Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 01, 2005

O governo não gosta de quem produz Josef Barat

O ESTADO DE S PAULO

Classificação feita em recente estudo do Banco Mundial situa o Brasil como um dos piores lugares do mundo para se produzir. Ficamos em 119º lugar entre 155 países. Nossos principais competidores emergentes e a maioria dos países latino-americanos estão em situação menos desfavorável. Somos líderes incontestes em matéria de carga e complicações tributárias. E superados apenas por uns poucos países africanos no número de dias gastos para se abrir um negócio e prazos para obter licenças. O mais impressionante é que, segundo o Banco Mundial, as empresas brasileiras consomem em média 2.600 horas por ano para pagar uma das maiores cargas tributárias do mundo. Em Camarões, que ocupa o terceiro lugar (a Ucrânia é o vice), as empresas despendem a metade desse tempo.

O estudo do Banco Mundial (Fazendo Negócios 2006: Criando Empregos) leva em conta dez indicadores de ambiente de negócios, desde prazos de desembaraço em alfândegas até a facilidade para obter empréstimos bancários. Os indicadores são montados a partir do exame do quadro institucional e legal de cada país, além de centenas de entrevistas com empresas, escritórios de advocacia, consultorias e membros do governo. Note-se que não são contemplados o ambiente macroeconômico, a estabilidade monetária ou a qualidade das infra-estruturas. Resumindo esta ópera em português, os principais obstáculos para a produção e geração de empregos são: 1) o complexo, caro e ineficiente sistema tributário; 2) a burocracia nos três níveis de governo; e 3) o lento e labiríntico sistema judicial. Os empresários brasileiros conhecem bem essas limitações e os danos causados à produção.

Apesar dos avanços propiciados por algumas reformas visando a melhorar o ambiente de negócios, o Brasil ainda é um território hostil para quem quer produzir. Claro que a nova Lei de Falências representou um grande avanço, pois na expectativa do Banco Mundial ela deverá diminuir, em média, de dez para cinco anos o prazo para o fim dos processos de falência. Houve, ainda, uma melhora nas leis que garantem a aplicação de contratos, em função da adoção de limites para apelos judiciais envolvendo empresas e a possibilidade da apresentação de provas orais e não apenas documentais. O que não é pouca coisa. Mas nada foi feito para aliviar a pesada carga tributária e ainda há muito a fazer para tornar o Judiciário mais contemporâneo. A hostilidade do ambiente institucional para com quem produz incentiva a informalidade e a sonegação, implicando perdas para a sociedade e para o próprio governo.

A kafkiana burocracia brasileira trava o crescimento e repele os que querem investir. A via-crúcis para abrir uma empresa e obter um registro pode abranger uma dezena de repartições e seis meses de tramitação de documentos. São necessários 152 dias para abrir uma pequena empresa no Brasil, enquanto no México se gastam 58 e na República Checa, apenas 40 dias. Por outro lado, fazer valer um contrato na Justiça consome, em média, 566 dias no Brasil, comparativamente a 421 no México, 300 na República Checa e 250 nos Estados Unidos. Os custos decorrentes dos atrasos podem inviabilizar iniciativas de profissionais liberais, comerciantes, industriais e agricultores. Estes sabem que os governos, no Brasil, não gostam de quem produz e procuram atrapalhar ao máximo as iniciativas com um emaranhado burocrático custoso e ineficaz. Vez ou outra os governos, cientes das maldades que praticam, vestem a pele de cordeiro e acenam com medidas de alívio para certas atividades econômicas. Recentemente, buscou-se o alívio na chamada "MP do Bem". Aliás, para ser batizada com este epíteto é porque existe a clara consciência das constantes maldades praticadas.

O Brasil é um grande país, tem recursos naturais e humanos excepcionais e, portanto, um inesgotável potencial de crescimento. Mas é preciso que o governo seja mais amigável com quem produz e crie um ambiente mais favorável às iniciativas e às inovações. Não basta mostrar aos que querem investir e produzir que temos fundamentos macroeconômicos sólidos. O que se quer saber agora é se podemos ter um sistema tributário menos opressivo, infra-estruturas de qualidade, ambiente institucional e jurídico estável, segurança pública, Judiciário eficiente e confiável, bem como uma burocracia civilizada. Os que produzem e pagam tributos querem ser tratados dignamente como contribuintes e não como extorquidos.

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