Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 15, 2008

EUA temem inflação. Nós também

Alberto Tamer



O consumidor americano voltou a comprar, em maio, nada menos que US$ 385 bilhões em um único mês e 1% a mais do que em abril. Está feliz, gastando o dinheiro que recebeu do governo, no programa de estímulo à economia. Alguns analistas acreditam que esse efeito nas compras não deve ser duradouro, mesmo assim poderá perdurar o tempo suficiente para que a economia se estabilize.

A inflação nos Estados Unidos também voltou a dar um salto, 0,6%, apenas 0,2% no núcleo, que exclui alimentos e energia, para uma estimativa de 0,5%. O mercado absorveu facilmente esse novo índice, considerando que, afora energia, os outros setores de consumo mostram bom comportamento.

As bolsas americana e européia recuperaram perdas e fecharam em alta. É uma prova de consistência, pois a semana foi marcada por notícias de bancos, com novas perdas, levantando dinheiro no mercado ou buscando socorro nos fundos soberanos. Quanto a nós, aqui, continuamos firme.

UROS, AUMENTAM OU NÃO?

A grande dúvida da semana era sobre o comportamento dos bancos centrais frente a um cenário de inflação e desaceleração econômica. Eles estão diante do desafio de aumentar juros para conter a inflação, mas prejudicando o crescimento, ou cortá-los para estimular o consumo, mas elevando os preços.

Todos os olhos e ouvidos estão voltados para o presidente do Fed, Ben Bernanke, ao reafirmar que, após sucessivos corte dos juros, sua meta agora é a inflação. E o Fed agirá com força para contê-la.

SE NOS EUA HÁ DUVIDAS....

A leitura imediata dos analistas a esses raros e persistentes pronunciamentos públicos é de que ele pretende subir o juro num momento não muito distante. Na verdade, nunca um presidente do Fed foi tão claro. Muitos, porém, não acreditam que Bernanke tenha coragem para isso. Seria danoso para o crescimento e para o mercado financeiro, ainda instável diziam. "Eles (no Fed) não podem estar falando sério sobre apertar a política monetária", afirma Ed Yardeni, do Yardeni Reseaech. O Goldman Sachs e o Deutsch Bank concordam: uma economia fraca forçará o Fed não a aumentar, mas a cortar os juros, no futuro.

.... NO BRASIL, NÃO

Aqui o BC falou claro e em alta voz sobre aumento dos juros. Antes, Meirelles usava de subterfúgios verbais à moda de Greenspan, para insinuá-lo, mas, na quinta-feira, foi categórico na ata do Copom: "A atual postura de alta de juro será mantida enquanto for necessário para assegurar a convergência da inflação para a trajetória das metas." Isto é, vai continuar aumentando-o até que a inflação de 6,2% recue para 4,5%, no máximo. A exemplo de Bem Bernanke. Meirelles decidiu jogar as cartas na mesa e falar claro. Meta principal,conter a inflação. A segunda, o crescimento econômico.

NÓS E ELES

Temos aqui dois quadros diferentes. Nos EUA, o PIB aponta para, no máximo, 1%; aqui, de até 5% ou pouco menos. Lá, não há excesso de demanda interna, o mercado está plenamente abastecido, a inflação é praticamente importada. Aqui, os preços dos derivados do petróleo estão sendo contidos, pelo governo e a Petrobrás, com perdas para ambos. A safra agrícola é excelente, mas está contaminada pelos preços no mercado externo e pela forte e crescente demanda. Como estamos crescendo 5,8% ao ano e não como eles, é possível ainda elevar os juros sem derrubar o PIB. Não estamos na mira da recessão; eles, sim. Lá, juro maior é sinal de perigo aqui, não.

ARROCHO, RUIM, MAS INEVITÁVEL

O que vamos ter, no Brasil, é uma fase de arrocho monetário que, provavelmente, será mantida nos próximos meses. Os preços agrícolas não dão sinais de recuar, o consumo interno não pára de crescer animado pelo crédito fácil. Leitores avisem-me que já estão vendo prateleiras vazias nos supermercados. Corrigir tudo isso leva tempo.

PRESIDENTE, AGORA É DEMAIS

Presidente, restabelecer a CPMF disfarçada com outro nome, é demais. Sabe, ninguém acredita que será dinheiro para a saúde. Já vimos isso antes, quando o sério e competente, mas politicamente ingênuo ex-ministro Adib Jatene a propôs com esse fim. O dinheiro desapareceu, sumiu, saiu pelos ralos da máquina estatal... Presidente, mesmo sem a CPMF a arrecadação do governo está aumentando muito porque a economia cresceu e as empresas estão pagando mais impostos. Mesmo que a economia se retraia por causa dos juros, vai ficar aí no mínimo 4% gerando ainda muito, mas muito dinheiro para o caixa do governo.

E A INFLAÇÃO, PRESIDENTE?

Mais ainda, presidente, se o sr. quer mesmo combater a inflação, "essa doença desgraçada", na sua linguagem tão autêntica, porque aumentar os impostos, já muito altos num país ainda pobre e que só agora começa a crescer? Ora, presidente, o sr. por acaso não sabe que esse novo imposto será todo ele repassado para os preços e para a inflação que o sr. tanto odeia e teme? O sr. quer mais inflação, presidente? Em vez de aumentar impostos, por que não cortar mais os gastos dispensáveis do governo? Tome nota, presidente, mais imposto é mais repasse sobre os preços. Mais imposto é mais inflação. É isso o que o sr. quer? Acho que não.

*E-mail: at@attglobal.net

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