FOLHA DE S PAULO
Presidente da CPI dos Correios, o senador petista Delcídio Amaral começou o dia de ontem com um susto: tornara-se autor, e não menos vítima, de uma frase com a qual não concordava. Pior ainda, a frase confirmava indiretamente o ex-secretário Silvio Pereira e, com isso, se contrapunha à nota em que a direção do PT, também ontem, negava qualquer conhecimento do uso de dinheiro "por fora" ao tempo em que Delúbio Soares operava com os tais "recursos não contabilizados".
O autor verdadeiro da frase era outro integrante da Executiva Nacional do PT, Paulo Ferreira, secretário de Relações Internacionais do partido. Fui eu que, sem explicação ao meu alcance, troquei os nomes inconfundíveis. Delcídio Amaral recebeu com gentileza franciscana o pedido pessoal de desculpas. E logo de manhã, antes que uma filosofada petista atribuísse minha burrada a ódios persecutórios, paguei a primeira quota de penitência: até que o senador fosse localizado, tive que ouvir por dez minutos, em vez da boa musiquinha de espera telefônica, a sessão da Comissão de Economia posta na linha do Senado.
Por aquela altura da manhã, ocorria uma reunião convocada por Lula para discutir o problema criado pela greve do bispo Luiz Flávio Cappio contra a transposição do rio São Francisco. O que precisará a Presidência da República discutir em um caso assim? Só se pode imaginar que estivessem perguntando, uns aos outros, "deixamos o frade morrer ou não deixamos?"
Ah, mas há a autoridade de Lula como presidente, o franciscano está contestando a autoridade e a autoridade não pode ser contestada. Pois pode e deve sê-lo. Ao menos enquanto disserem que o Brasil é um Estado de Direito e regime de democracia.
Nada exige que o projeto para o rio São Francisco seja inadiável até mesmo por período breve. Nada impede que o projeto seja posto em discussão mais ampla do que teve até hoje. A idéia de transposição, tal como está posta, é polêmica de fato. Não oferece segurança alguma de seus resultados, como seus defensores não oferecem respostas convincentes a muitas das objeções e alternativas às propostas e aos argumentos que apresentam.
Desde o primeiro momento da atitude tomada pelo bispo Luiz Cappio, o dever de Lula e do governo é o de respeitá-lo plenamente. Não é um homem falando em interesse próprio, como os presidentes e os governos estão habituados a ouvir e a atender. As palavras com que antecedeu seu gesto extremado mostraram que está autorizado pelo conhecimento a discutir a transposição e suas alternativas.
A atitude do bispo Luiz Flávio Cappio põe em questão mais do que o projeto do governo. Vê-se o quanto a mídia foi parcimoniosa, ou omissa mesmo, na exposição desse projeto e na provocação do necessário debate em torno de seus tantos aspectos e possíveis conseqüências. E se trata de um projeto hoje estimado em R$ 4,1 bilhões só para o principal, com a certeza de que, obra de construção brasileira, o custo serve apenas de base para os acréscimos mal explicados.
É bem possível que o frade franciscano do São Francisco tenha apontado o dedo para a Transamazônica de Lula.
Enfim
Postos sob a acusação mútua de que negavam quórum à convocação de corretoras pela CPI dos Correios, oposicionistas e governistas aprovaram, afinal, 11 convocações. Um lado deu razão às acusações do outro.
Se as inquirições forem razoáveis, são prováveis boas novidades. Material é que não falta nos corretores de câmbio e outras operações.
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