Revendo agora, fiquei chocada e pensei que, se fosse vivo, Maquiavel
seria considerado um ingênuo
OUTRO DIA revi, no Canal Brasil, o excelente documentário de João
Moreira Salles "Entreatos", feito durante a campanha presidencial de
2002.
A equipe seguiu de perto o então candidato Lula, e é incrível como o
tempo transforma tudo: o candidato mudou, meu senso crítico mudou,
seus companheiros hoje são outros.
Foi curioso ver, no documentário, grupos de pessoas comuns que, nos
intervalos dos debates, opinavam, dizendo quais os pontos altos e
baixos do candidato; essas informações eram passadas por celular aos
assessores diretos de Lula, que as repassavam ao candidato.
"Ele não deve dizer "precisamos fazer", deve dizer "vamos fazer", era
um tipo de instrução enviada, e por aí vai. Na época fiquei abismada
com o que me pareceu o auge -no bom sentido- da competência
profissional. Revendo agora, fiquei chocada e pensei que, se fosse
vivo, Maquiavel seria considerado um ingênuo.
Os coadjuvantes, que não eram conhecidos na época, hoje são famosos, e
lá estão. Faltaram alguns, mas os que participaram são facilmente
reconhecíveis do tempo do mensalão, quando a TV transmitia ao vivo a
CPI. Lá estavam: o tesoureiro do PT, Silvinho Pereira, o publicitário
responsável pela campanha, Duda Mendonça, preso algum tempo depois
numa rinha de galos, Lulinha, filho do candidato e hoje empresário
muito bem sucedido, o ex-ministro Antonio Palocci, que teve que se
demitir por ter mandado abrir a conta bancária do caseiro Francenildo,
o mais poderoso de todos, José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil,
denunciado como chefe do mensalão e da quadrilha, que precisou deixar
o cargo e teve seus direitos cassados até 2015, e outros menos
votados.
O PT ficou sem candidato e sobrou para a ex-pedetista Dilma Rousseff,
que aliás virou petista em 2001.
O documentário, nove anos depois, parece o filme de uma gangue
tramando um golpe; aguardamos ansiosos o "Entreatos 2", contando os
lances inesquecíveis dos últimos sete anos (talvez dirigido por
Coppola), e esperando que não seja preciso haver o "Entreatos 3".
PS. - Se existe algum país com a obrigação de ajudar a Grécia, é a
Inglaterra. O novo primeiro-ministro poderia fazer bonito e dar um
empurrão para que sejam devolvidos os mármores saqueados do Partenon
pelo então embaixador britânico Lord Elgin.
"Os mármores de Elgin", como são chamados, estão expostos na sala mais
visitada do museu Britânico, em Londres, e são mais do que a metade
das preciosidades encontradas no templo grego.
Em 2009, quando o museu da Acrópole foi inaugurado, em Atenas, todo o
mundo diplomático esteve presente, com exceção do embaixador inglês, e
funcionários da embaixada. Nos anos 80, a atriz grega Melina Mercouri,
na época ministra da Cultura, fez uma campanha pelo mundo implorando à
Inglaterra que devolvesse as estátuas pilhadas para a ocasião dos
Jogos Olímpicos de 2004, mas em vão.
O museu Britânico não admite, sequer, essa possibilidade; fala, no
máximo, de um empréstimo. A Inglaterra não perde a mania de levar
"lembrancinhas" dos países pelos quais passa.