Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, março 22, 2005

O DIA Online-Dora Kramer: Oposição de resultados

A chamada reforma ministerial já praticamente concluída, “pronta na cabeça do presidente”, como disse o porta-voz André Singer, a que propósito teria servido o encontro de ontem entre o presidente da República e o presidente do PMDB, Michel Temer, até então solenemente ignorado no processo de consultas?

A nenhum diretamente relacionado com as trocas de ministros. Aliás, não há um motivo único. Existem vários, todos baseados em interesses tanto do Palácio do Planalto quanto do grupo de oposição do PMDB.

A engenharia da conversa – o primeiro passo em direção aos interesses dos quais falaremos já – começou a ser montada há uns 15 dias. Seus artífices foram, pelo lado do Governo, os ministros José Dirceu e Jaques Wagner; pela oposição, o deputado Gedel Vieira Lima fez o leva-e-trás entre o Planalto e os correligionários.

Não tinha força suficiente, contudo, para finalizar a operação, considerando que o presidente Lula, por vontade e iniciativa próprias, não convidaria Michel Temer a seus aposentos. Não gosta do excessivo formalismo de Temer.

O PMDB recorreu então, para fazer a ponte, a ninguém menos que o presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim. A despeito de teoricamente impedido de atuar na política partidária, Jobim já anunciou que deixa o STF no início do ano que vem, quando terminar seu período na presidência, e é aguardado no PMDB como um dos possíveis candidatos do partido à Presidência em 2006.

Apresentados os personagens, vamos às suas motivações: o Planalto quer a maior parte possível do PMDB engajada ao projeto de reeleição de Lula e, para isso, percebeu que não poderia ficar só nas mãos dos senadores José Sarney e Renan Calheiros, cujas promessas de entrega total do partido não foram cumpridas.

A relação foi na base do “venha a nós” para os parlamentares, e “ao vosso reino, nada” para o Palácio do Planalto.

Além disso, a chamada ala governista perdeu nesses últimos dois anos todas as batalhas internas travadas com os oposicionistas; a última em dezembro, com a aprovação da candidatura própria em 2006 e a imposição de quorum mínimo de dois terços da convenção nacional para modificar essa decisão.

Ao grupo de oposição interessa também sobremaneira não deixar que Sarney e Calheiros sejam vistos e consolidados como os únicos canais de diálogo entre o partido e o Governo.

Desse modo, o encontro de Lula com Michel Temer foi uma produção bastante conveniente para ambos. O presidente da República posou de estadista, respeitador da integridade institucional dos partidos e o presidente do PMDB posou de autoridade para seu público, recebendo, assim, um aval implícito de que não sofrerá dos adversários internos ataques especulativos ao seu mandato, cuja vigência vai até 2006.

Fica, nesse cenário, inclusive combinado que o assunto eleição presidencial não terá definições imediatas. Os oposicionistas fingem que cedem – entre outros motivos porque podem realmente vir a ceder mais adiante – e os governistas fingem que acreditam, confiantes de que poderão demover o hoje róseo inimigo, mediante o aumento gradativo de ofertas de poder.

Não, o leitor não se sobressalte, o espetáculo por enquanto não será de conjunção explícita como alguns outros em cartaz. Os oposicionistas do PMDB não chegarão ao ponto de aceitar cargos eles mesmos. Estariam politicamente mortos se fizessem isso.

O pequeno, digamos assim, “núcleo duro” do PMDB de oposição continuará preservado, a fazer seu discurso em favor da candidatura própria à Presidência da República, sem receber nenhum benefício direto além do espaço político, mas abandonará aquela obsessão de exigir que seus ministros deixem seus cargos.

Ao contrário, eles não imporão restrições a que gente que atua sob a área de influência da oposição aceite aqui e ali algumas “posições” importantes nos estados a fim de criar uma boa expectativa em torno da formação de alianças regionais que sejam úteis a Lula em 2006.

Se esses acordos irão de fato se concretizar são outros quinhentos. Como ninguém confia em ninguém mesmo, aqui de novo os oposicionistas fingirão acreditar nos bons propósitos dos petistas e, qualquer coisa, se lá adiante a promessa não se configurar como dívida a ser realmente paga, tomam os rumos que consideraram convenientes e quem quiser chame quem puder de traidor.

Mas, e Anthony Garotinho, candidato a presidente, em tese um empecilho a esses aconchegos?

Há resposta para tudo. A idéia é ajudar administrativamente o governo de sua mulher, Rosângela Matheus, incinerar seu adversário regional Cesar Maia e convencê-lo a deixar de lado essa coisa de Presidência da República e formar com a mulher uma dobrada em 2006 onde um seria candidato ao Senado; outro, a deputado federal para eleger uma imensa bancada pemedebista para a Câmara.

E segue o plano em frente com o intuito de fazer Ciro Gomes governador do Rio de Janeiro, ignorando postulações do PT, de outras candidaturas com identificação tradicional no estado e pretendendo que o eleitorado considere tudo muito justo. Pois é, só falta montar esta parte do projeto: quando entra em cena o eleitorado.

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