a cana vai invadir a Amazônia. O etanol é produzido em apenas 1% da área agricultável, abastece os veículos flex misturado na gasolina na proporção de 20% a 25%.
O conflito ocorre com o etanol do milho. Hoje nos EUA 25% do milho é destinado para o etanol, com meta para substituir 20% da gasolina até 2017. O etanol de milho tem saldo energético baixo. Há estudos indicando 1.5 de energia produzida para 1.0 de energia gasta, e para outros o saldo é negativo. No etanol da cana a relação é de 8.3, podendo crescer com novas tecnologias. O custo do etanol de milho é 25% superior ao da cana, por paridade de compra, e sua produtividade (3.600 litros por hectare) é metade da do etanol da cana.
A conjugação de esforços empresariais, com apoio do governo, da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) e dos centros de pesquisas, continuará aumentando a produção e a produtividade da cana para destilarias, veículos flex e co-geração de energia. O fomento da produção de etanol aumenta a produção da bioeletricidade da cana, que poderá superar em até 15% de toda a energia elétrica utilizada no País, com a expansão da bioeletricidade a partir da disponível biomassa da cana, uma riqueza brasileira.
*João Camilo Penna foi ministro da Indústria e Comércio no governo João Figueiredo e presidente da Cemig, de Furnas e do Conselho de Administração de Itaipu no governo José Sarney; e Carlos Roberto Silvestrin é vice-presidente-executivo da Associação Paulista de Cogeração de Energia (Cogen-SP)