Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, março 31, 2005

Folha de S.Paulo -ELIANE CANTANHÊDE- 31/03/2005



Deus nos acuda

BRASÍLIA - É difícil, mas até acontece de governos não conseguirem aprovar suas propostas no Congresso. O que nunca se viu é governos saberem que vão perder e não conseguirem nem derrotar a própria proposta. Isso só acontece com Lula.
Sem comando, sem articulação, sem base, o governo virou uma barata tonta durante toda a reta final da MP 232, que, de um lado, corrigia a tabela do Imposto de Renda em 10% e, de outro, compensava a perda aumentando a tributação sobre prestadores de serviço e autônomos. Tirava do salário para o salário. O verdadeiro capital continuava ileso.
É uma MP bumerangue: o governo lançou, a opinião pública reagiu iradamente, o Congresso tirou o corpo fora e a medida foi atirada de volta na testa do governo. Não satisfeita, a oposição quer manter a redução do IR, sem compensação nenhuma.
Severino Cavalcanti levou os louros. O mesmo Severino que tentou aumentar os salários dos deputados e acabou aumentando as verbas de gabinete é o que agora botou a MP 232 em votação -para enterrá-la.
José Dirceu sai em campo para passar a mão na cabeça de Roseana Sarney e tentar atrair as "viúvas de FHC" no PMDB. Aldo Rebelo avisa que da Coordenação Política não sai, dali ninguém o tira. Arlindo Chinaglia (novo líder do governo) tenta se ouvir num plenário de surdos.
Mas, se há um culpado, é o presidente da República. Bom de megafones em portas de fábricas e de negociações em sindicatos, ele tornou-se também bom de voto. Mas nunca perdeu o desdém pela política e pelos políticos, e o que consegue é o oposto do que gostaria: além de colher derrotas como a de agora, contribui para vicejar os Severinos e os "300 picaretas" que antes condenava.
E o governo nem completou dois anos e meio. Imagine daqui a dois, três, quatro, cinco anos, com reeleição. Hoje, já está um deus-nos-acuda. Depois, nem Deus dá jeito.
Como diz o deputado Roberto Brant (PFL-MG), "o governo envelheceu muito cedo". Tem razão.

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