PERFIL DO NOBLAT
Sem entender direito o significado da cena, vi uma tropa do Exército cercar o Palácio do Campo das Princesas, no Recife, para depor e prender o governador Miguel Arraes na tarde do dia 31 de março de 1964. Eu tinha apenas 15 anos de idade e estudava no Colégio Salesiano.
Quatro anos depois, vi 300 soldados da Força Pública de São Paulo prenderem pouco menos de mil jovens reunidos em um sítio de Ibiúna durante congresso da proscrita União Nacional dos Estudantes. Eu estava entre eles na condição de aluno do curso de jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco.
Como repórter da revista "Manchete", vi o líder comunista Gregório Bezerra ser libertado no Recife no dia 6 de setembro de 1969 para integrar o contingente de 15 presos políticos trocados pelo embaixador norte-americano seqüestrado no Rio de Janeiro. Naquele mesmo dia fui preso. O embaixador foi solto no dia seguinte.
Vi ser preso em 1981 o líder metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva. Ele foi mantido em uma das salas do DOPS paulista onde 13 anos antes eu fora interrogado e fichado como subversivo. Escrevi sobre a prisão de Lula como editor assistente da revista "Veja". E um ano mais tarde, cobri seu julgamento na Auditoria Militar.
Ainda estava na "Veja" quando o último general-presidente da ditadura de 64, João Figueiredo, acovardou-se diante do terrorismo de direita que tentava minar o processo de abertura política do país. Mas foi como chefe de Redação do "Jornal do Brasil" em Brasília que o vi abandonar o Palácio do Planalto pelas portas dos fundos.
Assustei-me ao saber na noite de 14 de março de 1985 que o presidente eleito Tancredo Neves baixara ao hospital a doze horas de tomar posse. Dali a pouco mais de um mês, velei seu corpo no mezanino do Palácio do Planalto.
No final de fevereiro de 1986, vi o entusiasmo das pessoas convocadas pelo presidente José Sarney para assegurar o sucesso do Plano Cruzado. Elas lacraram supermercados e deram voz de prisão a gerentes. Estava no Rio um ano depois no dia em que Sarney foi apedrejado porque o plano fracassara.
Assisti ao espetáculo do crescimento de Fernando Collor nos corações e mentes dos brasileiros. Publiquei artigos no "Jornal do Brasil" chamando-o de farsante. Não vi o governo dele agonizar e morrer porque trabalhava em Angola. Fora demitido do jornal cinco dias depois da eleição de Collor.
Em 1994, vi uma preciosa fonte de informações dos jornalistas ser eleito presidente da República e deixar de ser fonte. Meus oito anos como Diretor de Redação do "Correio Braziliense" coincidiram com os oito anos de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Da Bahia, como Diretor de Redação do jornal "A Tarde", acompanhei a estréia na função de presidente da República do metalúrgico que um dia vira preso no DOPS. Voltei a Brasília 11 meses depois interessado em acompanhar de perto a experiência de um governo de esquerda governar pela direita.
E eu que pensava que já vira tudo!