19.10, 11h20 |
Meu texto sobre o filme "Tropa de Elite" causou tremores frios em muita gente. Entendo. O cinema brasileiro da chamada "retomada" é muito ruim. Até a pornochanchada era melhor. Tinha mais ritmo. Há uma tradição brasileira de idealização de bandidos, de cangaceiros a traficantes. O mal é sempre a ordem, o poder, a polícia. Faz sentido. Afinal, neste país, a lei é uma fachada para a sacanagem dos mais ricos. Mas esse esquema simplifica. Os últimos filmes, de gente como Jorge Furtado e Guel Arraes, são totalmente vazios e não conseguem situar esse paradoxo da cultura nacional. José Padilha, com "Tropa de Elite", conseguiu trazer finalmente a realidade brasileira para a tela. Sem afetações nem conversa fiada. É pau puro mesmo. Todo problema do consumo de drogas pela burguesia da Zona Sul do Rio de Janeiro está baseado no seguinte princípio: a polícia não deveria reprimir. Afinal, por que não se poderia consumir drogas tranqüilamente? Porque o tráfico é ilegal. O pessoal quer consumir sem ser incomodado por não concordar com essa ilegalidade. Como a sociedade, através dos seus representantes, não muda a lei, a galera espera que a polícia seja complacente, tolerante e conivente, nem que seja corrompendo-se. É o que mais acontece quando um filhinho da burguesia cai na rede policial e precisa ser liberado. Que deve fazer a polícia? Tentar cumprir a lei ou praticar desobediência civil (ou militar?) para estar de acordo com os leitores de Foucault (o teórico francês que mais denunciou os mecanismos do poder capilarizado) em universidades cariocas? "Tropa de Elite" espanta por ser o ponto de vista do policial. Nesse sentido, coloca-se do lado da lei e do poder. Num país em que a sociedade vê o Estado como seu inimigo, a lei e a ordem são sempre ilegítimos. Todo filme não reacionário deve, portanto, denunciar a ordem. Descobre-se que os nossos cineastas gostam de mensagens e de certo maniqueísmo. Cada filme precisa ter o personagem bom, ainda que algumas hesitações, podendo até ser o bandido, vítima da sua condição social, e o mau (o policial, a ordem, o poder) bem claros. O espectador é tido por meio bronco. Necessita de heróis e de perfis claros. A equação é simples: o jovem burguês comete uma ilegalidade, a polícia reprime. O jovem sente-se vítima do policial. O filme de Padilha tem razão: não há passeata por policial morto. Só por rico. Mas todos querem segurança. Eis o paradoxo: espera-se que a segurança seja garantida pelo inimigo, o policial. Depois, ele deve fechar os olhos. A burguesia brasileira não quer ser tolhida nas suas ações, mesmo quando ilegais. A ordem deve ser imposta aos pobres. No caso do uso de drogas, porém, os pobres são apenas os fornecedores dos ricos. A velha chantagem do intelectual de esquerda volta à cena: cumprir uma lei julgada conservadora é ilegítimo. A turma quer viver em paz na ilegalidade. Bastaria convencer pais e avôs, detentores do poder, a mudar a lei. É brega estar do lado da ordem. "Tropa de Elite", embora esteticamente fraco, é o mais realista dos filmes brasileiros das últimas décadas. O problema dos seus críticos é que eles se identificam com os jovens burgueses da Zona Sul do Rio de Janeiro. Querem dar um "tapinha" sem remorsos nem maiores responsabilidades. Por que não liberar geral? Muita gente perderia com isso. *publicado no Correio do Povo de 18.10.07 |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, outubro 19, 2007
ELITE SEM TROPA por Juremir Machado da Silva
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