Há várias indicações de que os problemas do senador Renan Calheiros não terminarão na próxima semana, mesmo ele sendo absolvido pelo plenário do Senado no voto secreto. Existem pelo menos mais dois outros processos já tramitando contra ele no Conselho de Ética, e outros mais surgirão. Calheiros está morto politicamente, e só sobreviverá, mesmo assim com auxílio de aparelhos, se o governo se empenhar para, com sua base aliada, inviabilizar todos os processos, numa atuação desgastante demais.
Por isso mesmo, pode estar havendo uma mudança de posição do Palácio do Planalto, interessado em encerrar essa crise o mais rapidamente possível, não para preservar a imagem do Senado, mas para conseguir aprovar a emenda constitucional da CPMF, o que será impossível no Senado se não houver um acordo com a oposição.
Se o governo jogar toda sua força política para absolver Calheiros nesse seu primeiro processo por quebra de decoro, terá pela frente, além da crítica da opinião pública, uma má vontade política da oposição, que já tem várias propostas para amenizar o peso da CPMF no bolso do contribuinte.
O governo terá, nesse caso, de arcar com dois desgastes simultâneos: o de livrar Renan da cassação, e aprovar mais um imposto.
Não se sabe ainda se a decisão de liberar os representantes petistas no Conselho de Ética para votarem “de acordo com suas consciências”, tomada na manhã de ontem, representa uma tendência política desfavorável a Calheiros, ou se somente é uma pequena esperteza do PT que, diante da derrota inquestionável de Calheiros na Comissão, permitiu que seus senadores, especialmente João Pedro, do Amazonas, que dera sinais de que poderia votar a favor de Calheiros no voto secreto, fizessem um bonito diante dos eleitores votando pela quebra do decoro.
O voto secreto, pelo qual tanto se empenharam na Comissão de Ética os defensores de Calheiros, já não parece mais uma arma tão poderosa para uma absolvição tranqüila.
Mudaram os ventos políticos depois da decisão do STF sobre o mensalão, e deixar impune o presidente do Senado pode trazer consequências nocivas para todo o Senado.
Embora a tendência seja a absolvição pelo voto secreto, há alguns senadores que, por terem uma relação pessoal com Calheiros, se sentiriam constrangidos a votar a favor dele se o voto fosse aberto, mas podem se sentir liberados pelo voto secreto. Por outro lado, a base aliada do governo, devido à pressão das ruas, deve também estar procurando uma orientação formal do Palácio do Planalto, diante da liberação do voto dos petistas.
O que se viu ontem no Conselho foi o PMDB ficar sozinho sustentando a defesa de Renan, contra a posição unânime dos representantes da base aliada, a começar pelo senador Renato Casagrande, do PSB, co-autor do relatório pela cassação do mandato.
É claro que o PMDB, ou a parte do partido que apóia Renan, tem suas maneiras de pressionar o governo até a próxima semana em busca de uma unidade a seu favor. E o próprio presidente do Senado, embora a cada dia mais fragilizado, tem seus trunfos na manga para pressionar seus pares e o próprio Planalto.
A questão agora é de custo/ benefício, de avaliar os riscos de abandonar um aliado que já foi tão importante e que já participou de tantos acordos políticos delicados, potencialmente detentor de vários segredos. Mas o governo também tinha maioria na Câmara, e com maior folga, para evitar a cassação do ex-ministro José Dirceu, e ele foi cassado.
Tanto porque interessava a Lula enfraquecê-lo politicamente, quanto porque ele fez muitos inimigos quando era o ministro todo-poderoso, e nem sempre dispensou um tratamento simpático a deputados, sendo considerado arrogante por muitos. E também, como agora no caso de Renan, porque a opinião pública exigia sua cassação.
Renan, que tinha uma relação cordial com todos os seus pares, inclusive da oposição, ao se defender, foi deixando aflorar a arrogância e a agressividade do coronelismo autoritário que exercia nas Alagoas.
Depois de, nos primeiros momentos, ter feito os senadores se sujeitarem a uma fila de beija-mão vexatória, com a qual pretendia encerrar o assunto, foi num ritmo crescente das insinuações, ameaças veladas a até, nos últimos dias, haver informações de que forçou um pouco mais a mão em algumas conversas, especialmente com enviados do Palácio do Planalto.
Existe também a possibilidade de que venha a aceitar uma proposta que lhe foi apresentada já há algum tempo por seu correligionário e sócio de poder político José Sarney. Político realista e conhecedor profundo dos bastidores, Sarney propôs que REnan aceitasse a renúncia à presidência do Senado como contrapartida à sua absolvição pelo plenário. O que daria também ao Palácio do Planalto a certeza de que a substituição seria feita sob o controle da base aliada.
Se dirigindo ao Senado de carro, o senador Cristovam Buarque viu desfilarem à sua frente, na Esplanada dos Ministérios, vários cartazes gigantescos pendurados em todos os prédios, anunciando o mote de sua campanha eleitoral “de uma nota só”: “A educação é o caminho”, berravam as empenas em homenagem à Semana da Pátria.
Cada ministério escolheu um tema: “"Ciência de vanguarda”; “Igualdade e Inclusão”; “Alimentação é o começo”; “Conservação da biodiversidade”. E todas as frases temáticas eram complementadas com a frase “Educação é o caminho”.
Cristovam sentiu-se vitorioso.
Foi como se estivesse sonhando que fora eleito presidente da República.
Entrevista:O Estado inteligente
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