FOLHA DE S PAULO
Diminuiu a temperatura em Brasília. A política vai mal, mas a economia vai bem no curto prazo. A agenda do Congresso continua paralisada, mas o governo reconquistou um mínimo de margem de manobra. A enorme liquidez internacional dá tempo ao país. Mas a conta virá em futuro breve e com juros.
Os indicadores de curto prazo superaram as expectativas mais otimistas. A inflação está cedendo. A projeção para o IPCA do Banco Central se encontra abaixo da meta de 5,1%. O IGP-DI deverá fechar o ano em 1,2%. A projeção mediana do mercado para o IPCA está em 5,2%.
Os números do setor externo também são positivos. O saldo comercial neste ano deverá atingir algo em torno de US$ 42 bilhões. As projeções do Banco Central no Relatório de Inflação chegam a US$ 29 bilhões para 2006. Há projeções superiores a esse número de que poderia chegar a US$ 35 bilhões.
A taxa de investimento de 19,9% para o primeiro semestre de 2005 também tem sido motivo de celebração. Por sua vez, os investimentos diretos estrangeiros registraram aumento, segundo o Relatório Mundial de Investimentos da Unctad, divulgado nesta semana. Passaram de US$ 10,1 bilhões em 2003 para US$ 18,2 bilhões em 2004, levando o Brasil a subir da quarta para a terceira posição na classificação dos países em desenvolvimento em termos de absorção de investimentos estrangeiros.
Somem-se a isso a emissão de dívida em real e o declínio do prêmio de risco para 344 pontos-base, seu menor nível desde o início da série para o Brasil. Considere-se, além disso, a provável queda de 0,5 ponto percentual na taxa Selic na próxima reunião do Copom e pode-se imaginar que a economia será o tema preferido do discurso oficial. O bom desempenho do comércio e o crescimento da renda real permitem afirmar que Papai Noel em 2005 será mais generoso do que na média de 2003/04.
O problema é que, enquanto os números de curto prazo são celebrados, as grandes questões estruturais continuam sem solução. As decisões de investimento em infra-estrutura estão paralisadas. O ano legislativo de 2005 foi praticamente perdido para a votação de inúmeras matérias que importam para o aumento da taxa de crescimento do investimento e da produção. Dificilmente será possível avançar muito mais em um ano eleitoral como 2006.
A dicotomia entre curto e longo prazos está refletida nos resultados do Relatório de Competitividade do Fórum Econômico Mundial. O Brasil caiu oito posições na classificação em relação ao ano passado. Encontra-se na 65ª posição, atrás de Bostuana, Gana e Namíbia e, naturalmente, da China.
Embora classificações dessa natureza devam ser vistas com cautela, é inegável que as condições gerais de competitividade do país são péssimas. Basta lembrar a elevada carga tributária, o excesso de burocracia, a legislação trabalhista anacrônica e a indefinição regulatória para entender esse fato. Alie-se a isso uma taxa de informalidade em torno de 40%.
Os sinais da política macroeconômica vão na direção contrária daquela que seria desejável para o aumento de capacidade produtiva, sobretudo no setor exportador. A elevação exagerada dos juros provocou apreciação excessiva da taxa de câmbio, inibindo as exportações no médio prazo.
A hora de mudar é agora. A excepcional situação da economia mundial oferece uma rara janela de oportunidade para um salto de crescimento do Brasil. Não é possível saber quando a bonança externa vai terminar. Mas a dimensão dos desequilíbrios da economia dos EUA sugere que o mundo de juros reais próximos de zero vai acabar em futuro próximo. Nesse momento, ficará claro o real custo da atual crise.
Entrevista:O Estado inteligente
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