21.03.2005 | O presidente Lula da Silva é um dos mais cativantes presidentes da saga republicana. Carismático, bem-humorado, risonho, paciente, consegue estabelecer empatia imediata com públicos distintos. A biografia ajuda. Os pobres enxergam em Lula um dos seus – e o único a ter chegado lá. Públicos engravatados, abstraídos reacionários irrevogáveis e preconceituosos de carteirinha, vêem com simpatia a figura do nordestino que enfrentou a miséria, a dura vida de migrante, as restrições impostas por governos militares ao fundador de um novo sindicalismo e um partido de verdade. A maioria dos brasileiros, reafirmam pesquisas de opinião, continua gostando de Lula.
Esse chefe de governo tão cativante é provavelmente o mais despreparado entre todos os presidentes. É ocioso rememorar os pontapés no idioma, o sumiço sistemático dos plurais, a amputação dos esses e erres, a coleção de frases insensatas. Tampouco vale a pena reprisar a procissão de gafes ou agressões ao protocolo. Neste estranho Brasil, as vicissitudes superadas por Lula até virar celebridade parecem conferir-lhe um salvo-conduto que o dispensa de qualquer tipo de aprendizado. Ele ganhou o direito de esbanjar ignorância sem provocar reações de espanto.
Nos últimos vinte anos, Lula teve tempo de sobra para ampliar conhecimentos. Mas não estudou, não leu textos básicos, não retocou os talentos e virtudes que trouxe do berço. Em dois anos de Presidência, seguiu passando ao largo desses cuidados. Se fosse bom ouvinte, talvez pudesse ter sido saudavelmente emprenhado pelos tímpanos. Mas nos palácios sobram áulicos e faltam bons conselheiros. Além do mais, o homem não gosta de ouvir. O negócio de Lula é falar.
Liminarmente absolvido dos absurdos que solta em todo improviso, o presidente deu de infiltrar, nesses discursos, penosas demonstrações de ignorância em História e Geografia. A última foi enunciada há dias, em Brasília. Eufórico com supostos avanços econômicos (que teimam em não repercutir nos bolsos do povo), Lula decidiu ir além das paupérrimas metáforas futebolísticas. Acabou naufragando na Europa.
“Muitos tentaram atravessar o Canal da Mancha, poucos conseguiram”, informou o orador compulsivo. “O Brasil conseguiu. Já estamos em terra firme.” Em que estaria pensando Lula ao produzir a intrigante comparação? Na invasão da Normandia por tropas aliadas, manobra militar que mudou os rumos da Segunda Guerra Mundial e decretou o começo do fim da Alemanha nazista? Se foi isso, cometeu um exagero delirante.
Ou estaria pensando nas travessias feitas a nado por velhos aventureiros das águas, grupo que incluiu há quase 50 anos o brasileiro Abílio Couto? Nesse caso, alguma alma piedosa precisa avisar ao chefe que essas proezas caíram de moda faz tempo. Lula merece saber que, além dos barcos de sempre, há um túnel ligando a Inglaterra e a França. Todos os dias, milhares de indivíduos tentam a travessia do Canal da Mancha. Todos chegam sem sobressaltos à terra firme.
É muita besteira para uma garganta só. Mas talvez soassem todas perdoáveis se Lula soubesse que, em essência, governar é decidir (decidir corretamente, de preferência, voltando-se atrás quando evidenciado o erro). A reforma ministerial que se arrastou a partir de outubro escancara uma perturbadora faceta de Lula. Apaixonado pelas pompas do cargo (só pensa em prolongar até 2010 a permanência no Planalto), o presidente sofre de inapetência pelo exercício efetivo do poder. Não gosta de decidir. Odeia demitir auxiliares (mesmo os incompetentes de carteirinha). Insista-se: só saberá governar quem souber escolher. E Lula não sabe.
Essa característica foi determinante na montagem do novo Ministério. É o pior da nossa História. Que os deuses sejam clementes com o Brasil.
Entrevista:O Estado inteligente
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