Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, maio 02, 2006

BOLÍVIA: AME-A OU DEIXE-A



EDITORIAL
Folha de S. Paulo
2/5/2006

Acabou a fase das ameaças. No decreto 28.701, o presidente da Bolívia, Evo Morales, cruzou o Rubicão ao transformar as multinacionais de energia no país em meras prestadoras de serviço do Estado; ao determinar que os militares ocupem os campos de gás e petróleo; ao confiscar 82% do valor da produção para o governo; e ao fixar em 180 dias o prazo para que as companhias estrangeiras se submetam às novas regras ou deixem o país andino.
Fica configurado o espírito "revolucionário" da gestão Morales, infestada de ideólogos do confronto étnico. O descendente de indígenas alçado ao poder na Bolívia se entende como um líder predestinado a redimir os pobres bolivianos de séculos de exploração "por potências estrangeiras". Morales é mais um a abraçar o nacionalismo populista de Hugo Chávez na América do Sul.
Mas a Bolívia não é a Venezuela. Não há em solo boliviano nada parecido com a estatal venezuelana que virtualmente monopoliza os negócios de petróleo no país de Chávez. Diante da imponência -em escala, capital e know how- de uma Petróleos de Venezuela (PDVSA) ou de uma Petrobras, a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) não passa de um esboço.
Uma estratégia para desenvolver a estatal energética boliviana necessitaria de um plano mais inteligente -prevendo parceria com empresas estrangeiras, taxação e investimentos na YPFB- que o encetado pela gestão Morales. O "ame-o ou deixe-o" exarado no decreto de ontem, porém, é uma cartada arriscada demais -e irresponsável- para quem tem a missão de governar a nação mais depauperada da América do Sul.
A Brasília e à Petrobras cabe reservar à Bolívia a frieza do cálculo empresarial -passou o tempo da benevolência. O Brasil, na condição de maior consumidor do gás boliviano, deve redobrar as pressões para que Morales abra exceções em sua política extremista. As cortes internacionais de arbitragem devem ser acionadas e nenhum centavo adicional do contribuinte brasileiro deve ser alocado no país andino enquanto perdure ali o surto estatista.

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