Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 14, 2008

DORA KRAMER Na fogueira da sucessão

O presidente Luiz Inácio da Silva anteontem menosprezou ("laranja sem caldo") o teor das acusações de Denise Abreu contra Dilma Rousseff. No dia anterior, porém, enquanto a ex-diretora da Anac confirmava no Senado a interferência da ministra da Casa Civil na venda da Varig, Lula dava seu aval a Dilma como "a candidata do PT" à Presidência da República em 2010.

A importância da declaração por si já confirma que o Palácio do Planalto conferia muito mais peso que menosprezo ao depoimento de Denise Abreu. Mas não foi este o único efeito.

Se por emergência ou ausência de compromisso com a palavra dita, não vem ao caso. Fato é que o presidente bancou oficialmente a candidatura, contrariando as próprias versões sobre a maneira mais conveniente de encaminhar a sucessão presidencial.

Para começo de conversa, quanto ao processo de escolha do candidato. Se Dilma é mesmo desde já a candidata do PT, isso quer dizer que a escolha se deu por imposição, à revelia da manifestação do partido onde, sabe-se, a ministra não é exatamente um fator de convergência.

Se Lula falou sério e não disse aquilo apenas para dar um tom de conspiração eleitoral e desviar atenções do real foco das denúncias, bateu de frente consigo e com sua assessoria. Esta, pródiga em apontar "sinais" do distanciamento entre o presidente e o PT, foi desmentida pelo anúncio da decisão unilateral que denota não apenas proximidade como submissão hierárquica.

Mas o presidente também contradisse declarações anteriores, segundo as quais o PT certamente teria um candidato, mas ele pessoalmente preferia a candidatura única dos partidos integrantes da sua coalizão de governo. Se Dilma é a candidata e vai concorrer pelo PT, os outros estão desde já descartados.

E não fica por aí. Lula confirma também que não era sincero quando, em agosto do ano passado, defendia que fosse dado tratamento de "segredo de Estado" ao nome do candidato.

"Se a gente ficar dizendo (o nome), a mosca azul vem, pode pousar na testa da pessoa e a pessoa começa a se descredenciar", afirmou, em entrevista ao Estado.

Isso dito, seis meses depois Dilma foi designada "mãe do PAC" para efeito de palanque. Todo mundo entendeu o gesto como a manifestação da preferência presidencial. Mas até a última quarta-feira isso era apenas uma interpretação.

Deixou de ser quando Lula atribuiu o crédito dado às denúncias de Denise Abreu ao bombardeio direcionado a Dilma Rousseff pelo fato de ela ser "candidata do PT" a presidente em 2010.

Realmente, o "upgrade" político de Dilma a tornou muito mais exposta a ataques. Ora atribuídos ao fogo amigo, ora postos na conta do inimigo. Independentemente da consistência ou não das denúncias, a ministra enfrenta tantas agruras porque no momento é única sentada em mesa de pista na fogueira da sucessão.

Chegou lá levada por Luiz Inácio da Silva em pessoa. Portanto, se ela se tornou alvo foi porque Lula a expôs à mira dos adversários.

Sabendo perfeitamente o que ocorre com candidaturas lançadas antes do tempo. Na mesma entrevista de agosto de 2007, em que reivindicava direito ao silêncio até as forças em jogo se organizarem, Lula explicou com objetividade os malefícios da antecipação.

"Quando você cita um nome com antecedência você está, na verdade, queimando esse nome. Primeiro você queima internamente com os possíveis pré-candidatos. Depois, queima na base aliada com candidatos de outros partidos. E, finalmente, os adversários e a imprensa colocam uma flecha direcionada para ele 24 horas por dia."

Argumento consistente, mas insuficiente para impedi-lo de lançar Dilma Rousseff às feras um ano e meio antes do prazo considerado por ele mesmo como ideal.

E, no meio de um episódio nebuloso, em que a interferência da ministra favorece um cliente do advogado Roberto Teixeira, amigo de quase a vida inteira do presidente, resolveu reforçar a candidatura, consolidando nesse ato a contradição com o próprio discurso.

A menos que não haja discrepância alguma, que Lula tenha outros planos e esteja usando Dilma - personagem sem lastro político-partidário-eleitoral - para ganhar tempo enquanto se apresenta comprovada a eficácia do item número um do manual sobre os males da precipitação: um nome citado com antecedência em geral é candidato ao braseiro.

Autocombustão

Nota oficial do PSDB atribuindo as denúncias de corrupção no governo Yeda Crusius, no Rio Grande do Sul, a conspiração política repete o erro de copiar os argumentos de defesa dos PT.

Equívoco já cometido - e reconhecido como tal - quando do aparecimento do nome do senador Eduardo Azeredo na lista de beneficiários do esquema Marcos Valério de administração de caixa 2.

Lá, os tucanos se enfraqueceram no caso do mensalão. Agora, de novo, optam por subtrair ao partido autoridade moral para enfrentar os escândalos federais.

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