Primeiro, o presidente Luiz Inácio da Silva abriu o debate em entrevista ao Estado no último dia 26; depois, o PT aprovou em congresso a candidatura própria, mitigada para não assustar os aliados; em seguida, PSB, PC do B e PDT tomaram posição na cabeceira da pista com Ciro Gomes e a, partir disso, foi dada a largada para uma discussão que permeará todo o segundo mandato de Lula.
O antenadíssimo leitor perguntará: e qual a vantagem de pôr o tema na mesa com essa antecedência toda, correndo o risco de abrir também uma briga interna na coalizão governista quando há ainda três anos de mandato a cumprir?
Várias, sendo a principal sair na frente da oposição que, em tese, detém o favoritismo porque dispõe de dois candidatos quase explícitos: os governadores José Serra, de São Paulo, e Aécio Neves, de Minas Gerais, ambos presos aos compromissos de governo e, em princípio, restritos em seus movimentos.
A segunda, tirar partido da popularidade do presidente Lula, que não se sabe se estará em condições tão favoráveis à época habitual para o início do processo, vale dizer, depois das eleições municipais de 2008.
A terceira, construir desde já o ambiente eleitoral para o qual a seara governista não tem candidaturas fortes.
Ao contrário da oposição, que dormiu em 2006, e continua dormindo em berço esplêndido, esperando que a Presidência da República volte a lhe cair no colo por obra e graça da lei da gravidade, o campo Lulo-governista sabe que não pode brincar em serviço. Ou começa já os trabalhos com as armas disponíveis no momento, ou corre o risco de entregar o ouro ao adversário, deitando por terra o projeto de longevidade no poder.
Os tucanos, em 2002, acharam que não haveria nada demais num interregno petista, pois, depois do desastre que se avizinhava, voltariam sob clamor da população que, no imaginário do PSDB, estaria ansiosa pela retomada da eficiência e da fidalguia no comando da República.
Com esses burros na água, Luiz Inácio não pretende dar. E, por isso, não está minimamente disposto a facilitar a vida da oposição. Não sendo possível tentar um terceiro mandato subseqüente ao segundo - plano arquivado, jamais abandonado -, vai investir fortemente na eleição de um aliado para cumprir a tabela dos quatro anos de intervalo até a nova candidatura - aí dentro do marco legal - em 2014.
Contrariamente ao que poderia indicar uma primeira e apressada leitura, há intriga, mas não há briga séria no cenário de várias candidaturas governistas. O presidente já disse que dificilmente o PT deixará de ter candidato, bem como o PMDB e o chamado "bloquinho", formado pela junção de PSB, PDT e PC do B.
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, dia desses, José Dirceu, um prócer que, processado por corrupção ativa e formação de quadrilha, voltou a dar cartas políticas, de posse do salvo-conduto conferido por Lula no discurso do 3º Congresso, falou também na possibilidade das candidaturas do vice-presidente José Alencar e de Fernando Collor.
Quanto mais candidatos, para o governo, melhor. Aumenta a chance de haver segundo turno e, aí sim, juntam-se todos de novo sob o guarda-chuva de Lula a bordo da máquina federal devidamente aparelhada ao longo dos dois mandatos.
Se não for candidato, poderá manejá-la ainda mais livremente, dizendo que não tem interesse direto na eleição e invocando seu "direito" de, como disse na entrevista ao Estado, não ficar neutro e "subir no palanque".
Nem será necessário subir, pois do palanque o presidente nunca desceu. Já nos primeiros meses do primeiro mandato Lula tomou a iniciativa de "puxar" o assunto eleitoral, lançando a candidatura de Marta Suplicy à reeleição para a Prefeitura de São Paulo com mais de um ano de antecedência.
O movimento se repete agora com o nítido intuito de manter viva a chama da tensão eleitoral que, sob a ótica petista da disputa permanente, permite atribuir qualquer crítica a intenções eleitorais. Dos outros e, portanto, sempre perversas, contrárias aos "interesses do Brasil".
Ouvidor-geral
Soa mal o apelo do novo diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência, Paulo Lacerda, para que o Congresso autorize a Abin a fazer escutas telefônicas em caso de suspeita de terrorismo ou sabotagem.
A agência nunca funcionou direito, será reformulada e certamente há outras prioridades mais urgentes que uma presumida futura necessidade de o Brasil se precaver de ações terroristas.
Além disso, fica sempre uma dúvida sobre o risco de entregar esse poder a uma instância diretamente ligada à Presidência da República. Se o governo acha que crítica é golpe, pode também achar que o exercício do contraditório serve a planos de terrorismo ou sabotagem.